Câmara votará anistia a partidos que descumpriram cota para mulheres e negros

PEC aprovada pelo Senado trata de participação feminina na política; relatório isenta de punição quem desobedeceu regras

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Brasília

A Câmara dos Deputados deve votar na quinta-feira (17) uma PEC que, embora trate da participação feminina na política, não traz avanços significativos sobre esse tema e ainda dá uma ampla anistia a partidos que nas últimas eleições descumpriram as regras de direcionamento mínimo de verbas públicas para mulheres e negros.

A deputada Margarete Coelho (PP-PI) leu nesta terça (15) relatório em que manteve a anistia, já aprovada pelo Senado.

Deputada Margarete Coelho (PP-PI)
Deputada Margarete Coelho (PP-PI), relatora da PEC que anistia partidos que descumpriram mínimo para incentivo à participação de mulheres na política - Pedro Ladeira-4.mai.21/Folhapress

Pelo texto, ficam livres de punição partidos que não aplicaram ao menos 5% do fundo partidário em programas de incentivo às mulheres ou que não direcionaram o dinheiro do fundo eleitoral de forma proporcional às candidaturas de negros e de mulheres.

De acordo com o texto aprovado no Senado, não serão aplicadas sanções de qualquer natureza aos partidos que descumpriram as normas nas eleições passadas, inclusive devolução de recursos, multa ou suspensão do fundo partidário.

Conforme a Folha mostrou, em 2020 a maioria dos partidos descumpriu a determinação da Justiça de dar tratamento igualitário (ou proporcional) a homens e mulheres, negros e brancos, na distribuição de suas verbas e do tempo de propaganda eleitoral.

Compilação com base na prestação de contas parcial dos candidatos entregue à Justiça Eleitoral mostrava que, apesar de pretos e pardos somarem 50% do total de candidatos, eles haviam sido destinatários de cerca de 40% da verba dos fundos eleitoral e partidário. Os autodeclarados brancos reuniam 60% do dinheiro, apesar de representarem 48% dos candidatos.

Apesar de a legislação determinar desde 2018 distribuição dos recursos às mulheres na proporção das candidaturas lançadas, a maior parte das siglas também não havia cumprido essa regra até a prestação de contas parcial de 2020 —na média, homens eram beneficiários de 73% do dinheiro.

A PEC tramita em uma comissão especial criada em dezembro do ano passado para debater o mérito do texto, aprovado pelo Senado cerca de cinco meses antes. Nesta terça, houve pedido coletivo de vista.

O texto obriga os partidos a aplicarem pelo menos 5% dos recursos do fundo partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

Um artigo adicionado em 2015 à lei dos partidos políticos já obriga as legendas a repassar o mínimo de 5% para incentivar a presença feminina na política. A legislação, porém, também prevê que esses recursos possam ser reservados para as eleições, o que levou partidos a não gastarem o percentual para promover a diversidade de gênero.

Levantamento feito pela Folha em 2018 revelou que os partidos destinavam só 3,5% do fundo público com mulheres.

A PEC também coloca na Constituição a obrigação de que partidos direcionem recursos proporcionais às mulheres (mínimo de 30%) e aos candidatos negros que lançarem.

Essas exigências já estão previstas na legislação comum e na jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal). O pequeno avanço, nesse sentido, é colocar na Constituição as regras.

A relatora suprimiu dispositivo do Senado que previa a acumulação desses 5% em diferentes anos, permitindo a utilização futura em campanhas eleitorais das candidatas. No entanto, indicou que o recurso poderá ser gasto em pré-campanha das candidatas, conforme os limites legais.

"É preciso que os partidos estimulem a formação de lideranças femininas, sobretudo financeiramente, de modo que a alçar ao texto constitucional torna a medida essencial para imprimir maior legitimidade democrática e força normativa", escreveu Margarete Coelho.​

A expectativa é que, depois de sair da comissão especial, o texto já seja apreciado pelo plenário. Se não houver alteração em relação à proposta do Senado, segue para promulgação —por ser tratar de PEC, a proposta entra em vigor imediatamente, não cabendo sanção ou veto presidencial.

Apesar de o Congresso ter discutido esse tema no ano passado, a PEC não inclui cota de cadeiras para mulheres ou negros nos legislativos.

Prevaleceu a posição dos partidos tradicionais e da maioria de seus caciques de manter as regras atuais, já que o estabelecimento de cotas de cadeiras resultaria, necessariamente, na perda de vagas para atuais detentores de mandato.

A deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC) criticou a disparidade de representação feminina no Congresso.

"Não temos 30% no Parlamento e nem o Parlamento desta Casa aceitou até agora votar uma PEC de pelo menos de 30% [de vagas]. É algo que dá uma tristeza enorme."

Apesar de ter crescido em relação à eleição anterior, o número de mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados em 2018 representou apenas 15% do total das 513 cadeiras.

A bancada feminina, até então composta por 53 parlamentares, foi para 77 integrantes. Antes, o percentual era de 10%.

Embora ainda distante da paridade num país em que mais de 51% da população é mulher, o percentual foi o maior já alcançado por mulheres na Casa. Em 1998, apenas 29 candidatas foram eleitas, o equivalente a 6% das vagas.

O índice chegou a dois dígitos somente em 2014, quando foram eleitas 51 parlamentares.

Apesar do aumento, as campanhas de mulheres tiveram pouco sucesso pelo país. De 2.769 candidatas ao cargo de deputada federal em 2018, apenas 3% foram bem-sucedidas.

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