Assembleia de SP rejeita processo contra parlamentar que falou em pôr cabresto em deputada

Monica Seixas disse que Wellington Moura agiu com "racismo"; ele pediu desculpas

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São Paulo

O Conselho de Ética da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) rejeitou nesta terça-feira (7) representação de quebra de decoro parlamentar contra o deputado Wellington Moura (Republicanos) por dizer à também parlamentar Monica Seixas (PSOL) que iria "colocar um cabresto" nela.

O órgão colegiado tomou a decisão por 5 votos contrários e 4 votos favoráveis ao prosseguimento do processo.

Monica pediu ao Conselho de Ética a cassação do mandato dele, que é vice-presidente da Alesp, alegando quebra de decoro parlamentar. Para ela, o parlamentar agiu com "racismo e machismo".

"Cabresto faz referência a uma tática usada amplamente na escravidão para impedir que negros e negras se manifestassem, comessem e bebessem. Eu pedi questão de ordem e fui acusada de estar atrapalhando a sessão", disse Monica durante a reunião do conselho.

A deputada estadual Monica Seixas (PSOL), que pediu a cassação de Wellington Moura
A deputada estadual Monica Seixas (PSOL), que pediu a cassação de Wellington Moura - Ronny Santos/Folhapress

O episódio ocorreu no dia 18 de maio depois de o deputado dizer que ela importuna o plenário. "É o que vossa excelência faz. Sempre. Várias vezes", disse ele. "Mas num momento que eu estiver ali [presidindo a sessão], eu vou sempre colocar um cabresto na sua boca porque não vou permitir que vossa excelência perturbe a ordem", emendou.

O conselho, composto por nove parlamentares, é presidido por Maria Lúcia Amary (PSDB), que votou a favor da representação, com Enio Tatto (PT), Marina Helou (Rede) e Barros Munhoz (PSDB). Os deputados que barraram o processo foram Campos Machado (Avante), Delegado Olim (PP) e Altair Moraes (Republicanos), Adalberto Freitas (PSDB), assim como o corregedor da Casa, Estevão Galvão (União Brasil). Erica Malunguinho (PSOL) esteve ausente, devido a licença protocolada anteriormente ao agendamento da reunião.

No mês passado, após o episódio, Moura usou o púlpito do plenário para pedir desculpas para Monica e para "todas as pessoas que se sentiram ofendidas por qualquer excesso que cometi ao utilizar a expressão cabresto".

Na ocasião, o deputado disse que não teve a intenção de cometer injúria racial ou machismo. De acordo com o vice-presidente da Alesp, a sua intenção foi de aplicar a palavra com o sentido de "algo que controla a fala que perturbe ordem dos trabalhos da sessão legislativa".

Moura argumentou ainda que "não faz sentido algum" ele "ser apresentado como racista ou machista", usando como argumento que sua avó era negra e que ele é pastor e atuou em projetos que ajudam no combate à violência contra a mulher.

Monica, que não estava presente no momento do discurso de desculpas, compareceu ao plenário passado um tempo da fala de Moura. Ela pediu a palavra para responder ao deputado, dizendo que não o perdoa e que ele só está pedindo desculpas pelo que falou ao microfone, e não por outras agressões que, segundo ela, ele fez fora do púlpito.

Campos Machado, na reunião do conselho, afirmou que devia ser levado em consideração o pedido de desculpas de Moura. "Seria uma ofensa à palavra retratação se nós não aceitássemos quando alguém age com o coração e com a alma", disse.

Já Marina Helou citou que se trata de racismo. "Ele [Moura] disse essa fala para uma deputada mulher negra, isso é completamente inaceitável", disse. "Isso configura uma injúria racial, que o nosso legislador adotou como entendimento que não cabe retratação como todos os casos de ofensa contra dignidade e decoro. Por isso que rogo para esse momento para o comitê de ética a importância de a gente traçar essa linha do que é aceitável ou não".

Mônica Seixas afirmou que é avaliado um novo pedido na Assembleia sobre o caso, mas que é difícil prosperar devido ao grupo político coeso do deputado. "Eu tenho fé na Justiça. Injúria racial é crime inafiançável. Por isso eu espero que a Justiça julgue o processo que eu fiz", diz, acrescentando que estuda uma ação contra a Presidência da Alesp.

"Temos uma assembleia marcada por violências, que há muito tempo não produz nada além de sessões para tentar conter as violências políticas cometidas pelos parlamentares aqui e que mulheres todas se sentem inseguras".

Monica também pediu a cassação do mandato do deputado Gilmaci Santos (Republicanos), cuja admissibilidade também foi negada nesta terça por 8 votos a 1 pelos deputados. No dia anterior à discussão com Moura, durante votação pela cassação de Arthur do Val, Santos chamou a deputada de louca e apontou o dedo para o nariz dela, segundo ela.

Por meio de representação também enviada ao conselho de ética da Alesp, ela afirma que nesse caso houve dois crimes contra ela: agressão verbal e agressão física "ao colocar o dedo em riste e batê-lo propositalmente no nariz" dela.

O documento alega que "o deputado Gilmaci Santos, que é um homem alto e de grandes proporções corpóreas, aos gritos de 'louca! Você é louca! Louca!' com a deputada Monica Seixas, aponta o dedo para seu rosto e, quando solicitado que abaixasse a mão, se posiciona mais para frente, e encosta no nariz da deputada, que é mulher, negra, de baixa estatura e magra".

Em sua defesa, Gilmaci apresentou vídeos com objetivo de rebater a afirmação de que encostou na deputada. Ele afirmou, porém, que em um debate acalorado, quando Monica se dirigiu a ele dizendo para não apontar o dedo para ela, ele respondeu dizendo "menina, você é louca".

CONFLITO

A animosidade entre deputados da Assembleia chegou a uma intensidade inédita e virou a marca registrada da atual legislatura, iniciada em 2019.

Neste ano, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Casa já recebeu 30 representações pedindo aplicação de medidas disciplinares a deputados por falas e atitudes impróprias. Esse total já é maior do que a soma de todas as ações do tipo registradas em 2020 (12) e em 2021 (16). Em 2019, foram 21.

No total, são 79 desde aquele ano. Dessas, cinco viraram propostas de advertências, duas de suspensão temporária de mandato e uma de cassação. Dois dos casos mais emblemáticos até agora foram causados por atos e falas machistas.

No fim de 2020, o deputado Fernando Cury (União Brasil) apalpou a colega Isa Penna (PC do B) em sessão no plenário. A deputada denunciou Cury, que teve o mandato suspenso por seis meses.

No mês passado, o ex-deputado Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, teve o seu mandato cassado por decisão unânime dos integrantes do Legislativo paulista.

DECORO NO PLENÁRIO

Relembre casos de punição a deputados na Alesp desde o início da atual legislatura

  • Arthur do Val (União Brasil)

    O ex-deputado foi cassado por unanimidade em votação no plenário da assembleia paulista. Arthur virou alvo de processo por quebra de decoro parlamentar por falas sexistas sobre mulheres ucranianas enviadas a um grupo de WhatsApp.

  • Fernando Cury (União Brasil)

    O deputado teve o mandato suspenso por seis meses em 2021 por ter apalpado o corpo da deputada Isa Penna em plenário em dezembro do ano anterior.

  • Frederico D’Ávila (PL)

    O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp propôs a suspensão de três meses do mandato do deputado bolsonarista por ele ter chamado o papa Francisco e o arcebispo de Aparecida, dom Orlando Brandes, de “pedófilos”, “vagabundos” e “safados”. O projeto aguarda votação em plenário da Casa.

  • Wellington Moura (Republicanos)

    O vice-presidente da Alesp disse em plenário que iria colocar “um cabresto” na boca da colega Monica Seixas (PSOL) para que ela não importune as sessões. A deputada protocolou representação no conselho de ética da Alesp pedindo a cassação do mandato dele

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