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Ministério Público denuncia bolsonarista sob acusação de assassinato de petista em Foz

Em prisão preventiva, policial responde por homicídio duplamente qualificado

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Mauren Luc Denise Paro
Curitiba e Foz do Iguaçu (PR)

O Ministério Público do Paraná apresentou nesta quarta-feira (20) denúncia contra o policial penal federal Jorge Guaranho sob acusação de homicídio duplamente qualificado. Guaranho invadiu a festa de aniversário e matou a tiros o sindicalista e guarda municipal petista Marcelo Arruda, em Foz do Iguaçu (PR), no dia 9.

Promotores anunciam a denúncia contra Jorge Guaranho. Foto: Denise Paro / Folha Press

O promotor Tiago Lisboa Mendonça afirmou que a motivação do crime foi fútil, e não torpe, como concluiu a Polícia Civil.

Após menos de uma semana de investigação, a polícia concluiu que o assassinato teve motivo torpe e não foi enquadrado como crime de ódio, político ou contra o Estado democrático de Direito, por falta de elementos para isso.

Em entrevista à imprensa, Mendonça afirmou que o Ministério Público não constatou prática de crime de ódio ou contra o Estado democrático de Direito. Segundo ele, por não haver na Constituição Federal elementos para enquadrar o ocorrido nesses crimes, a análise ficará a cargo da Justiça, que poderá acrescentar essa motivação no processo em curso.

Segundo o promotor, há legislação protegendo a discriminação em relação à raça, cor, etnia, religião e procedência nacional, mas não em relação a grupo político.

"Nós optamos por qualificar o homicídio praticado pelo Jorge Guaranho como motivo fútil, decorrente por óbvio dessa divergência do campo político-partidário", disse Mendonça.

"Nosso entendimento é que o motivo torpe pressupõe algum tipo de vantagem econômica ou conotação econômica, seja mediante a vaga promessa de recompensa ou por outro motivo torpe. Entendemos que em razão dessa discussão, em razão dessa motivação político-partidária, dessa divergência e desavença no campo político ideológico, isso tornaria ou qualificaria a conduta de Jorge como um ato praticado por motivo fútil que é aquele motivo desproporcional", completou o promotor.

O promotor afirmou ainda que o ódio demonstrado por Jorge, que dirigiu em alta velocidade e confrontou o caseiro que tentou impedir sua entrada, deve ser levado em conta na aplicação da pena caso fique provado que houve premeditação.

O inquérito sobre o assassinato retornou para a polícia na terça-feira (19), após a Justiça determinar urgência nas perícias pendentes na investigação. São elas: exames balísticos do confronto, a análise dos celulares de Jorge e de seus colegas que teriam acesso às câmeras, a avaliação das câmaras de segurança do entorno da associação, assim como laudo de exame do veículo do bolsonarista e do local do crime.

Em paralelo, a Promotoria manifestou concordância com o pedido da corregedoria-geral do Departamento Penitenciário Nacional para abertura de processo administrativo contra Jorge, que está em prisão preventiva.

Jorge segue internado —o promotor afirmou à imprensa que ele será ouvido quando tiver condições de falar. Mendonça informou que o policial saiu da UTI, mas não tem previsão de alta.

Em nota, a Polícia Civil afirma que o Ministério Público do Paraná "ofereceu a denúncia praticamente nos mesmos termos" do inquérito, "somente alterando uma das qualificadoras para motivo fútil, que é um motivo insignificante, banal".

"A pena aplicável é a mesma podendo chegar a 30 anos. A qualificação por motivo torpe indica que a motivação é imoral, vergonhosa", indica a polícia.

A Polícia Civil também ressaltou a conclusão que afasta o crime político, algo que foi criticado pela esquerda.

"Da mesma forma que a Polícia Civil, o Ministério Público afirmou que não há nenhuma qualificadora específica para motivação política prevista em lei e que não há previsão legal para o enquadramento como 'crime político', bem como crime de ódio. As delegadas e os promotores também concordam que toda a confusão se iniciou claramente em decorrência de divergências políticas", diz a nota.

Na avaliação da defesa do petista, independentemente da alteração da tipificação pelo Ministério Público, "a motivação política foi o principal elemento causador do homicídio brutal do Marcelo".

O advogado da família, Ian Vargas, disse entender "como fundamental o reconhecimento de que a motivação do retorno de Jorge ao local do crime, no segundo momento, se deu pelo mesmo motivo que foi demonstrado na sua ida: a divergência política".

Vargas afirma que a defesa irá acompanhar o processo como assistente de acusação do Ministério Público e que aguarda mais informações das perícias a serem concluídas, como a do celular do atirador.

A defesa de Jorge disse que só comentará a denúncia em entrevista à imprensa prevista para esta semana.

Apesar de todas as perícias da polícia não terem sido concluídas, o Ministério Público decidiu apresentar a denúncia.

A Secretaria de Segurança Pública do Paraná informou que irá cumprir as diligências rapidamente. "As perícias já tinham sido requisitadas pela autoridade policial à Polícia Científica, na semana passada", aponta a secretaria. "Por enquanto, sem previsão de conclusão."

Durante o inquérito, em que as investigações foram finalizadas em cinco dias, a polícia descartou crime político ou de ódio, mas apontou motivo torpe para o assassinato.

A delegada responsável pelo caso confirmou que tudo começou com uma provocação do bolsonarista, seguida de discussão por questões políticas e ideológicas. Mas disse que, para enquadrá-lo como um crime político, seriam necessários requisitos para isso, como o de tentar impedir ou dificultar outra pessoa de exercer direitos políticos.

A pena de homicídio simples prevista na legislação vai de 6 a 20 anos de prisão. Com a presença do motivo torpe ou fútil, pode ir de 12 a 30 anos.

De acordo com a denúncia do MP, na noite de 9 de junho, Jorge estava em uma confraternização, onde teria havido uma partida de futebol e um churrasco, sendo que o policial foi um dos churrasqueiros.

Ainda segundo a Promotoria, Jorge ficou sabendo da festa de Marcelo por meio de Márcio Murbak, um dos diretores da associação onde o petista havia alugado o salão de festas. No churrasco, Murbak acessou as imagens das câmeras do local e, assim, Jorge viu a festa com decoração temática de PT e Lula.

A denúncia diz que Jorge, que também faz parte da associação, foi de carro ao local, com a esposa e seu filho bebê, e chegou com o som do veículo em volume alto, reproduzindo uma canção enaltecendo Bolsonaro, com o seguinte refrão: "O mito chegou e o Brasil acordou".

O promotor Marcelo Mafra aponta que Jorge gritou do carro "Lula ladrão" e "Bolsonaro mito, aqui é Bolsonaro".

O aniversariante, de acordo com a apuração da Promotoria, caminhou até a parte externa da associação, dizendo tratar-se de festa privada e pedindo que Jorge se retirasse. Depois de discussão, Marcelo teria dito: "Bolsonaro na cadeia", enquanto jogava terra no carro de Jorge.

O relato do órgão diz ainda que Jorge exibiu sua arma e Marcelo disse ser guarda municipal. Foi então que a esposa de Jorge pediu calma e mostrou que o filho bebê estava no banco traseiro.

"O denunciado [Jorge] então deixou o local, mas prometeu que retornaria e acabaria com todos. O que mostra preferências políticas partidárias", afirma Mafra.

Quando Jorge volta à festa, ele ignora os pedidos do caseiro para não entrar e da esposa de Marcelo para largar a arma. Segundo o Ministério Público, ao entrar no salão, teria dito "petista vai morrer tudo" e fez dois disparos contra Marcelo.

Mesmo caído, o petista responde com dez disparos, sendo que quatro deles atingiram o policial penal, que ficou na UTI por 11 dias.

Marcelo era tesoureiro do PT municipal. No partido havia mais de dez anos, ele concorreu a vereador e a vice-prefeito pela sigla em eleições recentes.

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