O que é a carta pela democracia da USP e veja o que Lula e Bolsonaro já disseram sobre ela

Manifesto de banqueiros e integrantes da sociedade civil em defesa do sistema eleitoral e da democracia foi lido em 11 de agosto

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São Paulo

A "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito" lida nesta quinta-feira (11) na Faculdade de Direito da USP tem atraído adesões desde que foi aberta ao público no último dia 26.

O documento, que começou com a assinatura de 3.000 pessoas, entre banqueiros, empresários, juristas, atores e diversas outras personalidades, faz parte de uma iniciativa suprapartidária e critica, sem mencionar o nome do presidente, os ataques contra o processo eleitoral perpetrados por Jair Bolsonaro (PL).

A carta ultrapassou a marca de 1 milhão de signatários na noite de quinta, horas depois de ser lida na faculdade da USP e em diversas outras instituições pelo Brasil. Nesta sexta (12), o número de assinaturas já passava de 1,05 milhão.

Novas adesões podem ser feitas pelo site "Estado de Direito Sempre!".

O manifesto, que defende os tribunais superiores, as eleições e a democracia, provocou reações de diversos políticos, entre eles do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que está à frente nas pesquisas de intenção de voto, além de Ciro Gomes (PDT), que aparece em terceiro lugar.

Fachada do prédio da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco, em São Paulo - Eduardo Knapp - 20.jan.22/Folhapress

O que é a carta? Considerada uma resposta às ameaças golpistas do presidente Jair Bolsonaro (PL), a carta nasceu a partir de um grupo de ex-alunos da Faculdade de Direito da USP que pretendia homenagear os 45 anos da "Carta aos Brasileiros", lida na mesma instituição, no Largo de São Francisco, em 1977.

"O professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos", diz o documento.

Quem já assinou? A carta angariou 100 mil adesões em menos de 24 horas após ser aberta ao público, quando tinha cerca de 3.000 assinaturas, entre banqueiros, empresários, juristas, artistas e diversas outras personalidades —e o número já passava de 1,05 milhão nesta sexta.

Entre os primeiros signatários, há ex-ministros do Supremo Tribunal Federal, como Nelson Jobim, Joaquim Barbosa e Celso de Mello, e banqueiros, como Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles (copresidentes dos conselho de administração do Itaú Unibanco).

Neste grupo mais restrito, a carta já reunia a assinatura de nove ministros eméritos do STF e de 259 membros da magistratura. O grupo era composto pela advocacia pública e privada (939), membros da sociedade civil (582), personalidades e empresários (208), membros do Ministério Público (250), da Defensoria Pública (170), dos tribunais de contas (54), além de 151 docentes da Universidade de São Paulo e mais 420 professores de outras instituições.

Um dia após a abertura da carta para adesões do público em geral​, o site que coleta as assinaturas já tinha sofrido cerca de 2.340 tentativas de ataques hackers.

O manifesto ganhou o apoio de diversas personalidades da classe artística. A atriz Fernanda Montenegro, os cantores Anitta, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gal Costa, Chico Buarque e vários outros leram a carta em vídeo publicado na quarta (10), um dia antes do ato na Faculdade de Direito da USP.

Como ela foi concebida? Um grupo de seis pessoas começou a trabalhar num texto sem viés partidário, sintético, focado na mensagem: o Brasil terá eleições e seus resultados serão respeitados. Com o esboço em mãos, foram ao diretor da Faculdade de Direito da USP, Celso Campilongo.

Campilongo, que também estava na faculdade em 1977, vinha tratando com entidades empresariais a leitura de algum manifesto no dia 11 de agosto, quando foram comemorados os 195 anos da fundação dos cursos jurídicos no Brasil. Entendendo que as duas iniciativas se complementavam, Campilongo se somou ao grupo para chegar à versão final da carta.

​​Por que a carta não cita o nome de Bolsonaro? O documento foi concebido com expressões moderadas para atrair o maior número possível de signatários, evitando termos que soassem radicais, divisivos, pró-PT, anti-Bolsonaro ou de qualquer forma partidário. Palavras que pudessem fazer com que pessoas não assinassem, inclusive por limitações profissionais, como é o caso da magistratura, foram evitadas.

Nos atos pela democracia do dia 11, porém, manifestares protestaram contra Bolsonaro e a favor de Lula. Na Faculdade de Direito da USP, parte do público entoou coros de "fora, Bolsonaro" e "olê, olê, olá, Lula, Lula" durante enceramento da cerimônia em que a carta foi lida.

O que diz a carta? O documento relembra a superação da ditadura militar (1964-1985), a promulgação da Constituição de 1988 e diz que, de lá para cá, a democracia amadureceu. Mas afirma que, com as eleições deste ano, o Brasil passa por um momento de imenso perigo para a normalidade democrática e de risco às instituições.

"Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional", diz a carta.

O que Bolsonaro disse sobre a carta? O manifesto tem provocado críticas do presidente. No dia seguinte à abertura da carta para adesões do público em geral, na quarta (27), Bolsonaro afirmou que não precisa de "cartinha" para dizer que defende a democracia. Ele não citou a iniciativa diretamente.

"Vivemos país democrático, defendemos democracia, não precisamos de nenhuma cartinha para dizer que defendemos a democracia", afirmou o mandatário em discurso na convenção nacional do PP, que oficializou apoio à sua campanha.

Os 11 participantes do jantar alinhados, em pé, na sala de estar
Participantes de jantar sobre carta pela democracia; a partir da esquerda: Roberto Vomero Mônaco, Thiago Pinheiro Lima, Gustavo Ungaro, Ana Elisa Bechara, Flávio Bierrenbach, Celso Campilongo, Dimas Ramalho, Ricardo de Castro Nascimento, Floriano de Azevedo Marques Neto, Roque Citadini e Ignácio Poveda Velasco - Divulgação

Um dia depois, o presidente publicou um tuíte com apenas 27 palavras ironizando o manifesto. "Carta de manifesto em favor da democracia. Por meio desta, manifesto que sou a favor da democracia. Assinado: Jair Messias Bolsonaro, presidente da República Federativa do Brasil", escreveu.

Também no dia 28, disse a um grupo de apoiadores que o manifesto estaria vinculado a interesses de grandes bancos e instituições financeiras, que estariam incomodados com a criação do Pix.

No dia 1º de agosto, o presidente voltou a minimizar a carta e criticou os signatários. "Esse manifesto aí foi assinado por banqueiros, artistas, tem mais uma classe aí... e alguns empresários mamíferos", afirmou.

No dia seguinte, o presidente chamou de "cara de pau" e "sem caráter" quem assinou o documento.

O mais recente ataque de Bolsonaro contra a carta pró-democracia e os signatários do manifesto foi feito na segunda-feira (8). Em encontro com banqueiros na cidade de São Paulo, o presidente voltou a dizer que não vai assinar o que chamou de "cartinha".

"Vocês têm que olhar na minha cara, ver as minhas ações, e me julgar por aí", disse o presidente.

No dia 11 de agosto, Bolsonaro disse que a carta não servirá de "passaporte de bom moço" e criticou artistas que assinaram o manifesto.

O que Lula disse sobre a carta? Em entrevista, Lula disse que ficou "feliz" com a iniciativa de ex-alunos da Faculdade de Direito da USP e que ele é favorável a qualquer iniciativa que defenda a democracia. "Estou convencido que todos os brasileiros precisam brigar muito para que a gente mantenha a consolidação do processo democrático desse país", afirmou.

O que Ciro Gomes disse sobre a carta? Ciro afirmou que o manifesto em defesa da democracia é um compromisso de diferentes setores com o regime democrático no Brasil.

"Um momento de união de diferentes segmentos contra os recorrentes ataques de Bolsonaro aos nossos direitos, ao sistema eleitoral e ao próprio regime democrático —que é a maior de todas as nossas conquistas", escreveu ele em uma rede social. "Este é um compromisso de todos nós."

O que Hamilton Mourão disse sobre a carta? O vice-presidente da República minimizou as declarações golpistas de Bolsonaro e afirmou que há "pânico desnecessário" envolvendo o manifesto. "Ele [Bolsonaro] tem uma retórica, vamos dizer, forte. Mas é só isso aí, é uma retórica. As ações jamais foram nesse sentido", afirmou.

Leia a íntegra da carta e lista dos primeiros signatários da "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito":

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