Descrição de chapéu Eleições 2022

Zema resiste a Bolsozema, 'aceita' eleitor de Lula e adota neutralidade em Minas

Governador tenta se equilibrar entre eleitorado bolsonarista e fenômeno que vem sendo apelidado de Luzema, forte no interior mineiro

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Belo Horizonte

Era 2018. A poucos dias do segundo turno, o candidato ao Governo de MG Romeu Zema (Novo) aparecia em um vídeo em que repetia ao lado de apoiadores: "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos". Ao final, o grito: "Bolsozema!", em referência ao apoio declarado por ele ao então candidato Jair Bolsonaro (PL).

A cena parece distante do atual cenário de 2022, momento em que o agora governador adota a neutralidade em relação à disputa nacional como estratégia em busca da reeleição. Seu principal opositor hoje é o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD).

O governador Romeu Zema (à esq.) e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil
O governador Romeu Zema (à esq.) e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil - Ane Souz - 21.abr.22/Folhapress e Ricardo Stuckert

Eleito na esteira da onda "antipolítica" e bolsonarista de 2018 e tido como um dos gestores mais próximos a Bolsonaro ao longo do mandato, o hoje autointitulado "político" Zema se distanciou do presidente nos últimos meses, evitando fechar um palanque conjunto e fazendo acenos mais discretos ao mandatário.

Em entrevistas recentes, tem dito que a associação do seu nome ao de Bolsonaro ocorre por coincidência, por terem sido eleitos juntos como desconhecidos. Também diz que deve cobrar mais ações do governo federal em relação a Minas. Quando questionado sobre um eventual apoio no segundo turno, evita citar diretamente Bolsonaro, ao mesmo tempo em que diz: "Não voto em partido corrupto, não voto no PT".

Até lá, Zema afirma apoiar o candidato do próprio partido à Presidência, Felipe d'Avila.

Aliados do governador ouvidos pela Folha afirmam que há motivos para a corda bamba em relação ao presidente. Entre eles está o alto índice de rejeição a Bolsonaro, cuja aliança é vista com potencial para prejudicar o governador, que busca a vitória ainda no primeiro turno.

Outro fator é o contingente de eleitores que, nas sondagens atuais, declaram votar em Lula para a Presidência e em Zema para o governo estadual —um fenômeno que já ganhou apelido próprio: "Luzema".

Estimativas do Novo com base nas pesquisas já divulgadas apontam que 39% dos eleitores de Lula estariam nesse quadro, tido como mais forte na região norte de Minas e no Vale do Jequitinhonha.

Alguns aliados e integrantes do partido já falam que Zema, caso não vença no primeiro turno, poderia até ser aconselhado a manter a neutralidade em uma segunda rodada.

A distância protocolar em relação ao presidente contrasta com o histórico dos últimos anos. Sem experiência política antes de 2018, o empresário Zema estava na rabeira das intenções de voto naquele ano quando chamou a atenção ao pedir votos para Bolsonaro no final de um debate na TV Globo.

Na época, faltavam cinco dias para o primeiro turno, e o Novo já tinha um candidato próprio, João Amoêdo. "Aqueles que querem mudança, com certeza, podem votar aí nos candidatos diferentes, que são o Amoêdo e o Bolsonaro", disse na ocasião.

A situação foi vista como um dos principais impulsos para uma virada nas pesquisas. Alçado ao segundo turno, declarou oficialmente apoio a Bolsonaro e adotou o bordão Bolsozema, ainda que não tenha tido apoio explícito do PSL, partido do presidente à época. Venceu com 71,8% dos votos.

Embora tenha sempre recusado a alcunha de aliado, a postura alinhada a Bolsonaro chamou a atenção em diferentes momentos. Em 2020, recusou-se a assinar cartas de governadores que cobravam medidas na crise da Covid e em apoio a presidentes da Câmara e Senado, alvo de embates com o governo federal.

Chegou a dizer em 2021 que Bolsonaro poderia ter capitaneado ações contra o coronavírus, mas que via "certa perseguição a ele". A pandemia, porém, também foi o momento em que mais foi obrigado a rever posições, saindo de falas em que defendeu "deixar o vírus circular", em alinhamento a Bolsonaro, a outras em que, em fase mais restritiva, disse que quem fazia aglomeração poderia "ser tachado de assassino".

No mesmo ano, criticou a defesa do voto impresso e rebateu o presidente por tentar culpar governadores pela escalada do preço dos combustíveis. Pouco depois, porém, voltaram a estar próximos em eventos.

Para o cientista político Carlos Ranulfo, a postura de Zema neste ano, embora contraste com 2018, condiz com o cenário que aponta terreno confortável ao governador na disputa. "De lá para cá Zema ganhou luz própria, tem uma administração considerada boa e não precisa de Bolsonaro para vencer a eleição."

Segundo ele, pesa também nesse cenário o fato de Lula estar à frente em Minas nas intenções de voto à Presidência e de o candidato apoiado por Bolsonaro no estado, Carlos Viana, ainda não ter decolado.

Aliados de Zema também veem no discurso atual uma forma de fazer acenos a bolsonaristas —como ao dizer que não vota no PT— sem nacionalizar totalmente o debate. Na visão do grupo, o governador também mantém terreno no eleitorado Luzema com o fato de não receber críticas diretas de Lula.

"Não é brigando que a gente resolve problemas, é com diálogo, com parceria. Foi assim que lidei com o presidente, e será assim com quem quer que seja eleito presidente", disse Zema em campanha na TV.

Para o deputado estadual Roberto Andrade (Patriota), líder do governo na Assembleia, Zema "virou maior que o Novo" e "Lula é maior que o PT", daí um impulso para potenciais votos Luzema. A coligação que apoia o governador também tem partidos que defendem a dobradinha, caso de Avante e Solidariedade.

Já para o deputado estadual Agostinho Patrus (PSD), presidente da Assembleia e coordenador da campanha de Kalil, o fato de o ex-prefeito ainda ser desconhecido no interior como aliado de Lula aponta que é cedo para dar como certo um movimento Luzema. "Estão tentando voltar a 2006 [quando houve o Lulécio], que era uma disputa diferente da de agora, polarizada e radicalizada", afirma. "O que temos nas nossas pesquisas é que, à medida que conhecerem o Kalil, votarão no Kalil."

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