Campanha de Bolsonaro cria e impulsiona site com ataques a Lula

Especialistas afirmam que conduta fere a legislação eleitoral; comitê do presidente não se pronuncia

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Brasília

A campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) criou e impulsionou no Google um site que reúne notícias e conteúdos negativos para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), numa prática que, segundo especialistas, é vedada pela legislação eleitoral.

Chamada Lulaflix, a página foi criada em 30 de agosto e o domínio está registrado no CNPJ da campanha de reeleição de Bolsonaro. No entanto, a página não consta no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) como pertencente ao time do presidente.

O presidente Jair Bolsonaro em evento no Palácio do Planalto - Gabriela Biló-15.ago.22/Folhapress

De acordo com especialistas consultados pela Folha, essa conduta fere as regras eleitorais em ao menos três frentes.

O artigo 57 da legislação eleitoral aponta ser crime a "contratação direta ou indireta de grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir mensagens ou comentários na internet para ofender a honra ou denegrir a imagem de candidato".

Além disso, também configura conduta irregular realizar propaganda na internet "atribuindo indevidamente sua autoria a terceiro, inclusive a candidato, partido ou coligação".

Há ainda outro trecho da legislação eleitoral segundo o qual é proibida a veiculação de conteúdo de cunho eleitoral "com a intenção de falsear identidade".

Por fim, a lei só permite a promoção de conteúdos positivos sobre as campanhas dos próprios candidatos, vedando, assim, o impulsionamento de informações negativas contra adversários.

O Google registra um gasto pago pela campanha de Bolsonaro de entre R$ 10 mil e 15 mil para promover uma publicação do Lulaflix com o título "Dossiê sobre a vida do Lula". O conteúdo foi exibido entre 30 e 35 mil vezes em buscas do Google.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à esquerda e o presidente Jair Bolsonaro (PL), à direita. - Danilo Verpa/Folhapress e Reprodução/@Flow Podcast no Youtube

Na segunda-feira (13), um link acompanhado da frase "Mentiras de Lula— Não seja mais enganado" aparecia em destaque como conteúdo impulsionado no Google ao se buscar os termos "Lula PT" e "Lula Tópicos". O link direcionava o usuário para o site "Lulaflix: Conheça a verdade sobre o ex-presidiário".

A página reúne uma série de notícias, publicadas em outros sites, inclusive em veículos de imprensa, com conteúdos a respeito da campanha de Lula. Alguns textos tratam de processos que tiveram o petista como alvo na Justiça, relembram o escândalo do mensalão e resgatam reportagens antigas.

Uma delas é de 2018, publicada no portal G1, intitulada "Entenda a condenação de Lula no caso Tríplex". A condenação foi posteriormente anulada, em 2021, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), mas essa informação não consta no Lulaflix.

O site bolsonarista ainda compartilha nota publicada no site "Diário do Poder" que busca vincular o ex-presidente ao PCC por meio de uma delação premiada de Marcos Valério, que foi operador do mensalão. Antes, o TSE já havia determinado, por seis votos a um, que Bolsonaro removesse três postagens que faziam a associação do candidato à facção criminosa.

Um dos posts que tiveram de ser retirados por Bolsonaro era um áudio da TV Record compartilhado pelo presidente nas redes. A divergência na corte foi aberta pela relatora Maria Claudia Bucchianeri, que julgou que o teor do áudio não havia sido desmentido.

A campanha de Bolsonaro foi procurada, mas disse que não vai se pronunciar sobre o assunto.

Print com imagem do impulsionamento de site criado pela campanha de Jair Bolsonaro (PT) com conteúdo a respeito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Campanha de Jair Bolsonaro (PL) impulsiona conteúdo com notícias negativas ou polêmicas sobre o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT). - Julia Chaib/Folhapress

A advogada especialista em direito eleitoral Maria Recchia vê indícios de irregularidade na conduta da campanha bolsonarista com relação à página Lulaflix.

"Se tiver patrocínio para chegar nesse site, é completamente vedado. Não se pode impulsionar de maneira alguma propaganda negativa", avaliou Recchia.

A infração pode levar a multa. Para ela, cabe também a discussão se houve o "uso indevido dos meios de comunicação social, já que muito embora se trate de site e não de rádio e TV, é uma forma de comunicação digital com aderência ao eleitorado".

Se for esse o caso, a punição pode levar à cassação do registro e do diploma, se eleito; além de uma inelegibilidade por oito anos.

O advogado Sidney Neves, membro da Abradep (Associação Brasileira de Direito Eleitoral e Político) e diretor do Ibrade (Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral), diz que, em tese, é vedado o impulsionamento de propaganda negativa, mesmo que baseado em notícias verdadeiras.

"Você só pode fazer a crítica dura baseada em notícias negativas na propaganda na TV e rádio. Propaganda paga na internet é vedada, só pode por meio de impulsionamento, que é uma exceção. Porém vedado o impulsionamento de propaganda negativa de adversários", avalia Neves.

Na noite de terça (13), a campanha do PT recorreu ao TSE para pedir o fim do impulsionamento do Lulaflix, assim como a retirada do ar do site,

A defesa de Lula alega que o adversário infringiu a lei ao impulsionar propaganda negativa contra o petista. Também aponta que a página em questão não foi informada ao TSE.

Afirma ainda que o impulsionamento não é identificado como propaganda eleitoral, o que também fere a legislação, segundo os advogados do petista.

Além da remoção do conteúdo, a campanha de Lula solicitou a aplicação de multa.

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