Descrição de chapéu
Eleições 2022 Datafolha

Matinê do Padre Kelmon diverte sem trazer nada de novo à campanha

Ausência de Lula e Bolsonaro são alvos óbvios do debate presidencial no SBT

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O debate de candidatos a presidente realizado pelo SBT e um pool de mídia cumpriu um inesperado papel de boa diversão a quem se dispôs a assisti-lo. O canal de Silvio Santos parecia estar testando uma nova atração, a Matinê do Padre Kelmon, com direito a bênção na abertura e sermão.

O obscuro religioso, aderente de uma desconhecida ramificação não reconhecida da Igreja Ortodoxa no Peru, roubou a cena com sua inusitada presença, dado que o poste de Roberto Jefferson (PTB) na disputa ronda o traço absoluto nas pesquisas e não é exatamente conhecido.

Padre Kelmon faz gesto de bênção no começo do debate do SBT
Padre Kelmon faz gesto de bênção no começo do debate do SBT - Reprodução/Estadão no Youtube

Isso dito, com suas vestes rituais, ele cumpriu o momento Cabo Daciolo da eleição até aqui. Seu papel, contudo, nada tinha de inocente: todas suas intervenções foram destinadas a levantar a bola de Jair Bolsonaro (PL), o presidente que tem no impedido Jefferson um de seus mais guturais apoiadores.

O fato de estar num ambiente controlado pelo sogro do ministro das comunicações de Bolsonaro, Fábio Faria, apenas aumentou o incômodo com as trocas de falas sobre temas como a cristofobia na Nicarágua ou algum ataque a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Depois, Kelmon jogou a Ciro Gomes uma casca de banana sobre a defesa do aborto. Muito mais experiente em debates do que os restantes no auditório, o pedetista saiu-se bem. O religioso não se constrangeu e repetiu a investida contra Simone Tebet (MDB), ainda a acusando de não ser uma feminista de verdade.

A senadora sul-mato-grossense, visivelmente incomodada, acabou se enrolando na resposta e trocou uma patética discussão sobre sua eventual confissão ao padre.

Em uma outra ocasião, Kelmon basicamente fez propaganda de Bolsonaro e criticou Lula numa resposta, rasgando completamente a fantasia eclesial. A sua inclusão, ocupando o convite que era ao PTB de Jefferson devido à representação parlamentar, caiu como uma luva para o presidente.

Ausente no show, o líder das pesquisas foi o alvo mais evidente do debate. Aliados do ex-presidente usavam inclusive a presença de Kelmon com evidência de que o jogo não seria em casa, mas isso não parece dizer nada de bom a ele em termos de imagem: espera-se que um postulante à Presidência esteja pronto para escrutínios desagradáveis.

O púlpito vazio terá presença garantida na propaganda dos adversários de Lula. Isso será capaz de mudar algo um cenário que se mostra bastante consolidado desde o começo do ano? Parece improvável. No cálculo lulista, o que importa é sair do debate de alta audiência na Globo, na quinta (29), com um 0 a 0.

Mas não foi só Lula que apanhou. Em uma certa justiça poética, Bolsonaro provou uma taça do seu próprio veneno sexista ao ser interpelado por Soraya Thronicke (União Brasil), que o instou a não "cutucar a onça com sua vara curta", logo após fazer uma menção à compra de remédios para disfunção erétil pelas Forças Armadas.

Bolsonaro perdeu-se numa resposta em que tentava dizer que médicos receitam Viagra e Cialis para curar vários males, e que sua função principal é apenas um "efeito colateral". Como a cloroquina na pandemia prova, o presidente tem problemas quando a prateleira da farmácia está em questão.

Curiosamente, ele foi tímido ao aproveitar o otimismo com economia, talvez porque atestado pelo Datafolha que tanto ataca. Ao fim, ainda falou ao "pobre que passa necessidades" que hoje está com Lula —o petista lidera por 57% a 24%, segundo o Datafolha, entre quem ganha até 2 mínimos. Já seu golpismo exacerbado, para alívio de aliados do centrão, foi contido.

O presidente tentou se equilibrar em relação às duas mulheres presentes, que o atacaram repetidamente. Foi bem numa altercação inicial com Tebet, mas na sequência chamou Thronicke de estelionatária quase aos berros. Com 56% de mulheres dizendo que não votam de jeito nenhum em Bolsonaro, foi pouco, mas também não comprometeu como no ataque a uma jornalista no debate Folha/UOL/Cultura/Band.

Ao fim, o debate serviu para animar o fim de tarde e começo de noite de sábado, mas não registrou nenhum golpe definitivo que possa alterar o rumo da campanha em sua semana final. Para o eleitor, substância zero, como de resto é a regra neste tipo de embate: ele serve para eventual destruição, e só. A ansiedade das campanhas ficará para a próxima quinta na Globo mesmo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.