Moraes conversa com militares sobre urnas a portas fechadas no TSE

Ministro diverge de Fachin, ex-presidente do tribunal, que havia fechado o diálogo com as Forças Armadas

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Brasília

O ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), escanteou entidades de fiscalização do pleito e integrantes da CTE (Comissão de Transparência das Eleições) e passou a centralizar diretamente com as Forças Armadas, em reuniões fechadas, as discussões sobre mudanças nas regras das eleições.

A postura do ministro diverge da linha adotada por Edson Fachin, ex-presidente da corte, que havia rejeitado reuniões exclusivas com militares sob argumento de que era preciso tratar todos os fiscais da votação com igualdade. Fachin também afirmava que a discussão sobre as regras das eleições de 2022 cabia a "forças desarmadas" e que esse debate já havia se esgotado.

O presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, na primeira sessão da corte após sua posse - Pedro Ladeira - 18.ago.2022/Folhapress

Moraes fez duas reuniões com o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, desde que assumiu o TSE, em 16 de agosto. Depois do último encontro, em 31 de agosto, no qual também participaram técnicos das Forças Armadas e do tribunal, Moraes anunciou que estudaria uma forma de reformular o teste de integridade das urnas feito no dia das eleições —o principal pleito dos militares.

A resolução sobre a reformulação do teste de integridade foi aprovada nesta terça-feira (13). O TSE determinou que de 32 a 64 das 640 urnas que devem ser auditadas devem usar a biometria de eleitores.

A terceira reunião com os militares estava prevista para esta terça-feira (13), mas foi desmarcada por Moraes após o TSE negar ter feito um acordo para facilitar às Forças Armadas a divulgação de dados sobre a totalização dos votos.

Por meio da Lei de Acesso à Informação, o TSE disse que "não foi redigida ata das reuniões" de Moraes com representantes das Forças Armadas.

Procurado, o tribunal não se manifestou sobre a decisão de reabrir a discussão com os militares semanas antes das eleições e em reuniões fechadas.

O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, recebe o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e militares para tratar de propostas sobre as eleições
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, recebe o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e militares para tratar de propostas sobre as eleições - 31.ago.22/Divulgação/TSE

Em nota divulgada sobre a reunião do último dia 31, o tribunal afirmou que os militares reconheceram o "êxito" de análises feitas por universidades no modelo mais recente da urna eletrônica. Também disse que foi "reafirmado" que haverá divulgação dos boletins de urna pelo TSE para quem quiser fazer a conferência e totalização dos resultados.

O tribunal ainda anunciou, na mesma nota, que seria avaliada a "possibilidade de um projeto piloto complementar" sobre o teste de integridade das urnas nos moldes defendidos pelos militares, com o uso da biometria de eleitores reais.

Sem ata das conversas e presença de outras entidades, porém, militares e integrantes do TSE têm divergido sobre os pontos tratados nas reuniões fechadas.

Representantes das Forças Armadas que acompanham as discussões com o tribunal dizem reservadamente que Moraes prometeu em 31 de agosto facilitar a divulgação de dados sobre a totalização do resultado do pleito, o que foi negado pelo tribunal e pelo Ministério da Defesa.

Militares também contam com mudança ainda neste ano na forma de realizar o teste de integridade das urnas, usando a biometria de eleitores reais em parte dos equipamentos nos dias de votação. O TSE não havia confirmado a mudança até esta terça-feira (13), quando aprovou uma resolução para adotar a biometria em parte da auditoria.

Na segunda-feira (12), mesma data em que negou que tenha feito acordo sobre divulgação dos dados da totalização das eleições, Moraes suspendeu um encontro com o ministro da Defesa que estava previsto para ocorrer no dia seguinte.

O próprio tribunal, em 2021, inseriu as Forças Armadas no grupo de entidades que fiscalizam as eleições e na Comissão de Transparência das Eleições. Desde então, os militares romperam um silêncio de 25 anos sobre as urnas e apresentaram diversas dúvidas e sugestões ao tribunal, que têm sido usadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para ampliar questionamentos ao voto eletrônico e fazer insinuações golpistas.

As principais propostas dos militares foram apresentadas à CTE e rejeitadas ainda no primeiro semestre pelo tribunal eleitoral. As reuniões da comissão foram registradas em atas. Também foram formalizados em ofícios os pedidos dos militares e as respostas do tribunal.

Os militares insistiram nos pedidos e passaram a requisitar, a partir de junho, reuniões exclusivas com Fachin, então presidente da corte. O ex-presidente da corte, no entanto, rejeitou essa possibilidade e argumentou que as discussões sobre as regras de votação deveriam ocorrer no âmbito da CTE.

Em 19 de junho, Fachin disse, em resposta enviada ao ministro da Defesa, que as propostas dos militares seriam consideradas para as eleições pós-2022.

Diante da resistência de Fachin, ministros do governo Bolsonaro passaram a apostar na reabertura das negociações com o tribunal a partir da posse de Moraes.

O discurso do governo, nos bastidores, era de que Bolsonaro poderia reduzir o tom golpista de suas declarações se o TSE aceitasse as sugestões das Forças Armadas.

Dias antes de Moraes assumir o TSE, auxiliares do ministro pediram para técnicos da Justiça Eleitoral montarem uma simulação da mudança no teste de integridade das urnas.

Como mostrou a Folha, essa simulação foi feita na semana da posse de Moraes. Nesse dia, técnicos do tribunal já disseram a Moraes que eram contra ceder aos militares, apontando risco de tumulto no dia das eleições.

Dias mais tarde, porém, o ministro acenou aos militares e disse que iria avaliar a possibilidade de reformular uma parte dessa auditoria. O entorno de Bolsonaro considerou o acordo de Moraes como um armistício entre o governo e o TSE.

O chefe do Executivo, no entanto, já mostrou desconfiança sobre o acordo e segue levantando dúvidas e teorias da conspiração sobre as urnas.

"Aceitando as propostas das Forças Armadas, a chance de fraude chega próximo de zero. Próximo de zero não é zero. Por que bater nessa tecla? Por que evitarem camadas de transparência?", disse Bolsonaro à Jovem Pan, no último dia 6.

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