Grupos bolsonaristas reagem à derrota com 'fraude nas urnas' e apelo por golpe das Forças Armadas

Mensagens no Telegram dizem que algoritmo fraudou a apuração e defendem intervenção de militares

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São Paulo

Com menos de 1% das urnas apuradas, a narrativa de que a eleição estaria fraudada já povoava grupos bolsonaristas no Telegram. Ao longo da apuração, mesmo enquanto o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) aparecia à frente do vencedor Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a maior parte das manifestações questionava a lisura do pleito.

"Começou a fraude, o presidente está descendo e o maldito subindo, por isso o Alexandre de Moraes [presidente do TSE] deu entrevista todo manso!", escreveu um apoiador. "Isso é roubo nas urnas" e "a urna está com algoritmo" são exemplos de mensagens trocadas ainda no início da totalização dos votos.

Conforme Lula se aproximava de Bolsonaro, mais mensagens surgiam com acusações de uma possível fraude na apuração. Crescia também o apelo por uma ação das Forças Armadas, o que seria um golpe de Estado.

O discurso golpista se agravou durante a segunda-feira (31), marcada por bloqueios de caminhoneiros nas estradas e por grupos convocando pessoas para irem às ruas.

O Observador Folha/Quaest monitora 176 grupos públicos bolsonaristas no Telegram.

pessoas seguram cartaz que defende que o presidente Bolsonaro acione as forças armadas
Ato de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) no 7 de Setembro na avenida Paulista - Mathilde Missioneiro - 7.set.2022/Folhapress

Diferentes gráficos que simulariam a variação dos percentuais de Lula e Bolsonaro ao longo do primeiro e segundo turno foram compartilhados. "Lula ultrapassa praticamente na mesma porcentagem", diz a legenda de uma dessas imagens. "O mesmo padrão do primeiro turno. Está na cara que é manipulado."

Bolsonaristas defendem a tese infundada de que o artigo 142 da Constituição permitiria uma intervenção dentro das regras do jogo.

"Maior fraude eleitoral de todos os tempos", "estou sentindo cheiro de 142", "esperando as 4 linhas", "Artigo 142 urgente", "Exigimos as Forças Armadas agora" são exemplos das mensagens que foram enviadas em grupos que reúnem milhares de integrantes e que estiveram em polvorosa durante a apuração.

Logo no início da apuração, começou a circular nos grupos também a informação de que Bolsonaro assistia à contagem no Palácio da Alvorada, mas teria saído "às pressas do local em comboio com o ministro da Justiça". Pouco depois, passou a ser compartilhada a mensagem de que o motivo para a suposta saída do presidente teria sido que "o Exército pegou o algoritmo durante o uso".

Depois da consolidação do resultado, parte dos usuários ressaltava que Bolsonaro tem até o fim do ano no cargo e que ainda poderia agir. Outros criticavam o presidente e o Exército por não terem reagido, deixando a situação chegar ao ponto de Lula ser eleito.

"Forças Armadas nos deixaram na mão", "no dia 7 setembro de 2021, Bolsonaro teve a opção de enquadrar Alexandre de Moraes" são exemplos. Outros eleitores ficaram na defensiva: "Não depende só do presidente não. O povo tem que ir na rua pedir a ele para acionar as forças armadas" e "calma minha filha. Militares são estrategistas. Vamos confiar no PR e nas FFA [Forças Armadas]!".

Também voltaram a circular prints de sites que mapeiam ameaças digitais ao redor do mundo para sugerir que ataques cibernéticos estrangeiros eram direcionados contra o Brasil. Em geral, esse tipo de conteúdo citava Washington. Alertas de plataformas do tipo são corriqueiras e o Brasil sistematicamente aparece entre os principais alvos.

"Os russos acabaram de cortar o sinal de Washington nesse exato minuto… os russos entraram na briga!", dizia uma das mensagens.

Ataques de teor xenofóbico contra nordestinos —região em que o petista pontuou muito à frente de Bolsonaro— também foram registrados nos grupos. Muitos, por outro lado, disseram que a culpa não seria do Nordeste, mas da fraude nas urnas.

"Só peço uma coisa para vocês, fiquem aí no Nordeste, não venham para São Paulo, para o Rio de Janeiro, para Santa Catarina, para o Espírito Santo porque aqui as pessoas voltaram no Bolsonaro, fiquem aí e procurem uma vida melhor."

O antipetismo também apareceu nas conversas, indicando medo do que o governo Lula representará. Menções a Venezuela e medo do comunismo ou de uma suposta ditadura estiveram entre os principais assuntos.

"Tudo que foi feito, agora vai ser destruído", "imaginem as fazendas produtivas sendo invadidas pelo MST", "agora os petistas vão saquear os supermercados, casas, bares, restaurantes etc".

"Meu lema agora é boicote em comércio de petista, cidade petista. Não contrato petista. Pode me chamar de racista, qualquer ‘ista’ que quiserem."

O discurso de fraude e desconfiança também foi incentivado por formadores de opinião do bolsonarismo.

"Mostre os gráficos para qualquer estatístico estrangeiro sem referenciar do que se trata e a resposta será sempre a mesma: algoritmo. Eu fiz o teste. A grande pergunta é: e agora?", escreveu o ex-candidato a deputado federal Ed Raposo (PTB-PB).

O comentarista Rodrigo Constantino e o empresário Bernardo Kuster também publicaram imagens da apuração do primeiro e do segundo turno e mencionaram o "algoritmo", sem dar mais explicações.

Vídeos sem contexto de confraternizações em presídios e com pessoas armadas, uma alusão a possíveis traficantes, também foram disseminados por influenciadores. "Cuidem dos seus filhos. Blindem seus carros. Aumentem sua segurança. Adquiram seguros de vida. Não saia à noite. O chefe deles virou presidente", disse o deputado federal eleito Gustavo Gayer (PL-GO).

A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) escreveu uma mensagem mais resignada no Twitter. "O sonho de liberdade de mais de 51 milhões de brasileiros continua vivo. E lhes prometo, serei a maior oposição que Lula jamais imaginou ter."

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