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PL ignora Moraes e insiste em contestar resultado apenas do 2º turno

Relatório golpista utilizado pelo partido de Bolsonaro para pedir anulação de votos tira conclusões incorretas

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Brasília

O PL vai insistir na contestação do resultado apenas do segundo turno das eleições, contrariando a determinação do ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), de que os questionamentos do partido sobre urnas contemplassem também o primeiro turno do pleito.

A estratégia foi anunciada nesta quarta-feira (23) pelo presidente da legenda, Valdemar Costa Neto.

O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, em entrevista para anunciar pedido de verificação de resultado das eleições - Pedro Ladeira/Folhapress

O partido enviou ao TSE na tarde desta quarta os argumentos para insistir com o pedido original feito na véspera. Moraes havia determinado 24 horas de prazo para que a o PL fizesse um aditamento.

"Estender a verificação extraordinária pretendida também para o primeiro turno parece ser medida açodada, especialmente porque, como efeito prático, traria a própria inviabilidade da medida ora pretendida, em razão da necessidade de fazer incluir no polo passivo da ação todos os milhares de candidatos que disputaram algum cargo político nessas eleições, bem como seus partidos, coligações e federações", alegou o PL.

A manifestação inicial do PL defendendo a invalidação de votos depositados em urnas de modelos anteriores a 2020 foi apresentado na terça (22). No entanto, o relatório utilizado pelo partido do presidente Jair Bolsonaro para fundamentar seu pedido tira conclusões incorretas a partir dos dados identificados, segundo especialistas em computação consultados pela Folha.

Além disso, o documento do PL possui lacunas ao ignorar o primeiro turno da eleição e a distribuição dos diferentes modelos de urnas dentro de um mesmo estado.

De acordo com o partido, mais de 279,3 mil urnas eletrônicas utilizadas no segundo turno do pleito "apresentaram problemas crônicos de desconformidade irreparável no seu funcionamento". Para as atuais eleições, a Justiça Eleitoral disponibilizou cerca de 577 mil equipamentos.

As urnas questionadas também foram utilizadas no primeiro turno, quando o PL elegeu a maior bancada de deputados federais da próxima legislatura —terá 99 cadeiras na Câmara. Ao restringir o pedido ao segundo turno, portanto, o partido não lança dúvida sobre a primeira etapa.

Ainda na terça, Moraes pediu a ampliação da ação do PL para englobar também o primeiro turno.

"As urnas eletrônicas apontadas na petição inicial foram utilizadas tanto no primeiro turno, quanto no segundo turno das eleições de 2022. Assim, sob pena de indeferimento da inicial, deve a autora aditar a petição inicial para que o pedido abranja ambos os turnos das eleições, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas", disse o ministro na ocasião.

Ao ampliar o escopo da petição do PL, Moraes buscou emparedar o partido. A legenda de Bolsonaro foi a que mais cresceu nas eleições e, no primeiro turno do pleito, se converteu na maior bancada na Câmara e no Senado.

Ou seja: caso insistisse na tese de que houve problemas em urnas também no primeiro turno, o PL estaria endossando uma ação judicial que, em tese, tem potencial de prejudicar as vitórias eleitorais do próprio partido.

Apesar de a representação pedir a invalidação de votos em caso de confirmação, pelo TSE, de "mau funcionamento" de urnas eletrônicas, Valdemar tentou difundir o discurso de que o PL não está questionando o resultado da eleição, mas defendendo apenas uma verificação.

"Não pode haver dúvida sobre o voto. Se isso for uma mancha na democracia, temos que resolver isso agora", disse o aliado de Jair Bolsonaro.

"Nós não estamos discutindo a eleição, estamos discutindo a história do Brasil. Porque a soma das urnas novas, que têm todo o cadastro, dá uma vitória para o presidente Jair Bolsonaro de 1 milhão e 78 mil votos se não forem consideradas as urnas que têm indícios. E toda eleição, toda votação, não pode haver dúvidas sobre o voto."

Ele repetiu algumas vezes durante a entrevista, com a ajuda do advogado do partido, Marcelo Bessa, que o PL acionou o TSE com base em argumentos técnicos.

Bessa atua na defesa criminal de Valdemar há anos, incluindo o caso do mensalão, esquema de compra de voto no Congresso durante o primeiro mandado de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A equipe jurídica da campanha de Bolsonaro foi chefiada por Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, ex-ministro do TSE, que não assina a peça apresentada pelo PL.

Segundo especialistas em computação consultados pela Folha, o relatório utilizado pelo PL tira conclusões incorretas a partir dos dados identificados.

O PL questiona a ausência do código de série das urnas no "diário de bordo" desses equipamentos mais antigos. Alega que, com isso, não é possível fiscalizá-las. Há, porém, outros dados e formas para identificar essas urnas.

Ou seja, diferentemente da afirmação do parecer, a falha apontada não impossibilita a vinculação do arquivo gerado pela urna (conhecido como log da urna) com sua urna física correspondente, argumento base do relatório do PL.

Na comparação feita por um especialista, é como se um um órgão estatal, por um erro, não tivesse em sua planilha os dados do INSS de um cidadão, mas tivesse RG e CPF —sendo possível, portanto, identificá-lo.

Valdemar afirmou que a iniciativa do PL tem respaldo em uma resolução do TSE de 2021, segundo a qual entidades fiscalizadoras podem solicitar verificação extraordinária após o pleito, desde que sejam relatados fatos e apresentados indícios de circunstâncias que justifiquem.

O TSE vai avaliar se há na auditoria do partido elementos para uma eventual verificação.

A avaliação de interlocutores na corte é que não há chances de o pedido de anulação de urnas feito pelo PL ser atendido pela Justiça Eleitoral.

Em outra frente, o relatório dá combustível para os apoiadores de Bolsonaro que realizam atos antidemocráticos em frente a quartéis pelo Brasil.

Os manifestantes pedem um golpe de Estado liderado pelas Forças Armadas e contestam a vitória de Lula nas eleições deste ano.

Desde o início de seu governo Bolsonaro liderou uma campanha de desinformação e de contestação contra o sistema eleitoral do país. Ele chegou a ameaçar não aceitar o resultado eleitoral em caso de derrota, defendeu o voto impresso e disseminou teorias já desmentidas contra as urnas eletrônicas.

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