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Governo Bolsonaro diz no STF que emenda de relator é constitucional e prerrogativa do Congresso

PGR também foi a favor de emendas; Lindôra diz que pessoas contrárias fizeram 'palco político' do Supremo

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Brasília

Na primeira sessão de julgamento das chamadas emendas de relator, usadas como moeda de troca nas negociações políticas entre Planalto e Congresso, a AGU (Advocacia-Geral da União) defendeu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que o instrumento é constitucional.

Segundo o advogado-geral da União, Bruno Bianco, o regime, em seu entendimento, não ofende princípios constitucionais, "em especial com os aperfeiçoamentos efetivados após a decisão cautelar desta suprema corte".

Em 2021, a ministra Rosa Weber determinou a suspensão do uso dessa verba. Ela recuou da decisão um mês depois, após o Congresso apresentar uma série de medidas para dar transparência às emendas.

A ministra Rosa Weber , presidente do Supremo Tribunal Federal, durante sessão plenária destinada a julgar a validade do orçamento secreto do Congresso Nacional - Pedro Ladeira/Folhapress

A AGU é responsável pela representação jurídica do Estado brasileiro e o chefe do órgão, Bruno Bianco, tem status de ministro do governo Jair Bolsonaro (PL).

Bianco afirmou, em sua sustentação oral no Supremo, que a decisão da ministra ajudou a deixar o instrumento mais transparente.

Segundo ele, na Constituição "não há qualquer tipo de impedimento" às emendas de relator. Ele disse ainda que elas são diferentes das emendas que têm previsão expressa no texto constitucional, como as individuais e as de bancada.

"Todavia, é muito importante registrar que casos de malversação de recursos públicos devem sempre ser fiscalizados e punidos, sendo imprescindível o constante aperfeiçoamento dos mecanismos de transparência e publicidade", acrescentou.

O STF começou a julgar, nesta quarta-feira (7), ações de quatro partidos contra as chamadas emendas de relator, instrumento usado como moeda de troca nas negociações políticas entre Planalto e Congresso.

Após esta quarta, o tribunal terá apenas mais duas sessões de julgamentos até o início do recesso do Judiciário, no próximo dia 20. As ações que serão avaliadas foram apresentadas em 2021 por Cidadania, PSB e PSOL e em 2022 pelo PV.

Rosa Weber, a presidente do STF, é a relatora dos quatro processos. Ela será a primeira ministra a votar, o que só ocorrerá na quarta-feira (14), na próxima sessão do Supremo.

Nesta quarta, além da AGU também fizeram sustentações orais os advogados do PSOL e do PV, além de partes interessadas, sobretudo instituições de defesa da transparência.

Também falaram advogados que representam o Senado e a Câmara, em defesa das emendas. Assim como o Legislativo, a PGR (procuradoria-geral da República) também foi favorável às emendas.

A vice-PRG, Lindôra Araújo, disse que a decisão de Rosa fez o Congresso dar mais transparência às emendas e deu maior controle às suas execuções. "Em razão disso, eu acho que está esgotado esse assunto", afirmou.

Em seguida, criticou o STF por ter aberto espaço para partes interessadas que criticaram as emendas.

"O Supremo, nesse momento, não é um palco político. Ele não deveria, como foi feito durante todas as sustentações, [dar palco] apenas [à] crítica ao Congresso Nacional. Os políticos estão lá pelo voto popular, que deve ser respeitado."

Além de partidos políticos, representantes do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, da Associação Contas Abertas, da Transparência Brasil e da Transparência Internacional falaram contra esse instrumento de distribuição de verbas orçamentárias.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal deverão se concentrar sobre algumas questões no julgamento.

Uma delas é a transparência das emendas, a outra é a falta de critério para distribuição do dinheiro reservado pelas emendas do relator, que têm sido usadas para favorecer parlamentares alinhados com o governo e a cúpula do Congresso, em detrimento de seus adversários.

Há ainda a possibilidade de os ministros determinarem regras que estabeleçam limites para aplicação dos recursos.

As emendas de relator foram usadas em diversas tratativas do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) com o Congresso.

"A alocação de dezenas de bilhões de reais sob a rubrica de emendas do relator não tem outro objetivo se não a burla da distribuição isonômica dos recursos públicos e da publicidade orçamentária", disse o PSB em sua ação, assinada pelos advogados Felipe Santos Correa e Ana Luísa Rocha.

O partido argumentava que o modelo foi "desvirtuado", sem "quaisquer critérios de distribuição e de identificação dos valores".

A ação do PSOL é mais ampla. O partido afirma que as emendas de relator em si são inconstitucionais porque permitiram "o uso da execução orçamentária como instrumento de barganha e troca de apoio político".

"Degradou-se um pouco mais as relações entre Executivo e Legislativo pois o modus operandi denota a existência de prévios e espúrios acordos políticos para a execução de emendas", afirma o advogado do partido, André Maimoni, na ação.

Ao Supremo, na sustentação oral, ele disse que "não há como a gente não relacionar esse caso com o escândalo dos anões do Orçamento das décadas 1980 e 1990".

"As RP-9 [como são chamadas as emendas de relator] matam a organicidade do Orçamento formal, criam um orçamento paralelo, e nessa apropriação e nessa bagunça que se instaurou, verificam-se verbas direcionadas para despesas correntes, e não para investimentos, como seria o natural", argumentou.

O PV, que ingressou depois das outras legendas com uma ação, também diz que as emendas de relator são inconstitucionais e que não houve "clareza, transparência, livre acesso, rastreabilidade e organicidade" à execução das suas despesas.

O mecanismo, controlado pelas cúpulas da Câmara e do Senado, é hoje o principal trunfo político do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para manter sua grande influência sobre deputados.

À véspera do julgamento, a cúpula do Congresso discutiu um projeto para estabelecer regras de divisão das emendas de relator.

O centrão —grupo de partidos que representa a maioria do Congresso— já havia sinalizado que aceitava rever o formato de distribuição das emendas como forma de manter o poder sobre o Orçamento no governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que fez declarações na campanha contra essas emendas.

Lula já declarou, durante a campanha eleitoral, que as emendas de relator eram a "maior bandidagem" feita em 200 anos da Independência e que o Parlamento nunca "esteve tão deformado como está agora".

Após o resultado das urnas, aliados do petista mudaram o tom e passaram a dizer que é possível haver um acordo com o Congresso para a continuidade das emendas, mas com ajustes na distribuição.

As ações no STF que pedem o fim das emendas de relator são relatadas pela presidente do tribunal, ministra Rosa Weber. Em 2021, ela determinou a suspensão do uso dessa verba.

Rosa recuou da decisão um mês depois, após as medidas de transparência.

Foi criado um sistema para divulgar informações sobre o destino e beneficiários das emendas. No entanto, parlamentares próximos à cúpula do Legislativo têm usado uma brecha nas regras para destinar emendas às suas bases eleitorais sem revelar o padrinho político do recurso.

Para isso, elas são registradas por um usuário externo, que pode ser qualquer pessoa.

Quase 1/3 da verba já negociada em emendas de relator –e divulgada até hoje– atende a solicitações que não foram apresentadas por deputados e senadores. Além disso, a divisão desses recursos continuou privilegiando aliados políticos de Lira, Pacheco e Bolsonaro.

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