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Congresso muda regras de emendas de relator em reação a julgamento do STF

Lewandowski diz que corte vai considerar projeto, que mantém controle sobre parte das verbas nas mãos da cúpula da Câmara e Senado

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Brasília

O Congresso Nacional aprovou nesta sexta-feira (16) o projeto de resolução que fixa critérios para a distribuição das chamadas emendas de relator-geral do Orçamento.

A proposta concentra parte dos recursos nas mãos dos chefes das duas Casas legislativas e divide o montante de acordo com o tamanho das bancadas partidárias.

O projeto de resolução é uma reação da cúpula do Congresso ao STF (Supremo Tribunal Federal), que analisa a constitucionalidade dessas emendas —usadas como moeda de troca nas negociações políticas entre Planalto e Congresso.

Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, durante cerimônia de diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva - Pedro Ladeira -12.dez.2022/Folhapress

O texto vem sendo costurado nos últimos meses pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tentar esvaziar os questionamentos dos ministros ao mecanismo.

A votação estava prevista para a próxima terça-feira (20), mas foi antecipada para esta sexta, pouco após o fim da sessão do STF desta quinta (15).

A sessão do Supremo foi suspensa com o placar de 5 votos contrários ao uso das emendas contra 4 favoráveis, e será retomada na segunda (19). Faltam apenas os votos dos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

Lewandowski afirmou nesta sexta, após reunião com Pacheco, que a corte vai levar em consideração a resolução, e que boa parte dos pontos criticados foram atendidos.

"Muito daquilo que estava proposto nessa resolução de certa maneira atendia às preocupações que foram ventiladas pelos ministros ao longo do julgamento. Nós, segunda-feira, com toda certeza, nos debruçaremos sobre essa resolução que agora foi aprovada, sempre dentro desse sentido importante de diálogo entre os Poderes", disse.

A sinalização de Lewandowski é diferente da que havia sido dada pela presidente do STF, Rosa Weber, ao votar contra as emendas de relator.

Em meio à discussão do projeto de resolução no Congresso, o ministro havia pedido mais tempo na sessão desta quinta para analisar o caso "devido à complexidade da matéria".

Nesta sexta, Lewandowski afirmou que o julgamento foi paralisado "em homenagem" ao Congresso. O magistrado disse que, ao enviar o projeto de resolução para o STF, o presidente do Senado "inaugurou um salutar diálogo institucional".

"Com isso [envio do projeto de resolução] nós paralisamos a nossa votação em homenagem ao Senado Federal, ao Congresso Nacional. Estou tomando conhecimento agora de seu conteúdo e, certamente, nós levaremos essa resolução em consideração quando retomarmos o julgamento", afirmou.

O projeto de resolução foi aprovado pelos deputados federais por 328 votos a favor, 66 contrários e 4 abstenções —eram necessárias 257 manifestações favoráveis. No Senado, foram 44 votos a favor, 20 contra e duas abstenções, quando eram necessários 41.

O relator do projeto de resolução, senador Marcelo Castro (MDB-PI) —que também é relator-geral do Orçamento de 2023—, apresentou um texto substitutivo, mas praticamente manteve o teor da proposta original que havia sido apresentada pelo presidente do Senado.

O projeto prevê que o limite financeiro dessas emendas não poderá ser superior ao total das emendas individuais e de bancada. A resolução também determina que metade dos recursos seja destinada para ações e serviços públicos de saúde, assistência social e educação.

Segundo o texto, o relator-geral poderá apresentar indicações para execução das emendas desde que sejam feitas exclusivamente por parlamentares, ainda que fundamentadas em demandas apresentadas por agentes públicos ou por representantes da sociedade civil.

No formato atual, a decisão sobre o destino dessas emendas cabe ao próprio relator-geral, sem critérios objetivos.

A distribuição das emendas deverá obedecer a alguns parâmetros. Até 5% deverão ser provenientes de indicações conjuntas do relator-geral e do presidente da CMO (Comissão Mista de Orçamento).

Outros 7,5% ficarão a cargo do presidente do Senado e outros 7,5% serão distribuídos conforme indicações do presidente da Câmara. Ou seja, Lira e Pacheco, que devem ser reeleitos em fevereiro do próximo ano, vão manter controle sobre parte da distribuição.

O texto uniu de parlamentares do centrão —que deram sustentação ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), como PL, Progressistas e Republicanos— ao PT do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

O mecanismo foi duramente criticado pelo petista durante a campanha e chegou a ser comparado por ele ao mensalão.

O senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da minoria no Senado, afirmou que as emendas não serão usadas pelo presidente eleito como moeda de troca, e justificou a posição do partido. Segundo ele, o PT não tinha "massa crítica" para "derrubar totalmente" o instrumento, e concordou com a "modulação".

"É a única saída que nós temos para que não fique como está. Se trata de uma nova regra, com transparência, com proporcionalidade e, principalmente, não impositividade [não obrigatoriedade de pagamento]. Nunca houve, mas quando há conluios específicos, funciona. O Legislativo manda e o Executivo cumpre", disse.

"Como aqui não há impositividade, o novo governo não usará esse dispositivo para cooptar ninguém. O presidente Lula não fará isso. O que queremos é nada, mas, neste momento, colocar alguma regra é melhor que o caos", completou.

A posição do PT foi duramente criticada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL). O ex-presidente do Congresso afirmou que a resolução vai na contramão do que defende a maioria dos ministros do STF, e amplia os poderes de Arthur Lira —um dos principais rivais políticos do senador alagoano.

"[A resolução] não resolve nada do ponto de vista da transparência, do ponto de vista da impessoalidade e, mais ainda, agrava a situação ao destinar ao presidente da Câmara dos Deputados 7,5% dos recursos. Isso é um escárnio. Acho que é uma incoerência brutal do PT. Eu conheço a posição do presidente Lula", disse.

Após a sessão, Pacheco afirmou que o projeto é "integralmente bom", e que o Congresso buscou corrigir todos os pontos criticados pelo Supremo. O senador argumentou que as emendas garantem a "descentralização dos recursos" e a "formatação do Orçamento através de uma ação conjunta entre o Executivo e o Legislativo".

"Eu considero adequado o que o Congresso fez hoje, que é uma demonstração de comprometimento com a qualidade do gasto público, com a impessoalidade e algo muito importante, que é a transparência. Ou seja, somente o parlamentar poderá fazer indicação", afirmou Pacheco.

"De modo que, tudo aquilo que era ponto vulnerável apontado pelo Supremo e pelas próprias ações se busca corrigir com essa resolução. Evidentemente que, a depender da decisão do STF, se houver algo mais que o Congresso possa fazer para poder atacar eventuais pontos vulneráveis, obviamente haverá toda nossa disposição de poder fazê-lo."

O projeto prevê ainda até 23,33% para indicações de senadores, obedecendo à proporcionalidade partidária e formalizadas pelo líder do partido, e até 56,66% para indicações de deputados, conforme o mesmo critério de bancada partidária.

O Orçamento de 2023 reserva mais de R$ 19 bilhões para as emendas de relator-geral. O Congresso deve votar o texto na próxima semana, antes do recesso parlamentar. Já a resolução aprovada nesta sexta será válida caso o Supremo forme maioria para preservar o instrumento.

COMO FUNCIONAM AS EMENDAS DE RELATOR

  • Como é atualmente:
    As verbas do Orçamento da União são direcionadas para redutos eleitorais de deputados e senadores, sem critérios objetivos sobre quais parlamentares e bancadas podem fazer as indicações, tampouco sobre os projetos que poderão receber os recursos. O relator-geral pode também realizar indicações para execução das emendas mesmo de pessoas de fora do Congresso. Com isso, os recursos são usados para barganhas políticas entre governo e cúpula do Legislativo
  • Proposta de mudança do Congresso:
    A proposta do Congresso fixa um critério para as indicações no Senado e na Câmara, seguindo a proporcionalidade partidária e formalizadas pelo líder do partido. O relator-geral poderá realizar indicações para execução das emendas desde que sejam feitas exclusivamente por parlamentares. O poder de barganha com Planalto, porém, continua, dada a concentração de recursos nas mãos das cúpulas das Casas. E não haveria as mesmas exigências técnicas referentes às demais emendas individuais e das bancadas.
  • Transparência
    Como é atualmente:

    Existe pouca transparência sobre a destinação dos recursos e na identificação do autor das propostas. Um dos problemas é que o sistema tem pedidos registrados apenas como de autoria de "usuário externo", sem especificar quem são. Cerca de R$ 1,85 bilhão foi pago em 2022 a partir deste tipo de indicação.
    Proposta de mudança do Congresso:
    Emendas serão feitas exclusivamente por parlamentares.
  • Limite financeiro das emendas
    Como é atualmente:

    O valor das emendas do relator não pode ultrapassar a soma das emendas individuais e de bancadas
    Proposta de mudança do Congresso:
    Ficaria do mesmo jeito
  • Destinação obrigatória
    Como é atualmente:

    Não existe obrigatoriedade para a destinação dos recursos. O dinheiro não precisa ser aplicado em uma área específica
    Proposta de mudança do Congresso:
    Mínimo de 50% deve ser destinado para ações nas áreas da saúde ou de assistência social
  • Distribuição das emendas
    Como é atualmente:

    Sem critérios claros para distribuição do dinheiro
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