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Governo Lula ataque à democracia

Crítica a Temer mostra um Lula assombrado pelo impeachment

Petista usa crédito político da crise para tentar marcar opositores como golpistas em potencial

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São Paulo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) obteve uma vitória política vital para seu começo de terceiro mandato após a tragédia golpista que se abateu sobre Brasília no dia 8 de janeiro.

Como é comum no presidencialismo brasileiro, no qual tudo leva à cadeira do ocupante do Planalto, o petista galvanizou em torno de si a resposta ao vandalismo dos bolsonaristas que depredaram as sedes dos Poderes.

O presidente Lula durante entrevista coletiva em Montevidéu, na quarta (25)
O presidente Lula durante entrevista coletiva em Montevidéu, na quarta (25) - Mariana Greif - 25.jan.2023/Reuters

Quase três semanas se passaram, e uma máquina de investigação e punição de envolvidos sem paralelo na história recente está em operação. Politicamente, contudo, com a volta dos trabalhos no Congresso na semana que vem, a tendência é a de que o crédito político de Lula comece a se esvair.

Isso explica em parte o ataque gratuito feito ao governo de Michel Temer (MDB) na viagem de Lula ao Uruguai na quarta (25), quando qualificou a gestão do emedebista de golpista, colocando-a no mesmo balaio da de Jair Bolsonaro (PL) ao repisar o tema da herança maldita, usado por praticamente todo governante ao assumir.

Não foi a primeira vez. No segundo turno, também disse que Dilma Rousseff (PT) havia sofrido um golpe no seu impeachment em 2016. Corolário, o então vice Temer e seu governo subsequente seriam golpistas.

Voltando ao tema, Lula amplia a designação para todo o período após o impedimento, buscando uma ponte retórica com o golpismo de Bolsonaro e até a insanidade da turma do 8 de janeiro —uma coisa é apontar o apoio que Temer deu ao ex-presidente em algumas ocasiões, outra é chamá-lo de bolsonarista.

É uma variante nova do "nós contra eles" que sempre pautou o discurso político petista. Antes, "eles" eram "as elites"; agora, a sugestão é de que todo opositor é um golpista potencial.

Ao fazer isso, Lula também revela um certo temor reverencial do impeachment, ainda que isso não esteja nem de longe no horizonte. Afinal, é o instrumento que assombra qualquer presidente brasileiro desde que Fernando Collor caiu em 1992, pela facilidade com que é invocado.

O raciocínio de Lula tem lógica: esticar ao máximo o crédito que ganhou na condução da crise. Resta saber o real impacto disso, dado que a resposta de Temer, sugerindo ao presidente que trabalhasse sem olhar no retrovisor, é exatamente o que boa parte da classe política diz de forma reservada.

Ninguém, neste momento, irá a público contra Lula —com a óbvia exceção dos bolsonaristas mais fiéis. O presidente ainda encarna, assim como o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, a reação institucional à barbárie que nos foi apresentada no Capitólio brasileiro.

Mas é uma questão de decoro, mercadoria com prazo de validade baixíssimo em Brasília. As insatisfações com a desenvoltura de Lula e de alguns de seus ministros nesta fase de empoderamento temporário já são audíveis.

Por fim, há dois fatores laterais. O impeachment, diferentemente do que diz hoje o presidente, foi um processo legal supervisionado pelo Supremo Tribunal Federal.

Por evidente, os impedimentos são atos políticos. As pedaladas fiscais de Dilma eram crimes, mas ela só caiu pela ruína econômica que montou, pela pressão nas ruas e pela falta de apoio político no Congresso —motivo último da queda de presidentes de quaisquer coloração partidária, como o direitista Collor mostra.

Assim, Lula aproveita o atual momento para promover uma espécie de anistia da aliada, a quem não foi tão empático no passado. Dilma frequenta solenidades no Palácio do Planalto e seu governo agora integra o que Lula chamou de "momento auspicioso" das gestões do PT. "Tempus fugit", como diria o poeta romano Virgílio no latim tão ao gosto de Temer, "o tempo voa".

Um segundo ponto é mais comezinho. Espezinhar Temer é fortalecer seus fiadores no MDB, como Renan Calheiros (AL) e Jader Barbalho (PA), ambos com seus filhos no ministério lulista, e mesmo a independente Simone Tebet (Planejamento), que foi candidata ao Planalto pelo partido contra a vontade do ex-presidente.

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