Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Bolsonaro nega ter pedido joias de presente da Arábia Saudita e se diz 'crucificado'

'Me acusam por um presente que eu não recebi nem a primeira-dama', disse o ex-presidente nos EUA

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Washington

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse neste sábado (4) não ter pedido nem recebido qualquer tipo de presente em joias do governo da Arábia Saudita. Bolsonaro se refere a ele especificamente, ao negar envolvimento no caso.

Após um evento nos Estados Unidos neste sábado, ele afirmou que não providenciou a ida de integrantes da FAB (Força Aérea Brasileira) para tratar da liberação das joias nem abusou de sua autoridade no cargo.

"Eu agora estou sendo crucificado no Brasil por um presente que não recebi. Vi em alguns jornais de forma maldosa dizendo que eu tentei trazer joias ilegais para o Brasil. Não existe isso", afirmou.

O ex-presidente Jair Bolsonaro durante evento neste sábado (4) nos Estados Unidos - Roberto Schmidt/AFP

Ele acrescentou também: "Eu estava no Brasil quando esse presente foi ofertado lá nos Emirados Árabes [na verdade, foi na Arábia Saudita] para o ministro das Minas e Energia. O assessor dele trouxe em um avião de carreira e ficou na alfândega, eu não fiquei sabendo".

Segundo Bolsonaro, dois ou três dias depois, a Presidência notificou a alfândega de que as peças deveriam ir para um acervo. "Até aí tudo bem, nada de mais, poderia, no meu entender, a alfândega ter entregue. Iria para o acervo, seria entregue à primeira-dama. E o que diz a legislação? Ela poderia usar, não poderia desfazer-se daqui. Só isso, mais nada."

Nesta sexta-feira (3), o jornal O Estado de S. Paulo revelou que o governo Bolsonaro tentou trazer de forma ilegal para o Brasil um conjunto de joias e relógio avaliado em 3 milhões de euros (cerca de R$ 16,5 milhões).

As peças seriam um presente do governo da Arábia Saudita à então primeira-dama Michelle Bolsonaro.

"Isso aconteceu três dias depois da chegada da comitiva do ministro das Minas e Energia. Me acusam, me crucificam por um presente que eu não recebi nem a primeira-dama. Até o valor daquilo foi uma surpresa para mim, [R$] 16 milhões que estão dizendo. Não sei, pode até ser que seja verdade", disse o ex-mandatário.

O governo Bolsonaro tentou reaver o conjunto sob a alegação de que os objetos seriam analisados para incorporação "ao acervo privado do presidente da República ou ao acervo público da Presidência da República".

A informação consta em documentos publicados em redes sociais pelo ex-chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social na gestão Bolsonaro, Fabio Wajngarten.

Os artigos de luxo estavam na mochila de um militar, que à época era assessor do então ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia). As peças foram apreendidas pela Receita Federal em Guarulhos (SP) em outubro de 2021.

O militar responsável pela mochila compunha a comitiva de Albuquerque, que esteve em Riade —capital do país árabe— de 22 a 25 de outubro de 2021, segundo sua agenda oficial. Nesse período, Bolsonaro estava no Brasil, onde participou de almoço na Embaixada da Arábia Saudita em Brasília no dia 25.

Ao jornal O Estado de S. Paulo Bento Albuquerque disse que a remessa era um presente para Michelle, mas afirmou desconhecer o conteúdo do estojo de joias. Procurado posteriormente pela Folha, negou que sua equipe tenha tentado trazer presentes caros destinados a Bolsonaro e a Michelle.

Nos Estados Unidos, Bolsonaro disse também: "Querem me comparar com o Lula. Não dá para me comparar com o Lula, o Lula é imbatível. Não tenho nada".

Mais cedo neste sábado, o ex-presidente já havia dito à CNN Brasil que está sendo acusado por causa de um presente que não pediu nem recebeu. "Nunca pratiquei ilegalidade. Veja o meu cartão corporativo pessoal. Nunca saquei nem paguei nenhum centavo nesse cartão", disse Bolsonaro à rede de TV.

Em rede social, Michelle negou na sexta-feira ser a destinatária das joias, mas não deu mais explicações e ironizou: "Quer dizer que 'eu tenho tudo isso' e não estava sabendo? Meu Deus! Vocês vão longe mesmo hein?! Estou rindo da falta de cabimento dessa impressa [sic] vexatória", postou no Instagram.

Joias que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou trazer ilegalmente ao Brasil, para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro; valor dos itens é de aproximadamente R$ 16,5 milhões
Joias que o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou trazer ilegalmente ao Brasil, para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro; valor dos itens é de aproximadamente R$ 16,5 milhões - Reprodução - 3.mar.23/Paulo Pimenta no Twitter

Em nota na manhã deste sábado, a assessoria do ex-ministro Bento Albuquerque corroborou os documentos de Wajngarten e disse que, diante dos valores "histórico, cultural e artístico" dos itens, a pasta adotou medidas para encaminhar o acervo "ao seu adequado destino legal".

"Tratavam-se de presentes institucionais destinados à Representação brasileira integrada por Comitiva do Ministério de Minas e Energia —portanto, do Estado brasileiro; e que, em decorrência, o Ministério de Minas e Energia adotaria as medidas cabíveis para o correto e legal encaminhamento do acervo recebido", disse.

O texto também nega que o ministro tenha tentado "induzir, influenciar ou interferir" nas ações da Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos, quando sua comitiva chegou da Arábia Saudita e os artigos de luxo foram retidos.

A ação da Receita Federal na alfândega foi confirmada pelo ministro Paulo Pimenta, da Secretaria Especial de Comunicação Social do governo Lula (PT), que publicou em rede social, ainda na sexta-feira, fotos dos artigos de luxo apreendidos e de um documento que relata o ocorrido na alfândega do aeroporto de Guarulhos.

Na madrugada deste sábado, Wajngarten reagiu com a publicação dos documentos que solicitam a liberação dos itens para avaliação e eventual incorporação ao acervo.

Um dos atos tem data de 29 de outubro de 2021, embora tenha sido efetivamente assinado em 3 de novembro do mesmo ano. O autor é Marcelo da Silva Vieira, chefe de gabinete adjunto de Documentação Histórica do gabinete pessoal do presidente da República.

No texto, endereçado ao chefe de gabinete do ministro de Minas e Energia, José Roberto Bueno Júnior, há o pedido de encaminhamento das joias para avaliação.

Outro ofício, emitido pelo gabinete de Bento Albuquerque em 3 de novembro de 2021, mas que não teve a assinatura exposta por Wajngarten, foi expedido ao chefe de gabinete do Secretário Especial da Receita Federal, Antônio Márcio de Oliveira Aguiar.

O assunto do texto era "liberação e decorrente destinação legal adequada de presentes retidos por esse Órgão, que foram ofertados por ocasião de eventos protocolares no exterior".

O ex-secretário também publicou um documento em inglês, no qual Albuquerque comunica ao ministro de Energia da Arábia Saudita que os itens seriam "incorporados ao acervo oficial brasileiro".

A Receita Federal não respondeu aos questionamentos da Folha. O advogado Frederick Wassef, defensor do ex-presidente, disse que não comentaria.

Na noite de sexta-feira, o ministro da Justiça e Segurança Pública de Lula, Flávio Dino, disse que vai acionar a Polícia Federal para apurar o caso.

"Fatos relativos a joias, que podem configurar os crimes de descaminho, peculato e lavagem de dinheiro, entre outros possíveis delitos, serão levados ao conhecimento oficial da Polícia Federal para providências legais. Ofício seguirá na segunda-feira", afirmou.

Bolsonaro disse nos Estados Unidos que voltará ao Brasil "brevemente".

Hospedado em Orlando desde 30 de dezembro, ele viajou a Washington na sexta para participar da CPAC, evento da direita apoiadora de Donald Trump, acompanhado do filho Eduardo.

Uma caravana de políticos brasileiros acompanha o ex-presidente, como o deputado Mário Frias (ex-secretário da Cultura), Gilson Machado (ex-ministro do Turismo), além do deputado estadual de SP Gil Diniz (PL), do senador Jorge Seif (PL-SC) e da deputada federal Julia Zanatta (PL-SC). O empresário Otávio Fakhoury também acompanha o grupo.

Bolsonaro foi para a Flórida antes de terminar o mandato e rompeu a tradição de passar a faixa para seu sucessor, evitando um encontro com o adversário Lula. Sem visto permanente, ele não tem autorização para ficar mais do que seis meses nos Estados Unidos, segundo um advogado que está lidando com a questão do status do ex-mandatário.

O ex-presidente tem feito palestras para a comunidade brasileira em Orlando e Miami. Recentemente, viajou também aos estados de Oklahoma e Tennessee para participar de eventos.

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