Descrição de chapéu Governo Lula

Lula vê 'armação' de Moro em ameaças do PCC, mas diz não querer acusar sem provas

Senador reage à declaração do presidente: 'O senhor não tem decência?'

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Rio de Janeiro e Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta quinta-feira (23) achar ser "uma armação" do senador Sergio Moro (União Brasil-PR) o plano do PCC descrito pela Polícia Federal para atacar o ex-juiz da Operação Lava Jato.

"Eu não vou falar porque acho que é mais uma armação do Moro. Quero ser cauteloso, vou descobrir o que aconteceu. É visível que é uma armação do Moro", disse o presidente, mesmo após integrantes do próprio governo petista terem exaltado a operação do dia anterior feita pela PF, que é ligada ao Ministério da Justiça.

A ilação feita por Lula acirrou a disputa com opositores e levou Moro a reagir cobrando "decência" do presidente. A juíza Gabriela Hardt, responsável por assinar os mandados de prisão, tirou o sigilo do processo logo após a fala do presidente, levando à divulgação de mais detalhes da investigação policial.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) junto da Ministra da Cultura, Margareth Menezes, em ato pelo direito à cultura, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) junto da Ministra da Cultura, Margareth Menezes, em ato pelo direito à cultura, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro - Eduardo Anzielli - 23.mar.23/Folhapress

A ameaça contra o senador havia sido descrita pelo próprio ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), ao divulgar a operação da PF contra a facção criminosa nesta quarta (22).

"Mas isso vou esperar. Não vou ficar atacando ninguém sem ter provas. Acho que é mais uma armação. E se for mais uma armação, ele vai ficar mais desmascarado ainda. Não sei o que ele vai fazer da vida se continuar mentindo do jeito que ele está mentindo", afirmou Lula, em visita ao Complexo Naval de Itaguaí (RJ), onde é desenvolvido o programa do submarino nuclear da Marinha.

O presidente expôs suspeita sobre a atuação da juíza Gabriela Hardt, que foi substituta de Moro na condução da Lava Jato na Justiça Federal de Curitiba. "Vou pesquisar o porquê da sentença. Fiquei sabendo que a juíza não estava nem em atividade quando deu o parecer para ele."

O discurso de Lula foi criticado reservadamente por aliados. Eles avaliaram que o desencontro das manifestações do governo teve como efeito ressuscitar politicamente Moro, que estava sem destaque nos dois primeiros meses da legislatura no Senado.

Na quarta-feira, a equipe do próprio presidente havia publicado no canal oficial do petista no Telegram uma imagem com os dizeres: "PF de Lula salva a vida de Moro. Sem rancores e farpas".

O ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, disse na ocasião que a operação era demonstração de isenção da PF, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), afirmou ter havido uma "aula de civilidade e democracia do governo Lula".

Horas antes de Lula fazer a ilação sobre armação, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, havia afirmado que a ação da PF era a "maior retratação" à declaração do presidente em uma entrevista na terça-feira (21) —quando lembrou que dizia a procuradores, durante o tempo em que permaneceu preso, que pretendia "foder esse Moro".

Questionado por jornalistas se Lula pretendia se retratar dessa fala sobre vingança, Padilha disse achar que "a maior retratação que foi feita foi a ação da Polícia Federal que protege a vida de todas as autoridades, não só do ex-juiz, do senador, mas de todas as autoridades que possam ser ameaçadas".

"É mais uma demonstração de ação firme por parte do governo federal, de ação firme da Polícia Federal, uma ação republicana da Polícia Federal que protege e vai salvar, proteger a vida de todos aqueles que sejam ameaçados", afirmou Padilha.

Na tarde desta quinta, Moro rebateu Lula e, entrevista à CNN Brasil, afirmou: "O senhor não tem decência?". Ele disse ainda que, "se acontecer alguma coisa com a minha família, a responsabilidade está nas costas deste presidente da República".

O deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex-procurador chefe da Lava Jato, saiu em defesa de Moro e disse que Lula "ataca a credibilidade" do próprio ministro da Justiça, além da dos presidentes da Câmara e do Senado, da Polícia Federal, do Ministério Público Federal, do Ministério Público de São Paulo e da Justiça, "como se fossem farsantes e mentirosos, em mais uma teoria da conspiração lulesca que nega a realidade".

Deltan disse que o petista age "de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo, o que configura crime de responsabilidade".

"Lula está defendendo o PCC, como 'vítima de uma armação', contra os agentes da lei. Está negando o vínculo criminoso dos 9 presos, o imóvel alugado para monitorar a família, o mapeamento dos deslocamentos, o dinheiro e carro apreendidos e mais, como negava as provas da Lava Jato", afirmou.

Como ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (PL), Moro atuou na transferência de chefes do PCC, entre eles Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, para o sistema penitenciário federal. Seu protagonismo no caso, porém, é questionado pelo promotor Lincoln Gakiya, tido como inimigo número 1 da facção criminosa.

Segundo Gakiya, Moro se tornou alvo do PCC após proibir visitas íntimas aos presos no sistema penitenciário federal quando foi ministro de Bolsonaro.

Os ataques contra Moro e outras autoridades, segundo a apuração da PF, ocorreriam de forma simultânea, e os principais alvos estavam em São Paulo e no Paraná.

Como mostrou a Folha, os motivos que levariam Moro a entrar na lista do PCC ainda são alvo de análise por parte de integrantes das forças de segurança de São Paulo. Isso porque, até o final de 2022, o nome do ex-juiz e senador pela União Brasil não constava de lista dos serviços de inteligência paulista sobre os "decretados".

Nesta semana, ao relembrar o período em que ficou preso em Curitiba, Lula disse que pensava em vingança contra o ex-juiz da Lava Jato.

"De vez em quando ia um procurador, entrava lá de sábado, dia de semana, para perguntar se estava tudo bem. Entravam três ou quatro procuradores e perguntavam: 'está tudo bem?' '[Eu respondia:] não está tudo bem. Só vai estar tudo bem quando eu foder esse Moro. Vocês cortam a palavra 'foder'", afirmou o presidente durante entrevista ao portal Brasil 247.

Moro foi o juiz responsável por uma série de condenações pela Lava Jato, inclusive a que manteve o hoje presidente Lula (PT) preso por 580 dias entre 2018 e 2019.

No final de 2018, Moro abandonou a magistratura para, no ano seguinte, assumir o cargo de ministro da Justiça da gestão de Bolsonaro. Em 2020, porém, Moro deixou o governo Bolsonaro, rompido com o presidente, e, em 2021, foi considerado parcial pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em condenação de Lula.

O ex-juiz se filiou ao Podemos para disputar a Presidência em 2022, agora como rival tanto do petista como de Bolsonaro. Acabou decidindo concorrer a senador no Paraná pela União Brasil e foi eleito.

Colaborou UOL

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