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Barroso chama de especulação eventual aposentadoria antecipada do STF

Ministro tem 65 anos, 10 a menos do que o estabelecido para se retirar por idade

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Cambridge (EUA)

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso negou neste sábado (1º) o que chamou de "especulação" sobre uma eventual antecipação de sua aposentadoria na corte.

"É uma especulação que deve vir de alguém que está querendo a minha vaga. Eu na verdade não tenho nenhum plano nesse sentido", disse o ministro à Folha nos Estados Unidos durante a Brazil Conference, evento organizado por alunos das universidades Harvard e MIT (Massachusetts Institute of Technology) em Cambridge, na região de Boston.

Barroso tem 65 anos, 10 a menos do que o estabelecido para se aposentar por idade no STF, e deveria deixar a corte apenas em 2033. Se o fizer, aumenta para três o número de ministros que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicará até o fim de seu mandato.

homem branco de terno preto e camisa branca segura microfone
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luis Roberto Barroso - Miguel Schincariol - 5.ago.2022/AFP

A primeira indicação será para substituir o ministro Ricardo Lewandowski, que deixa a corte no próximo dia 11. A segunda será para o lugar de Rosa Weber, que completa 75 anos em outubro deste ano.

Barroso assume a presidência do STF em outubro para um mandato de dois anos e especula-se que poderia deixar o tribunal ao final desse período, em 2025.

Ao fim do dia, o ministro participou de mesa que discutiu o aumento da eficiência do Judiciário brasileiro. Segundo ele, o país hoje em 76 milhões de processos pendentes, um a cada dois brasileiros adultos, e o prazo médio da tramitação de processos na justiça federal é de 5 anos e 8 meses, o que chamou de "extremamente insatisfatório".

O ministro defendeu que sejam criados desincentivos para evitar o alto número de recursos, que atrasam ainda mais a Justiça —80% dos processos vão para a segunda instância, de acordo com o ministro devido à simplicidade e ao baixo custo de recorrer. "Essa ideia de que tudo tem que chegar no Supremo é uma jabuticaba brasileira que a Justiça tem que reavaliar", afirmou.

Barroso ainda criticou o que chamou de "mito do ativismo judicial", e afirmou que raríssimos são os casos que poderiam ser classificados assim, em que se usa "um princípio vago para a solução de uma situação que não foi tratada na legislação". Um dos poucos exemplos seria o do reconhecimento das uniões homoafetivas, no qual participou como advogado. "Não havia lei, e em nome do princípio da igualdade o Supremo igualou" ao casamento heterossexual, afirmou.

O que existe, na verdade, é um protagonismo judicial, resultado da alta judicialização no país, que faz o Judiciário ter "uma visibilidade incomum".

Questionado sobre como problema vê as decisões monocráticas da corte, afirmou que toma como política pessoal que "tudo o que seja institucionalmente importante deve ser decidido colegiadamente". Ressalvou, porém, que o Supremo recebe 70 mil processos por ano e consegue julgar em plenário de 250 a 300 deles. "Portanto a monocratização é inevitável".

Há risco de outro populista no Brasil em 2026, diz Levitsky

O ministro assistiu a outras palestras, uma delas a do professor de Harvard Steven Levitsky, autor de "Como as Democracias Morrem", que falou sobre os desafios da democracia no Brasil e citou o ataque aos Três Poderes em 8 de janeiro.

Para Levitsky, a resposta das instituições e da direita brasileira foi "muito mais saudável" e vigorosa do que o que ocorreu na invasão do Congresso americano em 6 de janeiro de 2021.

Barroso também foi atacado naquela data, quando manifestantes picharam a estátua A Justiça, que fica na frente do STF, com a frase "perdeu, mané", dita pelo ministro a bolsonaristas em novembro em Nova York, quando foi alvo de protestos em evento que reuniu outros juízes da corte.

Questionado após a palestra sobre a avaliação do cientista político americano, Barroso concordou. "Mesmo pessoas que tenham sido eleitoras do ex-presidente [Jair Bolsonaro] ficaram indignadas com aquelas cenas de barbárie", disse. "A reação que a sociedade brasileira teve revelou uma grande maturidade democrática, vinda de pessoas de ambos os lados do espectro político", afirmou.

Páginas bolsonaristas nos Estados Unidos chegaram a compartilhar a programação da Brazil Conference alertando para a presença de Barroso em Harvard, mas não houve protestos até a tarde de sábado.

Um dos cientistas políticos mais renomados da atualidade, Levitsky afirmou que "o nível de descontentamento em quase todos os países da região [América Latina] é incrivelmente alto" e que, se Lula não conseguir dar respostas às demandas da sociedade, "o que não é totalmente possível", pode haver "facilmente a eleição de uma outra alternativa populista em 2026", mesmo que "retirar um líder autoritário do poder [Bolsonaro] tenha sido uma coisa grande, que não acontece tão frequentemente".

O professor afirmou que o enfraquecimento de partidos políticos que ocorre no Brasil é um fenômeno global, mesmo em países da região com legendas fortes como Chile e Costa Rica, em um processo que chamou de "brasilização".

Segundo ele, porém, a existência de partidos fortes é essencial para a democracia, mas até agora políticos e cientistas sociais não descobriram como preservar essas instituições no século 21.

Levitsky afirmou ainda que o Brasil passa por uma situação semelhante à dos Estados Unidos, em que criticar o atual presidente Joe Biden é visto como uma coisa negativa por supostamente favorecer o ex-mandatário Donald Trump, e afirmou que "esse não é um lugar saudável para estar."

Levistsky também criticou a falta de autocrítica do PT, que chamou de "um dos partidos mais bem sucedidos na história moderna da América Latina". "É uma instituição incrivelmente importante, ms falhou completamente em fazer autocrítica desde 2016", afirmou o professor, dizendo que "isso é ruim não só para o Brasil, mas para o PT", e que é preciso pensar no pós-Lula.

Também defendeu o aumento de políticas de diversidade e disse que o "único tipo de democracia que pode existir no Brasil e em outros lugares é multirracial".

A procuradora-geral do estado de São Paulo, Inês Coimbra, primeira mulher negra a chegar ao cargo, também abordou o tema no evento ao defender o aumento da diversidade na Justiça.

"Como um sistema tão homogêneo pode pacificar uma sociedade heterogênea?", questionou ela.

Ao lado de Barroso, Coimbra pediu que o governo Lula indique uma mulher negra para o STF, na vaga de Lewandowski.

"A diversidade não é um favor, um gesto de generosidade ou retratação histórica", afirmou. "É riqueza, ativo, amplia os horizontes, cobre os pontos cegos" e "contribuirá muito para conferir credibilidade e eficiência aos serviços de Justiça."


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