Descrição de chapéu Folhajus Lava Jato

Appio reformou decisões da Lava Jato e apontou Hardt parcial antes de ser afastado

Juiz federal manteve tom crítico a Moro e juíza, autoridades que já haviam passado pelo cargo

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Curitiba

Agora juiz federal afastado da Operação Lava Jato em Curitiba, Eduardo Appio manteve desde fevereiro o tom crítico contra autoridades que já tinham passado pela mesma cadeira, como Sergio Moro (hoje senador) e Gabriela Hardt, a juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba que agora reassumiu os casos.

O juiz federal Eduardo Appio, suspenso da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pela Lava Jato
O juiz federal Eduardo Appio, suspenso da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pela Lava Jato - Divulgação - 14.fev.23/Justiça Federal do Paraná

Durante os quase quatro meses em que permaneceu no comando dos casos, Appio fez constantes críticas à atuação da dupla em seus despachos e, em uma das suas decisões, apontou "parcialidade" de Hardt para justificar o desbloqueio de bens e valores ao empresário Márcio Pinto de Magalhães em um processo derivado da Lava Jato.

Em despacho assinado em 26 de março, Appio iniciou dizendo que a defesa do acusado pedia novamente a revogação das medidas restritivas sob o argumento de que a juíza Hardt já teria demonstrado "animosidade para com os acusados nos processos, bem como suposta associação com membros do Ministério Público Federal que atuavam neste processo".

Na sequência, Appio afirmou que os diálogos juntados ao processo –obtidos no bojo da Operação Spoofing, que apura o hackeamento de mensagens trocadas entre autoridades da Lava Jato no Telegram– eram suficientes para identificar que a defesa tinha razão no seu pedido.

"Através da transcrição destes diálogos, percebe-se que pode ter existido, de fato, uma associação entre a douta juíza substituta do feito e os integrantes da chamada força tarefa do MPF, de maneira a colocar a acusação em condições mais favoráveis do que a defesa", escreveu Appio.

Em um longo despacho, ele falou que a imparcialidade do juízo da causa é "a pedra angular das garantias fundamentais dos cidadãos previstas na Constituição de 1988" e que, sem isso, "todos os cidadãos poderiam estar sob o jugo de um Estado policialesco".

"Este tipo de modelo não foi aceito nem mesmo em períodos sombrios de nossa recente história, como na Alemanha nazista ou na União Soviética stalinista", continuou ele.

A juíza federal Gabriela Hardt em encontro com o ministro Sergio Moro
A juíza federal Gabriela Hardt em encontro com Sergio Moro, em foto divulgada no perfil dele em rede social em 2019 - Reprodução

Outras críticas foram feitas por Appio.

Recentemente, o juiz chegou a divulgar um vídeo de apoio a um blogueiro de Curitiba que alegava que o site corria risco de "não ficar de pé" se tivesse que pagar a indenização ganha judicialmente por Hardt.

No vídeo, Appio afirmava que é um leitor antigo do blog, e que o trabalho do site é "de fundamental importância para a consolidação da democracia do país".

Nesta quarta (24), a Folha pediu entrevista com a juíza, mas a assessoria informou que ela não se manifestaria. Appio foi afastado temporariamente do seu trabalho na Justiça Federal, por ordem da corte especial administrativa do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) e, desde então, não tem dado entrevista.

O magistrado tem 15 dias para explicar os motivos de seu suposto telefonema em abril para o filho do ex-relator da Lava Jato em segunda instância, Marcelo Malucelli. No telefonema, o juiz teria fingido ser outra pessoa, aparentemente tentando comprovar o vínculo de parentesco.

O interlocutor que seria Appio encerra a ligação de forma abrupta, após perguntar ao filho de Malucelli se ele "tem aprontado", num tom que pode ser interpretado como uma ameaça, de acordo com membros da corte do TRF-4.

Entre 8 de fevereiro e 22 de maio, Appio assinou decisões polêmicas. Mandou prender duas vezes o doleiro Alberto Youssef, revogou a delação da doleira Nelma Kodama e desbloqueou R$ 35 milhões em bens ligados ao ex-ministro Antônio Palocci –todos os despachos foram derrubados na sequência pela segunda instância.

O juiz também derrubou o mandado de prisão que ainda estava aberto contra o advogado e réu Rodrigo Tacla Duran, transformado em testemunha protegida pelo juiz. O advogado vive na Espanha.

Após ouvir Tacla Duran por vídeo em uma primeira audiência, Appio determinou o envio dos relatos do réu para o STF (Supremo Tribunal Federal) para eventual abertura de investigação contra Moro e o deputado federal e ex-procurador Deltan Dallagnol.

Na segunda audiência, Tacla Duran mencionou suposto esquema de propina envolvendo o ex-procurador Carlos Fernando Santos Lima, e o juiz mandou ofício para a Polícia Federal para eventual apuração. Os citados negam e chamam o advogado de "mentiroso compulsivo".

Por fim, Appio convocou Deltan para saber da relação dele com o procurador que atua hoje nos processos envolvendo Tacla Duran, Walter Jose Mathias Junior. Disse que precisava ouvir o ex-procurador sobre se há "vínculo de amizade pessoal e íntima" com o atual membro do MPF.

As movimentações frequentes nos processos de Tacla Duran chamaram atenção do ministro Dias Toffoli, que, na segunda-feira, pediu a cópia integral de todas as decisões do processo e peças relacionadas.

Isso porque, desde março, os processos foram suspensos por ordem do ministro Ricardo Lewandoswki. "Verifico que, aparentemente, a determinação de suspensão dos feitos não foi respeitada", anotou Toffoli.

Ainda em março, Appio também foi alvo de um pedido de suspeição feito pela procuradora Carolina Bonfadini de Sá, que disse que a postura do juiz na internet, alinhada com políticos do PT, comprometeria a atuação dele nos julgamentos.

Para a imprensa, Appio respondeu de formas diferentes ao ser questionado sobre o login "LUL22" utilizado por ele até o início do ano para acessar o sistema eletrônico da Justiça Federal –ele reconheceu publicamente a referência ao atual presidente Lula (PT) apenas na segunda-feira passada, durante entrevista à GloboNews, ao afirmar que "foi um protesto isolado e individual meu contra uma prisão que eu reputava ilegal".

Appio também vem negando ser o autor da doação no valor de R$ 13 à campanha eleitoral do presidente Lula no ano passado, embora, no site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), constem duas doações registradas pelo nome e CPF do juiz. Além dos R$ 13 para Lula, R$ 40 para a então candidata do PT a deputada estadual no Paraná Ana Júlia Ribeiro.

Mas Appio analisou o pedido de suspeição da procuradora apenas no último sábado (20), rejeitando a solicitação, e quando já estava oficialmente de férias. Na mesma data, ele também assinou sua primeira sentença da Lava Jato, absolvendo o réu Raul Schmidt.

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