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19/12/2010 - 13h00

Falta de prioridade converteu a saúde em área crítica

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CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

No último ano de FHC, o país vivia a maior epidemia de dengue: 697.998 casos e 151 mortes. No último ano de Lula, os números são ainda mais impactantes: quase 1 milhão de casos e mais de 300 mortes.

Não foram só os números da dengue, no entanto, que pioraram. Desde 2007, a saúde passou a ser o problema que mais incomoda os brasileiros, segundo pesquisas de opinião.

Em geral, o descontentamento se concentra na dificuldade de acesso e na qualidade da assistência. Faltam vagas nos hospitais, faltam médicos, faltam diagnósticos e terapias rápidas.

Pessoas aguardam cinco anos por cirurgia ortopédica. Na oncologia, a espera por radioterapia chega a seis meses, tempo demais quando o inimigo é o câncer.

Para especialistas em saúde pública, os problemas assistenciais se avolumaram em consequência da má gestão dos serviços, do subfinanciamento do setor e da falta de prioridade política.

No recém-lançado livro "Os Anos Lula - Contribuições para um Balanço Crítico 2003-2010", a médica Ligia Bahia, professora de saúde pública da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), considera que a saúde teve uma "participação coadjuvante" no governo Lula.

"O país manteve-se na contramão das tendências mundiais de priorização das políticas sociais baseadas na oferta de bens e serviços públicos e não logrou responder as necessidades e demandas internas da saúde."

Mas, para Bahia, os problemas não significam uma "piora absoluta": "As pessoas também passaram a exigir mais. As pessoas estão envelhecendo e passam a usar mais o sistema de saúde", disse. Dos 190 milhões de brasileiros, a maioria --160 milhões-- depende exclusivamente do SUS.

SUBFINANCIAMENTO

A fatia do gasto público em saúde vem caindo. Um estudo do médico sanitarista Gilson Carvalho, consultor do Conasems (conselho dos secretários municipais de Saúde), retrata que, em 1995, de todo o dinheiro gasto com saúde no Brasil, 62% era público (União, Estados e municípios) e 38% era privado.

Em 2009, a proporção do gasto público havia caído para 47%, e o privado já respondia por 53%. Não significa que os investimentos totais do SUS tenham diminuído.

Segundo o Ministério da Saúde, o orçamento executado foi de R$ 47,1 bilhões em 2002 e R$ 65,6 bilhões em 2009 (valores atualizados pela inflação). Neste ano, o previsto é de R$ 66,7 bilhões.

"Há uma lógica equivocada norteando o SUS, que passa por decisões políticas que priorizam o setor privado (prestadores de serviço), não o público. Houve incremento no orçamento em oito anos, mas continuamos com problemas básicos, como a dengue. Não se investe em prevenção", alerta Francisco Batista Júnior, presidente do Conselho Nacional de Saúde.

É praticamente consenso que o setor precisa de mais recursos e de que isso passa pela regulamentação da Emenda Constitucional nº 29, que fixa percentuais mínimos de gastos com saúde. Mas como ela não define o que pode ser despesa com saúde, estima-se uma evasão anual de R$ 2 bilhões da área.

"O subfinanciamento é, sim, o principal problema do SUS. Hoje gastamos 3,5% do PIB em saúde. Temos que dobrar esse percentual. O modelo de gestão também precisa mudar, tornar-se menos rígido e passar a ser regido por metas e avaliação de desempenho", diz o ministro José Gomes Temporão (Saúde).

Um das apostas de Temporão para melhorar a gestão e evitar desperdícios foi o projeto que previa transformar hospitais em fundações estatais. Mas a proposta empacou no Congresso, em grande parte por oposição do PT.

Modelo parecido são as OSs (organizações sociais), já adotado em vários Estados brasileiros --SP, por exemplo, tem 25 hospitais geridos dessa forma. Uma vez gestoras dos serviços de saúde, essas entidades privadas podem comprar serviços, equipamentos médicos e remédios sem licitação e contratar funcionários sem concurso.

Os defensores dizem que esse modelo dá aos hospitais e postos de saúde públicos uma agilidade que, por exigências e burocracias legais, o poder público não tem. Já os críticos da terceirização alegam que falta controle sobre o uso do dinheiro público e que os interesses privados prevalecem. Há uma ação direta de inconstitucionalidade no STF contra as OSs.

MÉRITOS

Os especialistas reconhecem que a saúde também teve méritos na gestão de Lula, como a queda na taxa de mortalidade infantil e a criação do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e das UPAs (Unidades de Pronto Atendimento).

Temporão acrescenta o aumento do número de transplantes, de leitos hospitalares e de oferta de medicamentos. Lembra também que o Brasil interrompeu a transmissão do cólera e da rubéola e eliminou o sarampo.

E a dengue, ministro? "Não é um problema apenas da saúde e não se resolve apenas no âmbito do repasse e da fiscalização de recursos. Enquanto não houver uma vacina que imunize a população, não há outro caminho a não ser um enfrentamento multissetorial e uma maior participação popular. Sem isso, não haverá nada que consiga deter a dengue."

 

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