Moradores do edifício Planalto fazem 'revolução' e derrubam síndica

O edifício Planalto, projeto icônico de Artacho Jurado em frente à Câmara Municipal, acaba de ser palco de uma inusitada revolução. Condôminos que se diziam oprimidos pelo autoritarismo e pela falta de transparência da síndica e radialista Valdete Moraes, 65, no poder havia 14 anos, resolveram dar um basta.

Do começo do ano pra cá, o "movimento" convocou uma assembleia extraordinária, teve o pedido "indeferido" pela administração do prédio, obteve na Justiça o direito de se reunir e, com unanimidade dos 140 proprietários presentes (são 294 apartamentos), destituiu a antiga diretoria e elegeu uma nova, em 22 de maio.

A queda de Valdete e sua cúpula, bem no saguão da cobertura que já foi cenário de filmes, comerciais e até de uma novela ("Amor à Vida", da Globo), teve lances rocambolescos.

O advogado dos descontentes atuou como mestre de cerimônia na assembleia de condomínio, acompanhada pela sãopaulo. Candidatos foram chamados para presidir os trabalhos do dia. Valdete (que, pressionada, já havia passado o posto a um substituto) caminhou triunfalmente até o microfone para se oferecer ao cargo. Não teve apoio dos moradores.

Quando o advogado perguntou quem gostaria que ela fosse presidente da mesa, as vaias foram altas.

Valdete manteve um sorriso inalterado, que contrastava com o também permanente "V" de sua sobrancelha. Os presentes optaram pela única outra candidata, Águeda Hajar, 56, senhora franzina e de gestos contidos. Logo depois, ela seria eleita um dos membros da nova diretoria.

Aproveitando a abertura do microfone aos presentes, a moradora Paula Martinelli, 30, levou um projetor, usou a parede como tela e exibiu, sob coro de "ohs!", a página de um certo Polo Cultural Planalto no Facebook.
A entidade, que leva o nome do edifício, foi criada em uma das esvaziadas reuniões lideradas por Valdete enquanto síndica, mas os moradores ali presentes não a conheciam.

Nas fotos do polo, em gesto de político em campanha, ela entrega uma quadra esportiva no Parque Bologna, bairro da zona sul a 24 km do Planalto. Sorridente, veste uma camiseta onde se lê "só depende de nós, Valdete".

ESSAS PESSOAS PASSAM

O estopim da revolta foi um aumento de condomínio de 10% em janeiro. No encontro que tratou do assunto, a maioria dos presentes votou numa alta de 5%, mas Valdete tinha a posse de quase 90 procurações de proprietários que não moram no edifício, diz Águeda. Conseguiu, assim, aprovar o ajuste maior.

Águeda escreveu então uma carta, distribuída debaixo da porta dos apartamentos. Falava de sua insatisfação com as decisões da diretoria, sempre apoiadas nas procurações, e que na prática conferiam a Valdete superpoderes. "As pessoas se cansaram de votar. Nunca se conseguia nada", diz.

Revoltados, outros moradores colocaram avisos nos espaços sociais do prédio, convocando reuniões.

Valdete emitiu circular dizendo que não toleraria panfletagem. Mas o "movimento" já tinha saído de seu controle. Sob pressão e com a popularidade em baixa por causa do aumento, renunciou ao cargo, após ver-se "sem direito de defesa".

Afirmou à reportagem, durante a assembleia, que as acusações são "inverídicas" e que o polo cultural não tem ligação com o condomínio (a reportagem teve acesso a documentos da criação da entidade em assembleia condominial).

Agora, como presidente do conselho fiscal do prédio, Águeda se prepara para contratar uma auditoria das contas, "que não são claras". Se alguma irregularidade for comprovada, entrará com processo na Justiça. Mas enfrenta uma dificuldade: os documentos que registram as locações dos espaços sociais para eventos desapareceram dos arquivos. O salão na cobertura custa R$ 3.000 por dia.

Valdete diz desconhecer o sumiço. "Não sei, meu bem. Eles têm o ônus da prova. Você entra na internet, procura meu nome, você já sabe quem eu sou. Eles, você não sabe. Nós estamos aí, sempre, essas pessoas passam."

Publicidade
Publicidade