São Paulo, 461

Bolo do Bexiga acabou após guerra de comida do 'Pânico', diz idealizador

Há sete anos, o empresário e cozinheiro Walter Taverna, 81, saboreava uma fatia do bolo do Bexiga sem saber que seria a última. Agora, o dono de três cantinas espera poder comer de novo a sobremesa da qual mais se orgulha: o "tapetão" de mais de 400 metros que ajudou a criar há 30 anos para celebrar o aniversário de São Paulo.

Na hora da comilança, a rua Rui Barbosa costumava concentrar uma multidão munida de potes, baldes, caixas de papelão e sacos plásticos para tentar arrematar um bom pedaço. Após o "Parabéns pra Você", todos se lançavam em direção à mesa para coletar o máximo de doce possível, em uma disputa que cessava em poucos segundos.

A última edição do bolo, que entrou para o livro dos recordes, o "Guinness", envolveu 200 voluntários numa operação que começou uma semana antes e demandou uma tonelada de farinha de trigo e 3.000 ovos. Era 2008 e uma equipe do programa "Pânico", então transmitido pela RedeTV!, fazia uma gravação. Os personagens Cristian Pior (interpretado por Evandro Santo) e Robaldo Esper (Márvio Lúcio) fizeram graça com os frequentadores e incentivaram uma guerra de comida com os restos que ficaram na mesa. Eles saíram lambuzados de chantili.

A imagem da festa também se sujou. Em 2009, os patrocinadores Dona Benta e Senai, que ajudavam a pagar a conta de R$ 115 mil, abandonaram o projeto.

Oficialmente, as empresas falaram em "reposicionamento de marca" e "mudança de estratégia".

Taverna tem uma versão diferente: "Depois que aqueles caras da televisão vieram aqui e tacaram bolo nas pessoas, as empresas não quiseram mais patrocinar. Disseram que era algo deprimente". A equipe do "Pânico", em férias, não foi localizada para comentar, informou a assessoria de imprensa do programa.

Taverna diz ter perdido a autorização da prefeitura para colocar o bolo na rua. Procurada, a gestão Haddad informou que a comunidade pode fechar a via e servir o bolo como quiser.

Para a volta da homenagem em 2016, ele bolou um plano que mira em novos investidores: contratar 200 pessoas para distribuir as fatias e afugentar os esganados.

Outra esperança vem de um projeto de lei de 2014, em tramitação na Câmara, para incluir o bolo no calendário oficial de eventos de São Paulo. Porém, o texto não determina nem como o bolo deve ser servido nem garante financiamento público.

"Ao entrar no calendário, a prefeitura tem estímulo para ajudar, mas pode decidir se coloca subsídio ou não", explica a vereadora Juliana Cardoso (PT), autora do projeto, já aprovado nas comissões e que atualmente aguarda na fila para entrar na pauta de votação do plenário.

Neste domingo (25), a partir do meio-dia, a festa terá distribuição de 10 mil bolos industrializados, em pacotes de 350 g, fornecidos pela marca Renata. A entrega funciona assim desde 2009.

VIDA ENTRE PANELAS

Filho de cozinheiro, Taverna fez a vida no Bexiga. Para animar a plateia dos três restaurantes que possui, ele criou um pequeno show, no qual faz uma espécie de panelaço. "Um dia deixei cair bandejas e me aplaudiram. Aí, passei a fazer sempre. O barulho estimula as pessoas."

Outra ideia que teve foi mudar a tradicional festa de Achiropita do pátio da igreja para a rua, o que multiplicou a capacidade do evento a partir dos anos 1970.

Em 1985, criou o bolo gigante junto com o amigo Armandinho Pugliese, ex-presidente da Vai-Vai. Neste domingo (25), não haverá nenhum ato para lembrar os 30 anos.

"Já paguei o bolo muitas vezes do meu bolso, mas agora não posso mais. Desde 2013, com essa crise e o medo das pessoas de sair de casa, perdemos 60% do movimento nas cantinas", estima Taverna. Enquanto espera as coisas melhorarem, ele ensina os bisnetos a cozinhar.

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