Carnaval 2015

Bloco com ritmo e história afro completa dez anos em SP

Para a designer Giuliana Xavier, 33, a religião é um mantra entoado em um instrumento. É batendo no djembê, um tipo de tambor africano, que ela se conecta a sua espiritualidade. Giuliana é uma das 195 integrantes da bateria do Ilú Obá de Min.

O bloco composto só por mulheres na percussão sai às ruas de São Paulo desde 2005 celebrando a cultura afro-brasileira e o poder feminino.

No candomblé, as mulheres não são autorizadas a tocar tambores. E, numa espécie de enfrentamento, nasceu o Ilú Obá de Min.

O grupo, cujo nome significa "mãos femininas que tocam tambor para o rei Xangô", foi criado por Beth Beli, 46, inspirado em tradições nigerianas, que permite o uso do instrumento por ambos os sexos.

Na sede do grupo, em Campos Elíseos, região central, a preparação para o Carnaval não é com marchinhas clássicas ou repique. Quem participa do bloco entoa cantos dos terreiros de candomblé e faz homenagens a orixás (deuses africanos) num ritual cultural e não religioso.

"Não sigo nenhuma doutrina, o que me interessa é a cultura africana e a chance de conhecer gente de vários tipos e classes sociais", conta Giuliana. "O desfile é muito emocionante, a gente tem que se segurar para conseguir tocar sem chorar."

Ela se refere às batidas produzidas pela multidão de mulheres de roupas coloridas, que atrai turistas estrangeiros e gente que vem de outras cidades. Em 2014, um dos cortejos chegou a receber 15 mil pessoas.

"O objetivo é mostrar o quão bela é a cultura, a fé, a religião e a mitologia africana", explica Baby Amorim, 52, produtora e coordenadora de projetos do Ilú.

As saídas, que têm roteiros passando pelas ruas do centro velho ou margeando a linha de trem na Barra Funda, incluem ainda dançarinos desfilando em pernas de pau. Ao todo, são 250 integrantes no bloco, apenas oito deles homens.

Doze integrantes desfilaram sobre pedaços de madeira de um metro de altura cuspindo chamas em referência a Xangô, divindade que rege o fogo, o trovão, os raios, em 2012.

Na bateria, o som é totalmente coordenado. Para fazer parte dela é preciso se inscrever e participar dos ensaios para dominar a alfaia (espécie de tambor), o agogô (instrumento de ferro), o djembê ou o xequerê (cabaça envolta por uma rede de contas).

Os treinos são rigorosos: acontecem em todos os sábados e domingos de setembro até o Carnaval e cada encontro tem duração de cerca de quatro horas.

A cada ano, um mito africano ou uma mulher negra são homenageados pelo bloco. No Carnaval deste ano, a escritora Carolina Maria de Jesus (1914-1977) será lembrada em cinco músicas.

A homenagem sairá às ruas no dia 13 de fevereiro, data que marca os 38 anos da morte de Carolina. "Nunca participei de Carnaval, vai ser uma novidade. Minha mãe não perdia", afirma Vera Eunice de Jesus Lima, 61, filha de Carolina, que acompanhará o cortejo.

Segundo Beth Beli, é importante enaltecer a obra da escritora. "Não queremos só trazer a mulher que nasceu na favela, mas falar da sua literatura. Ela não foi apenas uma catadora de lixo, como tem livros traduzidos em diversas línguas."

Para lembrar as raízes de Carolina, o bloco usará acessórios feitos de material reciclado e um instrumento produzido com garrafa pet, que será tocado em um ato especial preparado pelas percussionistas.

Além do bloco, Ilú Obá de Min é uma ONG de mesmo nome. Em sua sede são ministradas palestras e cursos de percussão, história africana e francês a preços acessíveis.

Para Giselda Perê, 33, integrar o grupo a ajudou a construir sua identidade. "Não tinha noção do que era a cultura africana. Participar disso me tornou mais autoconfiante", afirma, vestida de Iemanjá.

Desfiles
Dia 13. Vale do Anhangabaú, 21h (concentração a partir das 19h30)

Dia 15. R. Lopes de Oliveira, 342, Barra Funda, 15h (concentração a partir das 14h)

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