Noivas e Casamentos

Especial da sãopaulo traz dicas e tendências para organizar o casamento dos sonhos e não deixar o momento passar em branco

Noivas paulistanas 'importam' tradições estrangeiras nos casamentos

Os brincos eram antigos. O chapéu e os sapatos, novos. O anel, azul, e o aplique, emprestado. A combinação desses elementos vem de uma antiga rima em inglês, mas quem os usou foi uma paulistana.

A frase diz que, para ter boa sorte, a noiva deve ter consigo, no dia do casamento, um acessório "old [velho]", "something new [algo novo]", "something borrowed [emprestado]" e "something blue [azul]".

"É uma superstição. Sou muito cética para essas coisas, mas brinquei", diz Andreia Kalvon Guerra, 44, sobre a indumentária que usou ao se casar, em abril de 2014.

Na ocasião em que disse sim à mão e ao sobrenome do fotógrafo Flaviano Guerra, 34, numa festa não religiosa ao ar livre em uma vila residencial no Brooklin (zona sul), a publicitária incorporou uma tradição de cerimônias dos Estados Unidos.

Com a diferença de que lá fora se fala "I do", a adoção de práticas importadas tem sido cada vez mais frequente em casamentos no Brasil. Para além do cinema, isso tem se intensificado graças a redes sociais como o Pinterest e o Instagram, e páginas como a "Style Me Pretty".

"As referências vêm principalmente de revistas, sites e blogs de casamento na internet, que são facilmente acessados", diz a assessora Simone Koh, da WonderWeds.

A jornalista Sarah Ferrari Lima, 25, também buscou inspiração na televisão. "Quando comecei a namorar o Marcos [Alexandre Souza, 32, administrador financeiro], era viciada na série 'Gossip Girl'. Brinquei: se casarmos, tem que ser como se fosse no seriado", conta.

Dito e feito. Os dois não só ficaram noivos em Nova York (cidade preferida de Sarah e local onde o programa se desenrola) com um anel Tiffany —"sou uma pessoa muito temática", afirma a jovem—, como se inspiraram em referências de casórios americanos para realizar a cerimônia no primeiro sábado de fevereiro (7/2), iniciada às 15h no jardim de um espaço no Ipiranga -casamentos à luz do sol em ambientes externos são comuns fora do Brasil.

"Buscamos tudo o que tinha nos casamentos gringos", conta. A cerimônia dela foi embalada por "welcome drinks" (drinques servidos na chegada); madrinhas usando vestidos iguais; ilhas de "hot dogs", rosquinhas e milk-shakes; cabines de fotos; e chinelos estampados com imagem da "cidade que nunca dorme", segundo Frank Sinatra.

"O que a gente tem hoje muito forte, de uns quatro anos para cá, é a história do anel solitário [com diamante único]. Antes era uma aliança de noivado simples", explica a consultora de festas Márcia Possik, diretora da Marriages.

"As mulheres agradecem", brinca. Carolina Galinskas, 27, sabe bem disso. Mesmo tendo se casado com o advogado André Galinskas, 27, em molde mais tradicional (evento noturno realizado em igreja), seu dedo anelar carrega duas alianças, a de noiva e a de casamento.

"Sempre achei lindo [o solitário] e um dia comentei. Ele guardou a informação e depois me deu um." Lá fora, há quem diga que o anel tem que custar o equivalente a três meses de trabalho do proponente.

Editoria de arte

Para Possik, esses costumes estrangeiros chegam a todas as classes sociais porque o acesso às referências é on-line e, assim, mais democrático. "Não precisa viajar para conhecer o que acontece lá fora", diz ela.

Um exemplo é a prática batizada "trash the dress" (algo como escangalhe o vestido), em que a noiva posa para sessão de fotos em situações e locais inusitados, como praias, ferros-velhos e pântanos —geralmente com um vestido secundário, comprado só para fazer o ensaio.

"É uma sessão de fotos totalmente descontraída, na qual é possível criar uma atmosfera única dentro de suas personalidades e afinidades", define o fotógrafo Davi Chaim,
da Oficina da Photo.

Foi com o objetivo de fazer algo divertido que a empresária Cláudia Burattini, 53, inspirou-se em vídeos no YouTube para organizar um "flashmob" de dança (manifestação repentina) no casamento da filha, Juliana, em 2010.

Ela reuniu 60 amigos e membros da família e fez ensaios durante dois meses para apresentar um mix de Gloria Gaynor, Lady Gaga e Michael Jackson para os noivos. Até a avó de 84 anos participou, depois de algumas adaptações na coreografia.

"Vi vídeos americanos na internet, mas eram de publicidade. Não tinha visto em festas ainda. Foi algo diferente, nada de chororô."

Depois da primeira experiência com dança, a empresária começou a fazer aulas de jazz e hoje tem uma academia onde ajuda casais a acertarem o passo.

"A mulher quer que o marido aprenda alguma coisa para fazer na pista. É uma surpresa para os convidados", diz Cláudia. Uma das músicas mais pedidas no momento da primeira dança é "Time of My Life", que embala a icônica apresentação no filme "Dirty Dancing" (1987).

Apenas o Núcleo de Dança dos Noivos já entregou mais de 480 coreografias para o tema, de acordo com o bailarino e coreógrafo Bruno Facundini, 29, idealizador do estúdio especializado em rotinas cerimoniais.

A jornalista Sarah Ferrari diz que treinou durante 20 dias para fazer o salto de Baby, personagem de Jennifer Grey no longa. Na história, ela é segurada no alto com os braços abertos por Johnny Castle (Patrick Swayze).

"No último ano a coreografia campeã foi a 'A Thousand Years', pelo sucesso da saga 'Crepúsculo'. 'Dirty Dancing' foi campeã de entregas, desde a nossa fundação, por dois anos consecutivos", explica Facundini. Outro quesito bastante relacionado à inspiração estrangeira é o da decoração.

"Os brasileiros têm percebido que podem sair da receita engessada. Os casamentos americanos prezam por itens DIY ["do it yourself", ou faça você mesmo].

Os noivos põem a mão na massa e participam ativamente da confecção de detalhes, para dar a cara deles", explica Simone Koh, da WonderWeds.

Mahira Oliveira, 30, passou um ano inteiro juntando todo o tipo de material para decorar seu casamento. Para os arranjos de flores, utilizou garrafas de vinho, refrigerante ou cerveja.

Para decorar a pista, ela fez pompons de papel de seda, além de uma cortina de coração para ficar no fundo do altar da cerimônia. "Antes do casamento nosso escritório parecia um depósito! Na véspera da festa, fomos para o espaço para montar tudo, com a ajuda da minha mãe", conta a publicitária.

"Além de ser muito bonito esteticamente, esse tipo de evento, que consequentemente é menor, transmite o real significado do casamento, que acho que as pessoas foram esquecendo", diz Ana Carolina Pires, 28, da Ana Pires Ateliê de Eventos.

"Você acaba imprimindo mais estilo e dá mais atenção aos convidados. Não é algo apenas de decoração, é o todo", afirma.

JEITINHO BRASILEIRO

Ainda que a influência seja real, especialistas enxergam, mais do que cópias, releituras. "Apesar de esse movimento ser muito intenso, porque virou uma sociedade globalizada, a sensação é que o brasileiro está adaptando as coisas que existem em outros países, valorizando o que tem aqui", analisa Chris Ayrosa, cenógrafa de eventos da Ayrosa & Co. Design de Experiência.

Para a assessora de eventos Alê Loureiro, o brasileiro é criativo e, mesmo usando referências de fora, cria uma cerimônia com o jeito do país. "É legal ver o que está acontecendo. Não tem nada a ver copiar. A celebração deve ter a cara dos noivos", defende a profissional.

Mesmo porque nem todas as tradições estrangeiras pegaram por aqui. A organização em cima do altar, por exemplo, com homens de um lado e mulheres de outro ("bridesmaids" e "best men") é mudada ao gosto e ao número de amigos do casal.

"Fiz vários casamentos em que, além dos padrinhos, tem as amigas que entram com as alianças. Os brasileiros são bem relacionados e acabam enchendo o altar, escolhem um rótulo de fora para incluir todo mundo", avalia a consultora de eventos Samara Costa.

O cerimonial da Igreja Católica, mais rígido, também dificulta uma cópia do modelo americano. Nem sempre os noivos têm tempo para falar seus votos durante a celebração, e o juramento dito pelo padre —e repetido pelos dois— não é substituído pelo costume visto nos Estados Unidos.

Outros costumes que não pegaram no Brasil foram o ato de o noivo lançar a cinta-liga da noiva para os convidados ou os jantares de ensaio, lá conhecidos como "rehearsal dinner".

Além de adaptar tendências estrangeiras, o brasileiro também cria. Atrações como um bar só para degustação de cervejas diferentes e um ensaio sensual da noiva antes do casamento, enviado para o futuro marido enquanto ele se arruma, são produções nacionais.

Essa mistura de tendências característica do Brasil atrai os olhos de estrangeiros, que já pedem festas nos moldes do país. Segundo consultoras ouvidas pela reportagem, Arábia Saudita e Angola são alguns dos destinos das decorações grandiosas e das novidades criadas e adaptadas por aqui.

"Uma cliente em Angola pediu para fazer a reprodução de um aquário gigante no aniversário dela. Posto fotos no meu Instagram e vários gringos comentam", diz Samara Costa.

Sem sonho ou modelo definido, se americano ou tailandês, o casamento de Andréia Guerra teve de tudo um pouco. Nada de formalidade, "porque não fazia parte do nosso repertório", diz. "A gente tentou cobrir o máximo das coisas que achávamos importantes."

Canecas com um logotipo desenvolvido para o casal, tênis All Star personalizados para os noivos e até um serviço de "food truck" marcaram o momento de união. "Foi uma baita festa! Obrigada por me fazerem lembrar de momentos tão legais", comentou sobre a entrevista.

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