Diretor fala sobre a experiência espiritual do filme de Abramovic

"Não precisamos de arte na natureza. Ela já é perfeita sem nós. Temos que extrair experiências dela e transmiti-las nas cidades", narra Marina Abramovic no documentário "Espaço Além - Marina Abramovic e o Brasil".

Foi exatamente isso que fez a sérvia, uma das mais importantes performers do mundo. Em 2015, ela escolheu São Paulo para sediar sua principal exposição na América do Sul, "Terra Comunal - Marina Abramovic + MAI" —cerca de 76 mil pessoas a visitaram no Sesc Pompeia.

Neste ano, a artista volta a ser assunto na capital, que é uma das seis cidades brasileiras com o filme em cartaz. O longa-metragem, dirigido por Marco Del Fiol, estreou no último dia 19.

O trabalho narra a jornada espiritual da sérvia pelo Brasil. Entre 2012 e 2015, foram mais de 6.000 km percorridos por lugares místicos e religiosos, como Alto do Paraíso, em Goiás, e Chapada Diamantina, na Bahia.

Thays Bittar/FolhaPress
Marco Del Fiol, diretor do filme "Espaco Alem", de Marina Abramovic
Marco Del Fiol, diretor do filme "Espaco Alem", de Marina Abramovic

sãopaulo - O que marcou no contato com as pessoas em São Paulo?
Marco Del Fiol - Foi bastante impressionante ver os depoimentos de quem passou pelo Método Abramovic [série de exercícios e atividades realizados na exposição dela]. Filmamos usando o mesmo dispositivo do filme, algo inventado pela Marina. Todos os dias ela sentava em seu quarto e relatava de olhos fechados para a câmera o que havia vivido. É uma forma de dar voz à ação interna que acontecia durante as experiências.

E como foi o encontro com as pessoas nas outras cidades?
Quase ninguém sabia quem era a Marina. Um ou outro a reconhecia. Conversamos com pessoas com histórias pessoais muito distintas. Mas o que era bem comum no encontro [com a espiritualidade nos rituais, centros etc.] é que ele se dava pelo amor ou pela dor.

Além de exibir a mostra, São Paulo sediou outras partes da jornada?
Gravamos com um médico que tem uma tese segundo a qual a mediunidade estaria ligada à formação de cristais na glândula pineal [perto do centro do cérebro]. A Marina ficou louca, ela tem um trabalho ligado aos cristais. Mas acabamos não usando. Seria uma pista falsa buscar esse caminho pela ciência para a proposta do filme.

E qual era a proposta?
Um dos objetivos era que esse filme provocasse estímulos, causando uma perturbação boa. No ritual de ayahuasca na Chapada Diamantina, por exemplo, a Marina teve um 'ruir da mente' -ela não conseguia controlar seu corpo.

A dor, física e mental, está bem presente no filme. Por quê?
Acho que estamos em um momento no qual as dores estão vindo à tona: das mulheres, dos negros e até da chamada classe média, dos paneleiros. É importante escutá-las. No fim, todo mundo sofre pelas mesmas coisas. Mas não adianta buscar o culpado fora da gente. Não vamos aprender nada sem autocrítica.

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