Vila Olímpia atrai jovens e novos empreendimentos, mas trânsito caótico preocupa

Com só uma quadra, a rua Coronel Joaquim Ferreira Lobo é um microcosmo do bairro em que está localizada, a Vila Olímpia, na zona sul de São Paulo.

De um lado da calçada (estreita em diversos trechos), há dois prédios residenciais, ambos em fase de finalização. O primeiro oferece "studios", como são conhecidos os apartamentos de até 55 m², voltados para pessoas solteiras e casais. Mais ambicioso, o outro empreendimento anuncia em um grande painel: "181 m², 3 suítes, 3 vagas".

Do outro lado da calçada, em frente a esse segundo edifício, fica o acanhado Bistrô by Café. Ao lado dele, sobrevivem sobrados. Mais adiante, outro comércio modesto, Sinhazinha Arte em Bolos.

Na hora do rush, os carros andam lentamente pela rua de cerca de 300 m, uma das travessas da avenida Faria Lima. "O trânsito no bairro é caótico", reclama o contador Eduardo Caristo, 46, que trabalha há 12 anos ali perto, na rua Pequetita.

Embora alguns problemas persistam, como o tráfego intenso de veículos e as calçadas que exigem atenção permanente do pedestre, a rua Coronel Joaquim Ferreira Lobo tem se transformado nesta década -assim como o bairro onde ela está situada.

Nas duas últimas semanas, a sãopaulo identificou 26 novos empreendimentos na Vila Olímpia, dos quais 21 são destinados a residências. No levantamento, foram considerados três estágios: prédios com o projeto lançado, em construção ou entregues a partir de janeiro de 2016.

Ainda conhecida pelo perfil corporativo, com as suas envidraçadas torres comerciais, a Vila Olímpia avança, ano a ano, em direção a um novo modelo, mais ao gosto dos urbanistas -e dos moradores, é claro.
De acordo com especialistas do mercado imobiliário, a tendência é que prevaleça no bairro a diversidade, com residências e escritórios, além de lojas de grande e pequeno porte, shoppings, universidades e, acredite, vilas com antigos sobrados.

Segundo o economista-chefe do Secovi-SP (entidade do setor), Celso Petrucci, houve um número expressivo de lançamentos na região entre os anos de 2011 e 2013. Nos três anos seguintes, os investimentos "minguaram", diz. No entanto, continua, os sinais de retomada estão se consolidando neste 2017.

"Os compradores começam a ganhar confiança. E as empresas incorporadoras também", afirma Petrucci, que prevê crescimento de cerca de 10% no número de unidades lançadas na região neste ano em relação a 2016.

E o que explica a preponderância de empreendimentos residenciais entre as novidades? "Prega o bom urbanismo que se reduza o tempo de deslocamento de casa para o trabalho ou de casa para a universidade", diz o economista do Secovi.

Não se compreende essa movimentação na Vila Olímpia sem relembrar os anos 1990. Naquela década, teve início uma aposta maciça do mercado imobiliário em edifícios de escritórios em avenidas como Faria Lima e Juscelino Kubitschek e ruas como a Funchal.

Era uma das consequências da operação Nova Faria Lima, que, entre outras ações, estendeu a avenida até a Hélio Pellegrino.

Neste anos 2010, em contraponto, os investimentos reforçam corredores residenciais, o que tem acontecido, por exemplo, na rua Casa do Ator -em geral, erguem-se edifícios onde antes existiam sobrados.

Apesar de uma nova onda de renovação, vilas ainda mostram resistência. Há pelo menos quatro na rua Gomes de Carvalho.

Moradora da Vila Olímpia há um ano, a auditora Livia de Cassia Mascarin, 31, tira proveito dessa multiplicidade que se acentua no bairro. "Perto de casa [rua do Rocio], há shoppings, academia, supermercados." Para Livia, porém, não há vantagem maior do que a possibilidade de ir a pé ao trabalho. A caminhada da casa ao escritório, que fica na avenida Juscelino Kubitschek, demora não mais que dez minutos.

PÚBLICO JOVEM

Entre o final dos anos 1990 e o início dos anos 2000, o então estudante de engenharia civil Alexandre Lafer Frankel passava quatro horas por dia no trânsito. Suas rotas incluíam o Morumbi, onde morava, o centro, local do trabalho, e São Caetano do Sul, onde estudava. A experiência norteou Frankel, 37, no lançamento da sua incorporadora, a Vitacon, em 2009.

"Ao criar a empresa, o objetivo era permitir que as pessoas pudessem morar perto de onde precisavam, seja da escola, seja do trabalho", diz Frankel, autor do livro "Como Viver em São Paulo sem Carro", em parceria com o jornalista Leão Serva, colunista da Folha.

Na sede da sua empresa, no 18º andar de um edifício na rua Gomes de Carvalho, Frankel conta que cerca de 35% dos investimentos da Vitacon são destinados à Vila Olímpia, onde estão 17 empreendimentos da incorporadora, entregues nos últimos sete anos ou próximos da conclusão. Desse conjunto de prédios, 14 são residenciais.

"Quando viemos pra cá, em 2009, o bairro era um deserto nos fins de semana. Hoje, é diferente. Existem dois shoppings, novos supermercados, novas padarias", diz ele, que ressalta ainda o fortalecimento da Vila Olímpia com a ampliação da universidade Anhembi Morumbi nos últimos anos e a abertura do campus do Insper em 2006.

Os estudantes da região, aliás, estão no radar de Frankel, cuja foco é cada vez mais a compactação. Entre os empreendimentos da Vitacon na Vila Olímpia, 65% têm, no máximo, 50 m². "Entendo que a gente consiga complementar o apartamento com todo o prédio. É a economia compartilhada, do co-working ao espaço de ferramentas", diz ele.

Evidentemente, o presidente da Vitacon mira outros perfis, além de estudantes. A Vila Olímpia tem atraído jovens profissionais para as empresas de tecnologia que escolhem a região. Estão no bairro o principal escritório do Twitter no Brasil e o Cubo, incubadora com 58 start-ups.

GRIFES

A Vitacon é a incorporadora que melhor simboliza a onda de lançamentos com apartamentos compactos por lá, mas outras empresas apostam nesse filão em alta.

Com 70% das unidades vendidas, o Pininfarina, da Cyrela, será entregue em fevereiro de 2018. Dos 29 apartamentos do prédio, só um tem mais de 50 m². O projeto foi desenvolvido pela própria Cyrela em parceria com o escritório italiano de design Pininfarina -daí o nome do edifício.

Também fica a cargo de uma grife da arquitetura e do design o outro lançamento da empresa no bairro. O francês Philip Starck é um dos autores do projeto do One Sixty, que terá 55 apartamentos de quatro dormitórios. O preço? Em média, R$ 8 milhões —nesse caso, o público-alvo definitivamente não são os estudantes.

"Dois [One Sixty e Pininfarina] dos três mais sofisticados empreendimentos da Cyrela em São Paulo ficam na Vila Olímpia", explica Eduardo Leite, diretor da empresa. "É o 'bairro do desejo', com shoppings, faculdades, casas noturnas, o parque do Povo." A rigor, o parque pertence ao Itaim Bibi, mas situa-se na fronteira entre os dois bairros.

A Vila Olímpia não é um bairro de apartamentos baratos, mas os R$ 8 milhões do One Sixty surgem como um ponto fora da curva.

Um levantamento do portal imobiliário VivaReal, realizado em março deste ano, reuniu dados de quatro bairros: Brooklin, Itaim Bibi, Morumbi e Vila Olímpia. Considerando somente os lançamentos, o preço mais alto do m² está no Itaim Bibi (R$ 20,6 mil). A Vila Olímpia vem em segundo, com R$ 16,6 mil, em média.

"Com os sinais de retorno à estabilidade econômica, as pessoas voltam a buscar bairros com metro quadrado de custo mais alto", acredita Vinicius Amato, diretor da incorporadora Gamaro. "Mas preferem um valor mais em conta, como é o caso da Vila Olímpia, a regiões como Moema." Segundo Amato, o m² em Moema tem, em média, um preço de 30% a 40% mais alto que o da Vila Olímpia.

São, aliás, quatro os novos empreendimentos da Gamaro no bairro, dos quais três são residenciais. Um deles, o Kasa, reúne 243 apartamentos, com metragens de 25 m² a 53 m². Não estão à venda. Destinam-se ao aluguel para o público universitário.

À medida que a Vila Olímpia recebe um olhar mais atento, os defeitos, obviamente, também ficam evidentes. "Faltam espaços a céu aberto, como praças com finalidades específicas. 'Food parks', por exemplo, nos quais se pode comer ao livre", critica Frankel, que também se queixa da falta de manutenção das calçadas.

Mas o maior nó do bairro é mesmo o trânsito. Para esta reportagem, foram entrevistadas 24 pessoas, que moram ou trabalham na Vila Olímpia. Os engarrafamentos são o principal vilão para 21 delas.

"Só a estação de trem Vila Olímpia [na marginal Pinheiros] é insuficiente para aliviar o trânsito da região", diz o gerente de segurança de informação Marcelo Miola, 38, que vive no bairro há 15 anos. "É preciso haver metrô."

O excesso de ônibus e carros na rua Funchal por volta das 18h, durante a semana, ganha ares de pesadelo para o executivo do mercado financeiro David Fernandez, 48, que mora em Moema. Ele conta que demora até 40 minutos para deixar a garagem do prédio onde trabalha, que fica nessa via, uma das mais movimentadas do bairro.

A ira em relação ao trânsito não o impede de observar qualidades na região. Uma das principais é a presença do Eataly, o megaempório italiano na avenida JK.

Desde que o complexo gastronômico abriu, há dois anos, Fernandez já fez mais de 40 cursos na escola de culinária do local. Foi onde ele conheceu o contador Caristo, que almoça e janta quase todos os dias no Eataly. "Para evitar o trânsito, saio do trabalho às 18h e fico no Eataly até 21h30, 22h", conta o morador da Vila Matilde (zona leste).

A editora Heidy Aerts, 47, mora no Jardim Paulistano e usa a ciclovia da Faria Lima para ir ao complexo gastronômico na Vila Olímpia. Assim como Fernandez e Caristo, o principal interesse dela são os cursos –já fez mais de 30.

Quem comanda os 450 funcionários do empório é o italiano Luigi Testa, de apenas 30 anos. Com um português quase fluente, o diretor do complexo revela que, apesar da recessão, a filial paulistana registrou crescimento nos últimos 12 meses em relação ao mesmo período anterior.

"Quanto? Em torno de 20%?", arrisco. "Nem tanto!", responde ele e abre um sorriso. Bairro que abriga o Eataly, a Vila Olímpia também é assim. Melhora, mas nem tanto.

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SHOPPING DRIBLA A CRISE

Na última terça-feira (9), a praça de alimentação do shopping Vila Olímpia estava lotada por volta de 13h. Não era um dia atípico. Costuma ser assim entre segunda e sexta, devido ao grande fluxo de pessoas que trabalham nas empresas ao redor do centro de compras, na rua das Olimpíadas.

Esse movimento na hora do almoço ajuda a entender o vigor econômico do local, aberto em 2009.

Em plena recessão, as vendas do shopping, que tem 191 lojas, aumentaram 7,3% no primeiro trimestre deste ano em relação a igual período de 2016.

Segundo a assessoria do centro comercial, predominam entre os clientes os moradores da Vila Olímpia, do Itaim Bibi e de Moema.

Vêm das mesmas regiões os frequentadores do outro shopping da Vila Olímpia, o JK Iguatemi, que tem perfil mais luxuoso que o vizinho. A gerente-geral do JK, Luciana Brandt, menciona ainda Vila Nova Conceição, Morumbi e Indianópolis.

Inaugurado em 2012, o shopping terá uma aquisição de peso neste ano, com a abertura da Renner, que se juntará às 211 lojas do local.

Para Lucas Vargas, presidente do portal imobiliário VivaReal, "empreendimentos-âncoras", como são os dois shoppings e as grandes torres de escritórios, têm contribuído para a valorização da Vila Olímpia. "A diversificação do bairro tende a aumentar", acredita Vargas.

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VILA OLÍMPIA EM NÚMEROS

26 novos empreendimentos no bairro são recém-concluídos, em construção ou em lançamento (levantamento feito pela reportagem)

R$ 16.677 é o preço médio do metro quadrado dos lançamentos na Vila Olímpia, segundo levantamento da consultoria Vivareal-Geoimóvel; o valor é 68% superior à média do metro quadrado nos lançamentos da zona sul da cidade

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