Maior casa do gênero, Villa Country chega a reunir 8.000 pessoas em noites de show

A culpa é de John Lennon.

No dia 8 de dezembro de 1980, a notícia do assassinato do ex-Beatle na portaria do edifício Dakota, em frente ao Central Park, em Nova York, levou o mundo às lágrimas e à perplexidade. Em São Paulo, numa casa no bairro central do Brás, a TV permanecia constantemente ligada e, diante dela, quase hipnotizado, o garotinho Carlos Alberto Machado Anhaia, então com 11 anos de idade, descobria aquele que viria a ser um ídolo também seu.

Foi diante da telinha, em meio a imagens da tragédia, que ele conheceu o rapaz de óculos redondos, autor de canções poderosas, que rogavam a paz, e de quem todo o mundo falava com devoção.

Às vésperas do Natal, Carlinhos, apelido de criança que continua valendo, desistiu do tão sonhado videogame encomendado ao Papai Noel e surpreendeu o pai ao pedir-lhe a coleção completa dos Beatles. Acabou ganhando dez LPs.

Em meio à despedida de um dos maiores ídolos da música pop mundial, o garoto começou a formatar seu interesse pela música. Não parou mais.

Cresceu ouvindo os mais distintos gêneros musicais. Na adolescência, descabelou-se com o heavy metal, ao mesmo tempo em que se sacudia ao som dos Jackson Five, sem abrir mão do pop rock e do punk: de David Bowie ao The Cure. Da vitrola passou, aos poucos, para a guitarra, já ambicionando ser músico.

Esse balaio de ritmos, além de ampliar cada vez mais seu gosto musical, ajudou a moldar sua futura profissão.

Ao se apresentar numa noite dos anos 2000, levou um susto quando pediram a ele que tocasse um hit sertanejo. Como se dizia eclético e "de suingue", não se fez de rogado: botou a turma toda do bar para dançar como se estivesse num bailão.

Quatro vezes por semana, Carlinhos e outros oito integrantes à frente da Villa Country Band fazem exatamente isso: um bailão, numa área de 12 mil metros quadrados da casa que empresta o nome à banda. A multidão que lota a Villa Country é responsável por parar o trânsito da avenida Francisco Matarazzo, na zona oeste paulistana. O ritual se repete todo sagrado fim de semana.

A casa ocupa um antigo galpão daqueles típicos da Barra Funda da era industrial. Ela foi totalmente mobiliada com peças garimpadas durante um ano em fazendas no Estado do Texas e na região de Nashville, Tennessee (EUA), o berço da "country music".

Para decorá-la, quatro contêineres vieram de lá abarrotados de quadros, lustres, móveis, rodas de diligências, cabeças de boi e até uma estátua de cavalo que mede 2,5 m de altura e pesa 350 kg –praticamente todos os ambientes lembram algum filme de caubói.

Gabriel Cabral/Folhapress
Carlinhos Anhaia, guitarrista e formador da Villa Country Band
Carlinhos Anhaia, guitarrista e formador da Villa Country Band

BOTA, CHAPÉU E FIVELÃO

Nos últimos 15 anos, sucessivamente, a Villa Country vem assistindo à diversificação do seu público, que no começo era formado por estudantes do interior do "Brasilzão", acalentados num ambiente caipira, e hoje é bem mais urbano.

Se antes o que embalava a plateia eram músicas da afinada dupla Chrystian & Ralf, do hit "Nova York" ("Tinha um sonho, ir pra Nova York... Levar a namorada") e muito som country americano, hoje, explica Carlinhos, "o que leva o público ao delírio são canções de Jorge & Mateus, Henrique & Juliano e, é claro, a 'rainha sertaneja' Marília Mendonça".

"Mas é rotativo, a coisa muda muito rápido", explica o guitarrista e backing vocal com pinta de roqueiro –até a semana passada, exibia 11 tatuagens espalhadas pelo corpo–, fã de Duran Duran.

Tudo ali parece em constante transformação. "No começo, a gente se vestia de caubói para os shows", recorda-se, sorrindo. "Usava roupa feita sob encomenda pela marca americana Wrangler", continua ele, nostálgico, rememorando a estética do Velho Oeste norte-americano.

"O público também se sentia à vontade para vir de chapéu, botas e cintos com aquelas fivelonas, mas hoje nem 20% do pessoal se veste a caráter", calcula Carlinhos, que, do alto do palco, tem visão privilegiada da plateia.

Um dos sócios da casa, o empresário Marco Antônio Tobal Junior, 39, conta que a maioria dos clientes tem entre 25 e 35 anos, mas é comum a Villa receber casais mais "crescidinhos" e até mesmo clientes estrangeiros, surpresos em encontrar, em plena região central da maior cidade brasileira, um recinto que homenageia o western dos Estados Unidos.

E aí? É caipira? "Sim, temos um baita orgulho dessa cultura", assume Carlinhos, 48.

"A música sertaneja reforça algo que é nosso. Tem referência americana, é claro, mas o universo é genuíno. Isso aqui é Brasil", orgulha-se o não mais garoto, que ama tanto os Beatles e os Rolling Stones quanto Chitãozinho & Xororó e Bruno & Marrone.

Av. Francisco Matarazzo, 774, tel. 3868-5858. Qui. a dom.: 20h às 5h. Ingr.: R$ 30 a R$ 70 (pode variar)

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FESTA DE DEBUTANTE
Retrospectiva sobre a casa da av. Matarazzo

  • 22 gravações de DVDs
  • 25 mil shows em 15 anos
  • 38 mil pessoas/mês
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