Conheça o homem que fabrica violões para Chico Buarque, Toquinho e outros grandes nomes da MPB

KEINY ANDRADE/FOLHAPRESS
Shigemitsu Sugiyama, o luthier de Chico Buarque, Toquinho e outros nomes da MPB
Shigemitsu Sugiyama, o luthier de Chico Buarque, Toquinho e outros nomes da MPB

Aos 77 anos, 50 deles dedicados à luthieria de violões, Shigemitsu Sugiyama carrega no sobrenome a potência de seus instrumentos: "Em japonês, 'sugi' quer dizer montanha, e 'yama', madeira, como se fosse um cedro. Sugiyama pode ser madeira da montanha, o cedro da montanha."

Quando imigrou para o Brasil saindo de Tóquio, em 1973, trabalhava na auditoria americana. "Mas não gostava nem um pouco daquele trabalho de escritório e papel."

Já em São Paulo, foi morar na zona oeste. Não se adaptou ao lugar. "É uma região muito baixa, com muito vale." A mudança para o Jardim Oriental, próximo ao Aeroporto de Congonhas, devolveu o 'sugi' a Sugiyama, a altitude de que gosta. O silêncio e a tranquilidade, no entanto, não o acompanharam. "O problema é o barulho. A gente se acostuma."

Ele não se refere apenas aos rugidos periódico dos aviões, que interrompem os papos e também sua concentração para escutar os mais sensíveis timbres, mas também aos ônibus que passam debaixo de sua janela e encostam no ponto ao lado de seu sobrado.

As coisas melhoram no fim de semana, quando a calmaria da zona sul se mostra convidativa para breves passeios e combina muito bem com a serenidade de seus olhos. Além disso, as quatro décadas e meia de vida em São Paulo fizeram brotar um genuíno sentimento de gratidão: "Essa terra me acolheu. Cheguei aqui sem nem saber português, conheci ótimos músicos. Fiz amigos, me deu quatro filhos. Sou muito grato."

Ao chegar, São Paulo também deu a Shigemitsu um emprego na fábrica da Giannini, mas o ritmo industrial de feitura de instrumentos não harmonizava com sua particular melodia de jovem luthier.

Resolveu seguir caminho próprio. Escreveu para um dos grandes violonistas brasileiros, Turibio Santos, e encontrou-se com ele. "Ele me disse, já no primeiro encontro, para acertar o som agudo, se o agudo brilhar a música levanta. Foi uma grande lição."

Sete anos depois do encontro, seus violões já eram protagonistas nas canções de João Bosco e Toquinho. Logo, outros grandes compositores apareceram, entre eles Chico Buarque, Paulinho da Viola e Marco Pereira, que gravou seu celebrado Valsas Brasileiras com os instrumentos do Sr. Shigemitsu.

Cada violão é uma obra singular. Jamais são iguais: "Não gosto de repetir a mesma coisa, em cada um faço algo diferente".

Tal esmero exige uma variada combinação de diferentes qualidades de madeira, especialmente cedro americano, jacarandá, mogno brasileiro e ébano indiano. Mas é no pau-brasil que deposita suas esperanças.

"É uma madeira difícil de acertar, mas se acertar é outra coisa, outro nível", explica. "Para que a música mude, é preciso que o violão mude, aí um compositor escuta esse som e faz algo novo: o pau-brasil pode mudar o som, tenho muita esperança nisso."

A maior dificuldade é que para um violão ficar bom pode levar 30 anos, isso se o instrumento for tocado constantemente. Se somarmos o tempo médio de secagem da madeira, outros 30, e de estufa, em média dez anos, um violão precisa de cerca de sete décadas para alcançar o som ideal.

"O problema é que já tenho 77", brinca. "Mas acho que consegui fazer alguma coisa pela música brasileira, diz. Como última etapa de carreira, ele conta que pretende deixar uns 30 violões prontos. "Não vou conseguir ver como ficarão, mas quero deixar alguma coisa para o Brasil."

Para terminar, esse paulistano japonês conclui: "É o único país que compõe música popular só com violão, é um país feito de som, som que vem do violão".

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