Paulistanas mandam a tintura às favas e assumem os cabelos grisalhos

Aos 32 anos, a tatuadora Tainá Camilo ostenta uma mecha grisalha "generosa", como gosta de enfatizar. Os fios caem harmoniosamente sobre a testa e o contorno do rosto.

"É uma atração. A todo lugar que vou, recebo elogios. As pessoas costumam me perguntar se tinjo. É meu xodozinho", diverte-se a artista, que tem um estúdio de tatuagem em Pinheiros, na zona oeste.

Mas a relação de Taína com os cabelos brancos não foi sempre tão boa assim. Os primeiros fios platinados que surgiram em sua cabeleira castanha, quando ela tinha apenas 21 anos, eram arrancados um a um, com uma pinça. Sem dó.

"Meu medo era ficar parecendo uma mulher relaxada, que não se cuida", desabafa. Mas como a ideia de tingir a incomodava ainda mais, ela decidiu aceitá-los.

Essa espécie de automutilação ao eliminar os fios à força é comum, conta a tricologista Ana Carina Junqueira Bertin. No entanto, além de não acabar com os brancos –afinal, eles vão voltar a crescer da mesma cor–, o hábito pode causar alopecia (calvície) no local. "A tração gera uma lesão na raiz, o que pode prejudicar o crescimento dos novos."

A médica explica que os cabelos ficam brancos por meio de um processo oxidativo, em que o organismo consome a melanina (proteína responsável pela pigmentação) da fibra capilar. Geralmente, eles aparecem entre os 25 e os 35 anos e estão relacionados ao envelhecimento e ao estresse.

"Para muitas mulheres, a ideia de perder a juventude é assustadora. Vale qualquer coisa para se livrar dos indícios da passagem do tempo", afirma a psicóloga e sexóloga Suzana Alves. "Uma atitude inicial de negação é compreensível. Há quem viva praticamente um processo de luto."

Suzana observa que para assumir os brancos é preciso ter autoconfiança. "Se a mulher estiver em uma fila e oferecerem a ela o lado preferencial, pode soar como ofensa se ela não tiver elaborado isso emocionalmente", pondera a psicóloga de 45 anos que também ostenta mechas grisalhas.

A diretora de arte Carolina Bertier, 42, dona de fios curtos e acinzentados, já enfrentou uma situação parecida. Moradora de Santa Cecília, no centro da cidade, ela conta que uma vez, no metrô, um rapaz ofereceu a ela o assento para idosos.

"Acho que ele estava distraído, eu com a cabeça baixa. Quando olhamos melhor um para o outro, nós dois rimos." Carolina decidiu assumir os brancos quando fez uma viagem à Índia. "Cansei de ser escrava da tintura."

Eduardo Knapp/Folhapress
Meu cabelo nunca teve uma cor tão bonita', diz Simone Pires
'Meu cabelo nunca teve uma cor tão bonita', diz Simone Pires

A grisalha Simone Pires, 48, é dona de dois salões de beleza na zona oeste. Para ela, além de personalidade, quem deseja parar de tingir o cabelo deve estar preparada para o processo de transição.

Simone conta que usava hena para disfarçar os primeiros fios brancos. Quando percebeu que eles já haviam tomado conta das madeixas castanhas, largou a tintura. "Como a coloração vegetal desbota com o tempo, a transição foi mais tranquila. O cabelo vai ganhando um tom dégradé."

Por ser cabeleireira, ela diz que sofreu pressão para não parar de tingir, mas não se abalou. "No salão, sempre trabalhei com a autoestima das clientes. Nunca as influenciei a colorir ou não os fios", justifica.

"Acho que meu cabelo nunca teve uma cor tão bonita. Às vezes passo por um espelho e volto para olhar de novo", confessa Simone. "Ele está bem prateado, com brilho e destaca a cor dos meus olhos."

Ver cada vez mais mulheres grisalhas estimula outras a aderirem ao estilo, observa a cabeleireira. Na lista de famosas estão a francesa Christine Lagarde, 62, diretora-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), a atriz americana Meryl Streep, 69, e a brasileira Vera Holtz, 65.

Adriana Siqueira, 53, aposentada e moradora dos Jardins, conta que parou de tingir porque é alérgica à amônia, substância comum nas colorações. Muitas mulheres elogiam suas melenas, mas dizem que não têm coragem deixar os brancos aparecerem.

"Uma situação engraçada é que, na rua, as grisalhas se olham e dão uma risadinha", revela. "É como um clubinho de resistência."

Ilustração Sávio Lopes

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Produção Aline Prado

Adriana Siqueira veste Lilla Ka e Morena Rosa

Carolina Bertier veste Lupo e Morena Rosa

Simone Pires veste Forever 21 e Ampamulherdopadre

Tainá Camilo veste Ampamherdopadre e Lupo

Agradecimentos: lojas Supergrama e By Kamy

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