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19/08/2011 - 14h32

Fim de jogo?

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BERNARDO ITRI
EDUARDO OHATA
DE SÃO PAULO

Poucas horas antes da partida entre Corinthians e América-MG, pela 14ª rodada do Brasileiro, o celular de Andres Sanchez, 47, presidente do clube paulista, toca. "Cuidado com o jogo de hoje. Três derrotas seguidas significam crise total, não dá para perder...", ecoa no telefone do corintiano. Como quem segue a instrução de um superior, Andres concorda com a cabeça, diz que sabe desses perigos, pergunta da família e logo desliga.

Do outro lado da linha, quem falava era o mais ilustre torcedor do Corinthians: o ex-presidente Lula. Naquele dia, a equipe venceu por 2 a 1.

"Ele é como todo torcedor. Quando alguém erra, ele reclama, diz: 'Pô, mas esse jogador fez isso, tem que tomar cuidado'", conta o cartola. A proximidade de Andres e o Corinthians com Lula rendeu frutos. Embora o corintiano negue, o ex-presidente foi peça-chave para que fosse tirado do papel o tão sonhado estádio do time.

Felipe Hellmeister/Folhapress
Andres Sanchez, presidente do Corinthians, no ginásio do clube, localizado no Parque São Jorge, em São Paulo
Andres Sanchez, presidente do Corinthians, no ginásio do clube, localizado no Parque São Jorge, em São Paulo

A relação com o petista é uma das muitas que o cartola cultivou desde 2007, quando assumiu a presidência do clube. Entre nomes do futebol e políticos, Andres, que se programa para deixar o cargo em dezembro, coleciona aliados fortes e desafetos duros.

Um dos mais recentes amigos é o maior responsável pela Copa do Mundo no Brasil. O presidente da CBF e do COL (Comitê Organizador Local), Ricardo Teixeira, indicou Andres para chefiar a delegação da seleção na Copa de 2010. Tarefa importante que o corintiano cumpriu, mas que lhe rendeu um desafeto: o técnico Dunga não gostava da abertura que seu chefe de delegação dava para a imprensa.

Dunga fracassou, e o corintiano sobreviveu. Desde então, fortaleceu-se no futebol e continuou gerando polêmicas. O exemplo mais recente é a construção do Itaquerão. Andres insiste em dizer que não há dinheiro público no estádio, a sua maior conquista no comando do Corinthians. Mas a arena receberá R$ 400 milhões de empréstimo do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e R$ 420 milhões de incentivos fiscais da prefeitura.

"O CARA" DA ZONA LESTE

Origem do dinheiro à parte, o fato de conseguir iniciar as obras do estádio corintiano, que teve 13 maquetes desde os anos 1970, faz com que o cartola se torne cada vez mais popular na zona leste, onde a arena será erguida.

Assim como Lula, seu ídolo confesso, Andres recebe tratamento digno de presidente quando vai à região, especialmente em Itaquera. De líderes locais, animados pela súbita valorização de seus imóveis, brotam elogios.

"Esse André [sic] é o cara. Estou feliz. O preço de todas as casas aumentou, incluindo o da minha", comemora o taxista Helio Sousa Santos, 48, que mora na região. "Ele fala uma linguagem que é nossa. Não é rebuscado, não tem papas na língua e não tem medo de dizer besteira", define Lídia Paniaga, vice-presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Itaquera.

Quando o assunto é a zona leste, Andres age como um político. "Muita gente não tinha perspectiva de trabalho, de renda, de emprego, porque os governos sempre deixaram o fundão da zona leste de lado. Agora essas pessoas vão ter um retorno. O que a zona leste deu para o Corinthians em cem anos, nós vamos devolver em três."

Há, porém, oposição aos efeitos da obra. "A Copa vai causar desapropriação de várias casas, e muitas famílias ficarão sem teto", argumenta Benedito Barbosa, presidente do Comitê Popular da Copa, que organizou protesto em frente ao terreno do Itaquerão.

UÍSQUE COM GUARANÁ

A relação de Andres com a zona leste é estritamente profissional. A maioria de suas atividades que não estão relacionadas ao Corinthians acontece em outros cantos da cidade.

Morador da zona oeste, costuma frequentar locais próximos de sua casa ou na zona sul. Boêmio, vai à Passatempo, no Itaim Bibi, boate conhecida por receber cartolas, agentes de jogadores e atletas, e à boate Cortez, de música sertaneja, na Vila Olímpia.

Quando sai, não abre mão de beber uísque Red Label com guaraná. "Faz oito anos que não bebo cerveja. Bebo uísque como se fosse cerveja. É cada puta foguete...", conta Andres, que fuma cigarros "light".

No início deste ano, Andres marcou presença no aniversário de Neymar, na boate Royal, no centro. Ficou por algumas horas, em um camarote fechado, junto do ex-atacante Ronaldo, um dos sócios da balada. Enquanto curtia a festa, jogadores do Corinthians se divertiam no ambiente, com bebida à vontade e muitas mulheres. O fato de sair e beber com atletas do clube é, aliás, um dos pontos mais levantados por críticos do cartola.

Separado, Andres é mais discreto ao falar de suas namoradas. Apresentadoras de TV, modelos e atrizes estão na lista de beldades com quem ele teria mantido algum tipo de relacionamento. Questionado se o assédio feminino é muito grande, Andres afirma que sim, para em seguida disfarçar. "Graças a Deus, é o que dizem. Mas afirmo e repito: não sou galinha como falam."

Depois, ao ser indagado se é um homem bonito --e por isso faz sucesso com as mulheres--, Andres filosofa: "Tem muito assédio porque o Corinthians é muito bonito!". E emenda: "É mentira. É mentira que namorei a Rosane Collor [ex-primeira-dama]".

Há poucos anos, o vaidoso corintiano chegou até a fazer "peeling" no rosto. "Tive acne quando jovem e ficaram muitas marcas. Me incomodava, sempre me incomodou. Deu uma melhoradinha, mas foi para nunca mais fazer -dói muito."

FAMÍLIA E PRECONCEITO

Filho de espanhóis, Andres nasceu em Limeira, no interior paulista. Tem dois filhos, do casamento de 12 anos com Odete, de quem se separou em 2001 e sobre quem não costuma falar. É no Pacaembu que Andres tem encontrado mais o filho Lucas, 18.

"Talvez veja meu filho mais nos jogos do que em outro lugar depois que me tornei presidente", diz. Lucas está entrosado no meio do futebol. Chegou a acompanhar o pai, recentemente, em uma festa de um agente de jogadores, onde bateram ponto atletas, o presidente do Palmeiras, Arnaldo Tirone, e outros boleiros. "Sei das dificuldades que ele tem por ser presidente do Corinthians. Mas admiro sua determinação", disse Lucas, que já fala por meio do assessor de imprensa do pai.

Andres reclama que os insucessos do time respingam nos filhos. Marina, 14, deixou até de ir à escola após a eliminação do Corinthians da Libertadores deste ano. "Tem sempre uma cobrança, uma piadinha. [Os amigos] Reclamam que houve uma contratação errada, que o time não está correndo. Mas eles estão mais fortes agora."

Embora não seja afetado diretamente por esse tipo de zombaria, Andres se diz alvo de outro "preconceito". O corintiano, que estudou até a 8ª série, relata que se sente desconfortável quando está em um ambiente com pessoas que tiram sarro do seu jeito de falar. Ele omite frequentemente a letra "S" dos plurais.

"Tiram sarro, não. São preconceituosos. Você se sente mal por saber que em alguns lugares te olham torto pelo preconceito, isso é muito difícil. Isso me entristece, mas falo como 85% da população brasileira", afirma ele, que disse ter interrompido os estudos para trabalhar e ajudar a família.

DA PREFEITURA À CBF

Se um dos motivos de Lula ter chegado à Presidência foi o fato de ele "falar como o povo", Andres poderia ser uma potência na política. Alguns de seus amigos sugerem como destino do cartola a Prefeitura de São Paulo, mas ele diz nem pensar no caso. Mesmo assim, é filiado ao PT.

"Em 2012 me vejo trabalhando, vivendo minha família. Não quero cargo político, mas acho que todos deveriam se interessar. Minha família sempre foi de sindicalistas. Eu mesmo fui presidente do sindicato de todos os Ceasas de 1982 a 1985", diz ele, que começou a vida profissional trabalhando com um tio e, depois, com o pai em uma banca de feira no Parque Dom Pedro, no centro.

A permanência do presidente corintiano nos bastidores do futebol, porém, é o que mais se ouve ao conversar com seus aliados. Um dos maiores articuladores do enfraquecimento do Clube dos 13, entidade que negociava os direitos de TV das principais equipes do país, Andres se aliou à Globo e à CBF e é cotado para presidir a Liga, órgão que substituiria o C13.
Andres nega. "Não serei o presidente da Liga. Acho que o presidente tem que ser um executivo de mercado, tem que profissionalizar ao máximo, se a Liga vier a existir."

Outra opção, mais audaciosa, é a CBF. Cartolas influentes veem em Andres o sucessor natural de Ricardo Teixeira, que deverá se candidatar à presidência da Fifa em 2015.

Novamente, ele nega. "Não pleiteio esse cargo. Quero trabalhar para ajudar o futebol brasileiro e principalmente o Ricardo Teixeira. Mas o futuro a Deus pertence."

Pesa contra a promoção de Andres sua ligação com empresários de futebol. A maior crítica a ele está relacionada à amizade com o iraniano Kia Joorabichian. A MSI, empresa que era do agente, investiu no Corinthians em 2004 e 2005 e chegou a ser investigada pela Polícia Federal por suposta lavagem de dinheiro. Desde que a parceria ruiu, Kia foi embora do país, mas continua fazendo negócios com o clube. "Tenho boa relação com o Kia. Mas não há ligação comercial nenhuma entre mim, o Corinthians e ele."

A única certeza é a permanência na presidência do Corinthians só até dezembro. Embora sofra pressão para mudar o estatuto do clube para que seja permitida a reeleição e ele continue no cargo, Andres rechaça a ideia. Quer passar o bastão a um sucessor, assim como fez Lula com Dilma Rousseff.

"Se fizer meu sucessor, quando ele precisar, estarei disponível. É como o Lula, que é consultado. Ninguém fica oito anos no governo e em seis meses dizem para ele: 'Não precisa falar mais nada que eu sei tudo'."

O que se vê desenhado para Andres é exatamente o que o ex-presidente tem praticado. Da mesma maneira que Lula, que continua atuante após deixar o Palácio do Planalto, o cartola deve seguir como um dos principais nomes da política esportiva nos próximos anos.

Ouça podcast sobre os bastidores da reportagem:

Eduardo Ohata e Bernardo Itri

*

ISTO É ANDRES

"O Corinthians não joga mais no Morumbi enquanto eu for presidente. Só jogo lá se for mando do São Paulo"
14.fev.2009

"Nada é impossível. Só a morte é impossível"
17.dez.2010

"As pessoas bebem fora do estádio, antes de entrar nos jogos. Por que não podem beber dentro também?"
10.dez.2009

"Sou amigo do Ricardo Teixeira mesmo, sou amigo da Globo mesmo, apesar de serem gângsteres"
3.mai.2011

"As obras [do Itaquerão] estão 100% a vapor"
16.jun.2011

*

ALIADOS

Do Corinthians

Luis Paulo Rosenberg, diretor de marketing
É o responsável pelo sucesso de marketing do clube

Kia Joorabichian, empresário iraniano e ex-presidente da MSI
Quando vem ao Brasil, encontra-se com Andres e sempre é defendido pelo cartola

Carlos Leite, empresário
Foi o agente que teve melhor trânsito no Parque São Jorge durante a gestão de Andres

andré luiz oliveira
(André Negão), diretor-administrativo
Foi um dos articuladores da caminhada de Andres à presidência 
do clube

Ronaldo, ex-jogador
Participa da vida do clube nos bastidores

Mário Gobbi, ex-diretor de futebol
É o escolhido por Andres para ser seu sucessor

Da política

Lula, ex-presidente
Foi peça fundamental para o estádio sair do papel

Orlando Silva Jr., ministro do Esporte
Estreitaram laços depois que o Itaquerão foi indicado para a Copa

Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo
Deu R$ 420 milhões de incentivos fiscais para a obra do estádio

Da CBF

Ricardo Teixeira, presidente
Ficaram próximos na eleição do Clube dos 13, em 2010, quando apoiou o candidato da CBF, Kleber Leite

Mano Menezes, treinador
Considerado por Andres um de seus maiores acertos no futebol do clube

Da Globo

Marcelo Campos Pinto, executivo da Globo Esporte
Viu Andres defender a negociação individual com a Globo pelos direitos de TV do Brasileiro

DESAFETOS

Do Corinthians

Alberto Dualib, antecessor de Andres
Andres foi diretor de Dualib quando ele era presidente do Corinthians, mas depois se opôs a ele

Antonio Roque Citadini, presidente do Conselho de Orientação do Corinthians
Ex-vice de futebol, é um dos principais críticos da gestão de Andres

Paulo Garcia, oposicionista
É o provável candidato de oposição na próxima eleição corintiana, em dezembro ou fevereiro

Cartolas e técnico

Juvenal Juvêncio, presidente do São Paulo
Principal desafeto do cartola, viu Andres impedir o Corinthians de mandar jogos no Morumbi

Dunga, ex-técnico da seleção brasileira
Enquanto tentava blindar a equipe da imprensa na Copa, o corintiano falava frequentemente com jornalistas

Fábio Koff, presidente do Clube dos 13
Foi enfraquecido pela negociação de Andres com a Globo sem a participação do C13

*

AS JOGADAS
Os acertos e erros da gestão Andres

Bolas dentro

Itaquerão
Com a ajuda do poder público, conseguiu tirar do papel o sonhado estádio corintiano

Blindagem
Tirou o Corinthians, conhecido por ser desorganizado, da mira de tiro de críticos. Tornou o clube mais fechado

Cofres
Aumentou muito o faturamento corintiano -em 2010, ele foi de R$ 212,6 milhões. Os maiores rendimentos vieram de patrocínio e receita de bilheteria

Relação política
Hoje, o Corinthians tem trânsito fácil na CBF e na Federação Paulista de Futebol, entidades com as quais Andres mantém bom relacionamento

Bolas fora

Contratações
Pecou na hora de reforçar o clube, com jogadores caros e que pouco renderam. Souza, Defederico e Tcheco são exemplos

Categoria de base
Pouco investiu no setor. Por isso, raros foram os jogadores formados no clube que se destacaram na equipe principal

Sem Libertadores
Em sua gestão, ganhou um Campeonato Paulista, uma Copa do Brasil e a Série B. Mas fracassou em duas Libertadores

Entrada de agentes
Empresários do futebol tiveram portas abertas no Parque São Jorge. Ao mesmo tempo em que colocam seus atletas, podem pressionar o clube para vendê-los

*

CASA PRÓPRIA
Itaquerão deve ficar pronto em fevereiro de 2014

O estádio do Corinthians começou a sair do papel depois que o Morumbi foi excluído da Copa. Seu projeto inicial, com 48 mil assentos, previa custos de cerca de R$ 350 milhões. Mas, como São Paulo é indicada para abrir o evento, que reúne o maior número de autoridades de toda a Copa, o projeto sofreu alterações e seu preço ficou em R$ 820 milhões.

a prefeitura concedeu incentivos fiscais de R$ 420 milhões, e o BNDES emprestou outros R$ 400 milhões. Porém, se a cidade for mesmo abrir o Mundial, o estádio vai precisar de mais 17 mil lugares. Quem vai pagar a estrutura provisória será o governo paulista, que deve gastar R$ 50 milhões.

 

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