A troca automática de um medicamento biológico por um biossimilar, remédio equivalente e mais barato, foi criticada por especialistas em fórum realizado pela Folha.
Eles defendem que a chamada intercambialidade não seja automática no SUS e que a mudança de droga seja avaliada caso a caso.
Embora tenham o mesmo princípio ativo, os medicamentos biossimilares não podem ser considerados iguais aos de referência devido à variabilidade biológica de suas células vivas. Esses remédios servem para o tratamento de doenças como câncer, artrite reumatoide e diabetes.
A efetividade dos biossimilares está assegurada pela similaridade, mas há dúvidas sobre quais pacientes se beneficiam com a troca do biológico pelo seu equivalente.
Não há muitos questionamentos sobre os benefícios de adotar biossimilares para pacientes que estão começando o tratamento. Já aqueles acostumados às drogas biológicas podem não obter bons resultados com a troca.
“Estamos num limbo regulatório e, por isso, a troca é feita muitas vezes por aspectos financeiros, e não técnicos”, afirmou o médico Valdair Pinto, consultor em medicina farmacêutica, no Fórum Medicamentos Biológicos e Biossimilares, realizado com patrocínio da Pfizer e da Roche, nesta quinta (22), no MIS, em São Paulo.
Segundo Pinto, a classe médica não é contra o uso de biossimilares, principalmente em novos pacientes, mas o apoio tem restrições.
“A Anvisa [Agência de Vigilância Sanitária] precisa fazer uma aprovação regulatória com bases científicas sólidas e transparentes”, disse.
A agência, responsável pela regulação de medicamentos no país, informa que a decisão sobre a troca é papel de médicos e do Ministério da Saúde. Cabe a ela assegurar a qualidade, eficácia e segurança dos produtos.
Para Morton Scheinberg, professor da USP, a substituição deve ser feita em comum acordo entre médico e paciente, e não pelo distribuidor do medicamento [o governo]. “Caso contrário, vira promiscuidade terapêutica.”
Não se deve partir para o “sempre troca” nem para o “nunca troca”, diz Antônio Britto, presidente da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa). “Diante da falta de dinheiro, os governos convivem com a ideia de que o barato, ainda que não totalmente adequado, é melhor do que nada. Mas os medicamentos biológicos colocam uma dificuldade nessa equação.”
Britto defendeu maior conscientização e participação dos médicos na tomada de decisão sobre qual a prescrição mais adequada.
Eduardo Calderari, diretor de acesso ao mercado da Roche, acredita que a competição vai baixar os preços dos medicamentos. “O importante é que não seja escolhido simplesmente o mais barato, mas, sim, o medicamento que vai produzir o efeito desejado para aquele tipo de patologia, ou o barato vai acabar saindo caro.”
Segundo Rodrigo Silvestre, diretor da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, o receio dos que são contrários à troca automática é que a utilização do critério de custo-efetividade, defendido pela pasta, resulte na aquisição apenas de biossimilares. Silvestre, porém, nega que o custo vá prevalecer sobre a eficiência.
NOMENCLATURA
Além de criticar a substituição automática das drogas, Priscila Torres, coordenadora na associação de pacientes Biored Brasil, cobrou a diferenciação na nomenclatura. “Hoje, o que há na caixa é o nome do princípio ativo, que é igual em ambos. É preciso deixar claro para o paciente que os remédios não são idênticos”, afirmou Torres, que é autora do blog Artrite Reumatoide, doença crônica que a acomete.
Ela citou o caso de um paciente que recebeu pelo SUS os dois tipos de remédios, o biológico e o biossimilar, sem saber o que fazer.
O debate, com 286 pessoas na plateia, foi moderado pela repórter especial e colunista da Folha Cláudia Collucci.
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