Diagnóstico tardio e falta de unificação dificultam entrada de novas tecnologias no SUS

Especialista defende agilidade na incorporação de novos remédios para reduzir custo com a judicialização

Valéria Baraccat, jornalista e fundadora do Instituto Arte de Viver Bem, Marco Antônio Fireman, do Ministério da Saúde, Antonio José Rodrigues, superintendente do Hospital das Clínicas, e Everton Lopes Batista, jornalista da Folha e mediador do debate, durante o 5º fórum A Saúde do Brasil, em São Paulo - Reinaldo Canato/Folhapress
Leonardo Neiva
São Paulo

Problemas como a grande parcela de diagnósticos tardios da população, a falta de comunicação entre instituições e o aumento de casos de judicialização elevam os custos da saúde brasileira e dificultam a incorporação de novas tecnologias e medicamentos no SUS.

Essa foi uma das conclusões de especialistas que debateram o tema durante o 5º fórum A Saúde do Brasil, nesta segunda-feira (23), na Fundação Getulio Vargas, em São Paulo.

O evento, organizado pela Folha, tem patrocínio da Amil e da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios) e apoio da Fundação Getulio Vargas, da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira e da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar).

No Brasil, há uma demora de cerca de seis meses no SUS para conseguir marcar uma consulta e outros seis para realizar um exame, segundo Marco Antônio Fireman, secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde e responsável pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS).

“O sistema recebe muitos pacientes com doenças em estado avançado, principalmente câncer. O tratamento acaba sendo mais oneroso e sem eficácia garantida”, afirma.

Para reduzir esse tempo de espera, assim como a grande distância que o paciente precisa percorrer em algumas regiões para conseguir fazer um exame, o governo tem a meta de criar 80 centros médicos de diagnóstico e tratamento contra o câncer distribuídos pelo país, de acordo com Fireman.

A jornalista e fundadora do Instituto Arte de Viver Bem, ONG voltada à luta contra o câncer de mama, Valéria Baraccat, que também teve a doença, fez críticas à demora para a incorporação de medicamentos à rede pública, mesmo depois de aprovados pela Conitec.

“No ano passado, o trastuzumabe, uma droga que, com a quimioterapia, pode ampliar em cerca de dois anos e meio a vida do paciente, foi incorporado ao SUS. Devia estar na rede pública em todos os hospitais desde 29 de janeiro, mas não estava. Descobri que a primeira dose foi comprada no dia 10 de abril e só começa a chegar agora nos hospitais públicos”, contou.

Fireman, no entanto, afirmou que a demora para a chegada dos medicamentos pode se dever à falta de interligação entre os sistemas de compras do SUS de alguns estados, o que afetaria o abastecimento. Outra possibilidade, segundo ele, é que haja problemas na comunicação entre as secretarias de estado de Saúde e os hospitais.

O superintendente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Antonio José Rodrigues, destacou a importância da realização de avaliações profundas antes de incorporar alguma nova tecnologia ao SUS, levando em conta o quanto a mudança custará para a saúde pública e quais benefícios ela deverá trazer para o bem-estar dos pacientes.

“Qual é o impacto dessa tecnologia? Ela substitui total ou parcialmente a antiga? Ou complementa? A saúde não tem preço, mas tem custo, e não há dinheiro para tudo. Todos os protagonistas desse processo, engenheiros clínicos, médicos, órgãos de vigilância, devem estar envolvidos”, afirmou.

Segundo Rodrigues, a criação do prontuário eletrônico da saúde, um registro unificado com dados de todos os pacientes do SUS no Brasil, que está sendo implantado pelo Ministério da Saúde, deve permitir um acompanhamento mais detalhado dos pacientes e também ajudará a evitar parte do desperdício de dinheiro do setor.

JUDICIALIZAÇÃO

Para Baraccat, uma maior agilidade na incorporação de novos medicamentos e tecnologias ajudaria a reduzir os custos crescentes com a judicialização no país.

“Sou contra a judicialização, mas se for um medicamento já aprovado pela Anvisa, em último caso, acredito que o paciente deve entrar com uma ação para consegui-lo sim”, afirmou.

Marco Antônio Fireman disse que é preciso saber dividir entre a judicialização realmente necessária, por questão de atraso na incorporação da tecnologia ou remédio, e a que é feita por estratégia da indústria.

“Quando, depois de registrar um produto na Anvisa, o Brasil coloca um preço mais baixo que em outros países, ele reduz o valor do fármaco em todos os outros lugares. Então muitas indústrias retardam essa precificação no Brasil, o que pode gerar uma demanda judicial sem que o medicamento tenha sido ainda incorporado pela Anvisa e o Conitec”, explicou.

PESQUISA

Fireman também defendeu uma maior aproximação da indústria com pesquisadores da área de inovação na saúde no Brasil. De acordo com o secretário, dos projetos desenvolvidos por hospitais em parceria com o Proad-SUS (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS), nenhum foi produzido até o momento.

Segundo Antonio José Rodrigues, superintendente do Hospital das Clínicas, nos últimos anos houve uma retração da pesquisa médica feita no Brasil, devido à crise financeira enfrentada pelo país. “Passando 2019 ou 2020, acredito que volte a aumentar. Hoje há muitas pesquisas, mas com poucos frutos no lado da produção.”

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