Descrição de chapéu Inovação Educativa

Projeto arquitetônico de colégio também é ferramenta de ensino

Especialistas criticam organização espacial de imóveis escolares, que seguem padrão centenário

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São Paulo

“Não-lugar” é um conceito criado pelo antropólogo francês Marc Augé para designar espaços de rápida passagem, como aeroportos e estações de metrô, que são similares no mundo todo e com os quais não se cria sensação de pertencimento.

Uma escola deve ser, em tese, o oposto disso. Alunos e professores passam boa parte de seus dias nela. Estudantes precisam sentir que são parte daquilo. Faz sentido, então, que a construção de escolas siga um padrão, tal qual a de aeroportos ou estações?

Não, para Giselle Arteiro, arquiteta, professora e membro do Grupo Ambiente Educação, da UFRJ.
“As escolas, e principalmente as salas de aula, mantêm o mesmo formato de organização espacial e o mesmo layout há mais de cem anos. O mundo mudou. Elas têm um projeto padronizado, é igual no Rio, no Nordeste, no Sul.”

O modelo padrão reflete uma visão segmentada de ensino, em que só se aprende na sala de aula. Outros espaços, como pátio e até cozinha, não são bem aproveitados.

“Não se levam em conta as especificidades de cada região”, frisa a arquiteta. Se não consideradas no projeto as diferenças regionais, como temperatura, podem prejudicar o ensino, já que é preciso conforto para estudar. 

“A acústica, a luz e a temperatura têm que ser adequadas, ou você não fica no topo de suas capacidades. Sob calor, a gente fica mole”, diz Dóris Kowaltowski, arquiteta e professora da Unicamp. 

Além de prover as condições ideais, o edifício escolar deve, ele mesmo, ser ferramenta de ensino. “O prédio contribui para estimular o lúdico e o científico. Pode haver no piso desenhos geométricos, fazendo com que as crianças pulem de um para outro. Isso é uma aula de ginástica automática”, exemplifica Dóris.
Também os objetos que vão dentro do prédio devem ser bem pensados. Carteiras iguais funcionam mal, já que, dentro de uma mesma turma, há alunos de vários tamanhos.

A arquitetura escolar pode influenciar até na prática de bullying. Um banheiro isolado facilita a prática, já que menos gente tende a passar por lá e, assim, o agressor se sente mais à vontade para perturbar sua vítima no local.

O arquiteto mineiro Pedro Haruf ficou empolgado ao ser contratado, em 2016, para desenhar uma escola em Belo Horizonte. O cliente pediu que ele e seus dois sócios, Gabriel Castro e Marcos Franchini, fizessem uma imersão em literatura sobre pedagogia antes de iniciar o projeto.

Depois dos estudos, desenharam a Casa Fundamental, escola infantil particular (até o quinto ano) que abriu neste ano e funciona dentro de um galpão.

No espaço, para estimular a autonomia das crianças, conta Haruf, não há uma forma única de chegar ao segundo andar. É possível subir por uma escada tradicional e por uma que é metade arquibancada. Para descer, às duas opções se une um escorregador. 

Além disso, é impossível que as salas fiquem totalmente fechadas: o objetivo é estimular o contato com o ambiente externo. “A criança sempre vai conseguir ver o que acontece fora. Há três vãos para entrar e só dois deles podem ser fechados”, explica o arquiteto. 

Em 2017, a escola venceu o prêmio de arquitetura do braço mineiro do Instituto dos Arquitetos do Brasil.
É mais fácil achar exemplos que fogem ao padrão de projeto escolar na rede particular, afinal, é mais fácil erguer e gerir um colégio do que cuidar de milhares de unidades.

A FDE (Fundação para o Desenvolvimento da Educação) de São Paulo é responsável por 5.560 escolas no estado paulista. A organização tenta, desde 2003, construir prédios mais adequadas.

“Os projetos novos já vêm com a concepção de melhorar a ventilação, proporcionar  mais conforto, cortar ruídos e admitir atividades comunitárias”, diz Luiz Sobral, presidente da fundação. Há 156 escolas nesse modelo.


Como o ambiente pode afetar o aprendizado


Iluminação Um lugar sem luz natural tem impacto sobre o funcionamento fisiológico do ser humano. As consequências são baixa motivação, estresse, mau humor e desregulamento do relógio biológico. É que a luz auxilia na produção de melatonina, hormônio que o regula 

Cores Cada cor insta certas áreas do cérebro e, portanto, diferentes comportamentos. Dentro de uma sala de aula é necessário promover a concentração, e são indicados os tons claros de verde e azul, porque estimulam o córtex pré-frontal, responsável pela clareza mental 

Ergonomia As crianças passam muitas horas sentadas nas escolas. É fundamental que as cadeiras propiciem uma postura adequada. Isso reduz problemas físicos, dores e falta de concentração. É ideal que o mobiliário seja flexível e se ajuste aos estudantes, e não o contrário

Fonte: neuroarquiteta Priscilla Bencke

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