Descrição de chapéu Brasil China

Investimento chinês gera crítica porque ainda é novo no Brasil

Para presidente da China Three Gorges no país, lenta retomada e incerteza eleitoral não abalam confiança; no entanto, vê 2018 como um ano sem expansão dos negócios

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Li Yinsheng, presidente da companhia elétrica China Three Gorges no Brasil, em São Paulo - Karime Xavier/Folhapress
São Paulo

Os investimentos chineses no Brasil chamam a atenção —e atraem críticas— apenas porque ainda são novidade no país. Essa é a opinião de Li Yinsheng, presidente da companhia elétrica China Three Gorges no Brasil.

“As pessoas não percebem os investimentos de outras nacionalidades, porque elas estão aqui há décadas ou séculos. Aceitam essas empresas, não importando se fazem isso ou aquilo. Como o chinês é algo novo, as pessoas estão mais atentas”, afirma.

Na China, a empresa é responsável por administrar a maior hidrelétrica do mundo (e que dá nome à empresa), a usina de Três Gargantas.

No Brasil, onde a empresa atua desde 2013, ela já soma 8,27 gigawatts de capacidade instalada em usinas hidrelétricas —o equivalente a quase 60% de Itaipu.

O executivo ressalta que a companhia é brasileira e refuta a imagem de que, por ser estatal, recebe benefícios do governo chinês para se expandir em projetos pelo mundo.

A lenta retomada econômica e a incerteza eleitoral no Brasil, segundo ele, não abalam a confiança no potencial do país. Yinsheng, no entanto, não vê 2018 como um ano de expansão no país, mas sim de consolidação e modernização.

“A nova estratégia é consolidar ativos e fazê-los mais eficientes, para nos tornarmos um dos melhores operadores hidrelétricos do Brasil.”
 

Li Yinsheng, presidente no Brasil da China Three Gorges, estatal chinesa do setor elétrico - Karime Xavier/Folhapress

Temos visto um freio nos investimentos chineses no Brasil neste ano. Qual o motivo? 

Entre 2011 e 2016, houve muitas oportunidades. É um dos motivos pelos quais aconteceu um boom e, agora, uma redução. É a dinâmica do mercado. Além disso, alguns investidores chineses fizeram aquisições e agora precisam de tempo para digerir, melhorar e integrar suas operações.

Vivemos uma recuperação lenta da economia e um cenário político incerto. Como isso vai afetar o interesse? 

Para a CTG [China Three Gorges], os investimentos são baseados no longo prazo. São concessões de 30 anos. O curto prazo é importante, mas não é chave na hora de tomar decisões. A situação atual não incomoda o nosso negócio.

Como o resultado da eleição presidencial pode impactar?

O que posso dizer é que a gestão atual tomou iniciativas positivas, iniciou reformas. No setor elétrico, o governo começou a falar com o setor privado, associações e reguladores para melhorar as regras. A próxima administração terá um bom ponto de partida para seguir.

Quais são os principais entraves que vocês enxergam no ambiente de negócios brasileiro? 

Não há problemas até agora. As companhias estão unidas e estão tentando integrar a cultura, o que naturalmente vai levar alguns anos.

O que seria integrar a cultura? 

Compramos ativos de diferentes donos. Você tem de se ver como uma empresa local. É o que buscamos na CTG. Essa é uma empresa brasileira, com chineses como principais acionistas. Contamos com recursos humanos brasileiros, fornecedores, contratadores do mercado nacional.

Problemas regulatórios ou judiciais são um problema? 

É nossa vida. Para fazer negócios, é preciso encarar a realidade. Em primeiro lugar, o arcabouço regulatório é sofisticado aqui. Funcionou bem no passado, antes de ocorrer uma longa estiagem. Mas nada é perfeito. Com a severa seca nos últimos anos, essa regulação foi desafiada e teve falhas. Os reguladores têm falado com os atores para ver as mudanças necessárias. Poderia ser mais rápido. Arcabouço regulatório não é fácil em nenhum lugar.

Há também críticas a estatais chinesas que recebem apoio do governo, que podem gerar uma concorrência desleal nos leilões.

 Eu discordo. Posso falar do nosso negócio, que funciona como no setor privado. Fazemos nossas decisões com base em retorno econômico e perfil de risco. Metade do capital da companhia, de R$ 23 bilhões, vem de equity [capital próprio]. É o dinheiro que ganhamos por trabalhar duro em diferentes negócios. A outra metade vem de financiamentos do BNDES, de um banco japonês [o MUFG] e de debêntures locais, lançadas com base na nossa credibilidade na região. A estrutura de capital é diversificada. Não há benefícios do governo chinês.

A governança e a transparência das companhias chinesas também são questionadas.

Na China Three Gorges, a governança é transparente. Temos executivos brasileiros. Nossos CFO [diretor financeiro] e COO [diretor de operações] são brasileiros. Hoje, é difícil dizer quem é dono do que. Antes, era possível dizer: essa é uma empresa chinesa. Hoje, o conceito mudou, há muitos outros atores envolvidos, os reguladores, funcionários, clientes.

Houve casos de conflito envolvendo companhias chinesas, como a disputa entre a State Grid [outra estatal da China do setor elétrico] e os acionistas minoritários da CPFL Renováveis [comprada pela State Grid em 2016]. Como o senhor vê isso? 

Não saberia dizer sobre o caso da State Grid. Mas, como os investidores chineses são algo novo no país, as pessoas tentam diferenciar: isso é uma empresa chinesa. As pessoas não percebem os investimentos de outras nacionalidades porque elas estão aqui há décadas ou séculos. Aceitam essas empresas, não importando se fazem isso ou aquilo. Como o chinês é algo novo, as pessoas estão mais atentas e tentam ligar esses comportamentos com o país de origem. Se o mesmo tivesse ocorrido com uma empresa de outro país, as pessoas não se importariam.

Quais são os planos da China Three Gorges para os próximos anos?

Estamos em um processo de integrar os negócios. Nossa nova estratégia é consolidar ativos e fazê-los mais eficientes, para nos tornarmos um dos melhores operadores hidrelétricos do país. Em segundo lugar, vamos fazer projetos de modernização. Esse é o maior do tipo até agora. A matriz energética brasileira é 70% hidrelétrica e metade disso tem mais de 30 anos. Reformar esses ativos é uma necessidade do país. Então, queremos fazer um bom trabalho e tornar o projeto uma referência para o setor.

Há oportunidades de leilões no radar?

Estamos analisando, não posso comentar de forma mais específica. Mas não é nosso foco agora. Já temos mais de 8 gigawatts de hidrelétricas. Não queremos estar tão concentrados [em um segmento] e ficar com um portfólio arriscado. Em 2018, decidimos não crescer. A ideia é reduzir o ritmo e tornar a operação mais eficiente.

Há planos de investir mais em eólicas e solar? 

A hidrelétrica é o negócio em que somos bons. Mas novos empreendimentos hidrelétricos vão depender de outras coisas. A economia começou a melhorar, mas a demanda não reage de forma imediata. Não vemos muitas oportunidades nesse setor. É um momento bom para olhar para dentro. Ao mesmo tempo, vamos avaliar a área de renováveis, mas ainda não tenho informações para compartilhar.

Como a operação global entre a empresa de energia portuguesa EDP e a China Three Gorges pode afetar a operação das duas companhias no Brasil?

Esse processo [a oferta da chinesa de comprar a portuguesa] está em andamento e será complicado, requer muitas autorizações regulatórias.

 

Entenda a briga entre State Grid e acionistas da CPFL

- Em uma das maiores operações dos últimos anos, a estatal chinesa State Grid comprou a CPFL em 2016, por cerca de R$ 14,2 bilhões

- Na esteira da aquisição do grupo veio a compra da subsidiária CPFL Renováveis e uma briga que se arrasta há mais de um ano com os acionistas minoritários da empresa, que incluem o fundo Pátria, o banco BTG, e o IFC, do Banco Mundial

- Eles reclamam do preço oferecido pelos chineses pelas ações da companhia. A disputa foi parar na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e continua em aberta

- Durante o processo, os chineses conquistaram a desconfiança de parte do mercado ao chamarem os acionistas de oportunistas, além de questionarem a atuação da própria CVM e insistirem em um preço mais baixo mesmo após recorrentes questionamentos do órgão regulador, que refutou em mais de uma ocasição o cálculo feito pela estatal chinesa

 

A China Three Gorges

A estatal chinesa de geração elétrica opera na China a maior hidrelétrica do mundo: a usina de Três Gargantas. A empresa atua em 40 países. No Brasil desde 2013, já é a segunda maior geradora privada do país, com 17 hidrelétricas e 11 parques eólicos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.