Diálogo sobre internet dá mais resultado do que vigilância intensa, diz pesquisador

Para Francisco Brito Cruz, comportamento na web deve seguir a vida real

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São Paulo

A exploração sexual na internet frequentemente envolve sextorsão, ou a ameaça de divulgação de imagens íntimas para forçar alguém a fazer algo —por vingança, humilhação ou extorsão. 

No caso de crianças e adolescentes, isso se agrava pela vulnerabilidade. Não é raro que eles próprios compartilhem imagens por impulso e, mais tarde, sejam manipulados por criminosos.

O caminho para protegê-los desse tipo de crime é a educação e o diálogo, afirma Francisco Brito Cruz, diretor do InternetLab, centro independente de pesquisa nas áreas de direito, tecnologia e internet.
“Às vezes, as pessoas acham que a internet é um reino separado da vida real. Não existe o que acontece na internet e o que acontece na vida, é uma coisa só”, diz. “Do mesmo jeito que você ensinaria a criança na rua, você a ensina a interagir na internet”, afirma ele, para quem o diálogo frequente dá mais resultados do que a supervisão intensiva. 

Quais são as formas mais comuns de exploração sexual de crianças e adolescentes na internet?  
Às vezes, as pessoas acham que a internet é um reino separado da vida real —é tudo uma coisa só. Crimes previstos no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente valem em situações que envolvem as mídias digitais também. A exploração sexual de crianças e adolescentes na internet comporta atividades que vão desde compartilhar foto ou vídeo de criança até a pessoa que tenta, com malícia, abordar uma criança ou um adolescente para extrair vantagem sexual. Não se trata, em geral, do ato físico. 

A investigação desses casos no mundo virtual muda por causa dessas diferenças? É mais difícil?
É diferente. Quando você tenta encontrar alguém que abordou uma criança na rua, investiga de um jeito. Quando quer achar alguém que abordou uma criança na internet, segue de outro. Se no mundo offline é preciso perguntar para quem estava perto e ver se tem alguma câmera na região, na internet possivelmente você vai pedir a algum provedor os dados, de onde foi acessada aquela conta. São recursos diferentes. 

Obra 'Coelho' (2014), de Ana Elisa Egreja
Obra 'Coelho' (2014), de Ana Elisa Egreja - Filipe Berndt/Divulgação

A internet costuma ser usada só como um meio de aproximação ou pode haver casos em que o aliciador consiga o que quer da criança sem ter acesso a ela? 
A exploração sexual de crianças e adolescentes na internet envolve tanto o aliciamento quanto todo o ecossistema de distribuição dessas imagens, porque essas coisas geralmente andam juntas. Quem faz isso para obter, por exemplo, a foto de uma criança, pode estar ligado a redes de compartilhamento dessas imagens. 
A internet segue o aspecto da rua, no sentido de que a criança muitas vezes vai estar passeando por ali sem supervisão. Na internet existe uma ofuscação da identidade, e isso cria certa sensibilidade, porque a criança pode ser iludida. 

Em quais plataformas a exploração se dá com mais frequência? 
Isso ocorre nas plataformas mais utilizadas, onde há maior concentração de crianças e adultos podendo conviver. O que pode variar é o fato de uma ou outra ter desenvolvido um sistema melhor para proteger as crianças. 
Há um ponto que marca quando as empresas começaram a se comprometer com o combate à exploração sexual: um termo de ajustamento de conduta que o Ministério Público firmou com plataformas nos idos de 2000, em São Paulo. Foi a primeira vez que assinaram um compromisso de tentar ativamente proteger as crianças. 
As empresas já estão comprometidas há algum tempo com isso, pois essa não é uma questão que causa divisão.

Existe algum tipo de controle com relação a diálogos?
Isso tem um porém, que é a privacidade da conversa. Os direitos individuais estão na rota de colisão com iniciativas regulatórias de controle. Existem iniciativas com essa ambiguidade, mas que estão vindo aí sob a justificativa do combate à pedofilia e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Inclusive no Brasil. É necessário achar o equilíbrio.

Quando se fala de prevenção, qual deve ser a atuação dos pais?
É difícil conseguir estar ao lado da criança o tempo inteiro. Então, como é possível ensinar e educar para que essa autonomia seja consciente e responsável? Do mesmo jeito que se ensina a criança a agir na rua, é preciso ensiná-la a interagir na internet.  Há um porém: não necessariamente os pais viveram isso [infância e adolescência nas redes sociais]. E aí está o grande desafio. É necessário um esforço para buscar conhecimento, se interessar pelo que a criança está fazendo, saber o mínimo de como as ferramentas funcionam, quais os termos de uso dos sites e aplicativos. E ter conversas regulares com a criança ou o adolescente sobre quais são suas atividades nas redes, com quem eles estão se conectando. Geralmente, quando isso entra na conversa do dia a dia, funciona melhor do que apenas manter a vigilância.

 
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