Além de câncer, imunoterapia é testada contra o coronavírus

Tecnologia ainda encontra barreiras pois depende de pesquisa e nacionalização

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São Paulo

A imunoterapia revolucionou o tratamento oncológico ao estimular, por meio de uma gama de intervenções e medicamentos, o sistema imunológico do próprio paciente.

A partir da ação da terapia, o organismo ativa uma resposta imune que, por estar até então silenciada, permitia o crescimento do tumor.

Apesar de reconhecer a inovação da imunoterapia, Rodrigo Munhoz, oncologista do Hospital Sírio-Libanês, reforça que o tratamento não deve ser visto como uma panaceia.

Entre as limitações, está o fato de que não é todo tipo de câncer que responde da mesma forma e, por isso, a imunoterapia não exclui outros tratamentos mais convencionais, como a quimioterapia e a radioterapia.

“É fundamental que a gente module esse entusiasmo, porque os cânceres em geral ainda são uma entidade desafiadora e a gente tem uma longa estrada pela frente para amplificar os ganhos, seja com imunoterapia seja com outras estratégias de tratamento oncológico.”

Para Cristina Bonorino, imunologista e professora titular da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, o tratamento tem um fator importante que é a geração de uma memória imunológica contra o tumor.

Bonorino, porém, ressalta que, mesmo com essa terapia, o tumor pode voltar. “Isso depende de algumas diferenças genéticas do paciente e do tipo de tumor. É importante não apenas disponibilizar a terapia, mas também criar novos testes preditores de respostas.”

Apesar de iniciais, ensaios clínicos apontam a possibilidade de combater a Covid-19 com imunoterapia.
Bonorino explica que o que acontece na infecção viral é semelhante ao que ocorre no câncer já que em ambos os casos acontece uma inibição da resposta imunológica.

“Aquilo que a gente chama de inflamação ou resposta tem peculiaridades que estamos tentando destrinchar para poder recomendar a imunoterapia com segurança para a Covid”, afirma.


Veja vídeo do debate abaixo.


O tratamento oncológico por imunoterapia utiliza anticorpos monoclonais que têm como alvo as proteínas PD-1 ou PD-L1, a fim de bloquear os sinais negativos que o câncer ativa e reestimular a resposta imune do organismo.

Bonorino afirma que, no caso da Covid-19, pode ser utilizado outro tipo de imunoterapia, baseada na produção de anticorpos sintéticos a partir dos anticorpos isolados de pacientes que tiveram a infecção pelo novo coronavírus.

Ela explica que a utilização desses anticorpos seria efetiva no início da infecção já que alguns testes mostraram que, quando inseridos em um estágio avançado, o organismo produziu muitos anticorpos, e não há grandes efeitos. “Assim como há uma corrida pela vacina, há uma corrida por esses monoclonais.”

Para Rodrigo Munhoz, oncologista do Hospital Sírio-Libanês, a imunoterapia contra a Covid-19 poderia funcionar como uma faca de dois gumes.

A hipótese inicial seria a de que o tratamento poderia trabalhar a favor do indivíduo, diminuindo a gravidade da infecção pelo coronavírus.

Por outro lado, havia a preocupação frequente com o fato de que parte do dano, na Covid-19, ser devido à reação inflamatória desencadeada pela resposta do organismo.

“Se você tem essa resposta que machuca os órgãos em um paciente que já está com o sistema de defesa ativado pela imunoterapia, a evolução e o desfecho poderiam ser mais graves.”

Os debatedores, que participaram da 5ª edição do Seminário sobre Câncer da Folha, patrocinado pelo Hospital Sírio-Libanês e pela Progenética, apontaram que uma das questões essenciais da imunoterapia é disponibilizar essa tecnologia para a população em larga escala, mas o grande entrave é o alto custo.

Em agosto deste ano, o SUS incorporou, pela primeira vez, a imunoterapia para o tratamento do câncer de pele do tipo melanoma, para casos em estágio avançado não cirúrgico e metastático.

Paulo Lisboa Bittencourt, coordenador da Unidade de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Português da Bahia, pontua que, em instituições privadas, o emprego do tratamento tem sido ampliado para tumores em diferentes fases. Para ele, o alto investimento limita a aplicação no sistema público de saúde.

“Os custos desses medicamentos não estão associados à fabricação, mas à propriedade intelectual. Esse é um grande gargalo tecnológico do Brasil”, disse Bonorino.

Além do incentivo à produção científica nacional, Bittencourt recomenda acordos para redução de valor. “A gente tem que buscar a negociação para tentar conseguir um custo adequado para o cenário econômico nacional.”

P​ara Munhoz, é necessário nacionalizar os processos, dando “estímulo às indústrias que sejam capazes de replicar ou construir aquilo que hoje é feito por indústrias internacionais”. “Não temos empresa brasileira capaz de produzir e entregar esse tipo de medicamento em larga escala.”

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