Especialistas divergem quanto a parâmetros para rastreio do câncer de mama

Unânimes na defesa de hábitos saudáveis como prevenção, alguns veem risco de intervenções desnecessárias decorrentes de exames precoces e na ausência de sintomas

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Juliana Gonçalves
Londrina

No Brasil, a taxa de mortalidade do câncer de mama está na média internacional, 13 casos para cada 100 mil habitantes. Porém as mortes e a incidência têm crescido ano após ano. O Inca (Instituto Nacional de Câncer) projeta, para 2020 e os dois anos seguintes, mais de 66 mil novos casos anuais.

Para reduzir essas estatísticas, é necessário ofertar prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado.

Especialistas consultados pela Folha são unânimes em dizer que aderir a hábitos saudáveis reduz em até 28% as chances de desenvolver câncer de mama —entre os principais fatores que aumentam o risco, estão sedentarismo e sobrepeso.

Contudo, mesmo mulheres que não se enquadram nessas condições devem ficar atentas a sinais ou sintomas, como caroços palpáveis no seio ou axila, secreção nos mamilos e alterações na pele da mama.

“O risco existe pelo simples fato de sermos mulheres e estarmos envelhecendo. E a mulher precisa conhecer bem o próprio corpo para, a qualquer sinal de alerta, buscar assistência”, destaca Fabiana Makdissi, líder da Mastologia no A.C. Camargo Cancer Center.
O rastreio, que é a busca ativa de pacientes assintomáticas, também pode reduzir a mortalidade do câncer de mama, pois viabiliza o diagnóstico precoce.

O Ministério da Saúde e o Inca recomendam a mamografia de rastreio para mulheres de 50 a 69 anos, com baixo risco e sem sinais da doença, a cada dois anos.

Mulheres mais jovens também podem ter acesso ao exame pelo SUS (Sistema Único de Saúde), mas é exigido encaminhamento médico.

Já a SBM (Sociedade Brasileira de Mastologia) e a Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) indicam o rastreio anual a partir dos 40.

A justificativa é que, nesta faixa etária, as chances de malefícios, como intervenções desnecessárias ou erros de diagnóstico, são bem inferiores aos benefícios.

“Dentre as mulheres que forem desenvolver o câncer de mama, pelo menos 20% deixam de falecer por fazer o exame uma vez ao ano”, aponta o mastologista e pesquisador Ruffo de Freitas Júnior, da SBM.

Além de mais eficazes, os tratamentos em fase inicial são menos agressivos. “Pelo menos 40% dos tumores pequenos não necessitam de quimioterapia”, frisa Freitas Júnior.

Mas é baixo o número de cânceres de mama identificados pelo SUS em fase inicial. Mais de 50% dos casos são detectados em estágios mais avançados, o que também onera o orçamento público.

Dados de 2016, levantados pelo Observatório de Oncologia, apontam que, na paciente pré-menopausa, o tratamento no SUS para câncer de mama em estágio um demandou R$ 11.373. No estágio três, o custo foi de R$ 55.125.

Entre pacientes pós-menopausa, em estágio um, o tratamento custou R$ 49.488. Nos quadros em estágio três, foram investidos R$ 93.241.

A sanitarista e doutora em Saúde Pública Mônica de Assis, do Inca, confirma que o rastreio do câncer de mama pelo SUS é baixo, mesmo entre o público-alvo, por diversos entraves. Mas sugere que os riscos e benefícios do exame de imagem sejam discutidos.

“Rastreando mais, a curva de casos sobe, mas isso não implica redução da doença metastática na mesma proporção”, diz.

Ela frisa que, sem fatores de risco e sem sintomas, mulheres que realizam muitos exames ficam mais suscetíveis a tratarem lesões que não progrediriam.

Elas também podem passar por cirurgias, químio e radioterapias para eliminar tumores que não ameaçam a vida.

De 1.000 mulheres de 40 a 49 anos rastreadas para câncer de mama ao longo de sete anos, sem terem sintomas ou alto risco para a doença, 294 terão diagnóstico falso positivo.

A estimativa, feita no Canadá, prevê ainda que 43 mulheres farão biópsias sem necessidade e somente 7 terão diagnóstico correto.

“A principal questão ética na prática de saúde é não causar mal. Depois, que traga benefício. Sempre que houver uma zona de incerteza sobre riscos e ganhos, deve-se envolver a paciente para que possa, com apoio profissional, exercer sua autonomia e tomar a melhor decisão para si”, reforça Assis.

Os especialistas são unânimes quanto à importância de hábitos saudáveis na prevenção. “Precisamos pensar na saúde como forma de viver, e isso envolve políticas públicas. Devemos lembrar o papel da mulher de observar seu corpo e torná-la bem informada sobre as formas de prevenção, que vão além da mamografia”, finaliza a sanitarista.

Esta reportagem foi produzida no âmbito do Programa de Treinamento em Jornalismo de Saúde, que conta com o patrocínio do Laboratório Roche e da Rede D’Or São Luiz​.

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