Radioterapia de alta precisão torna tratamento mais efetivo, mas ainda falta versão convencional no Brasil

Abordagem personalizada permite dosar e direcionar tratamento de forma preservar tecidos saudáveis

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A fisica Tatiana Alves, 36, demonstra o equipamento Calypso para radioterapia que amplia o nível de precisão além de diminuir o numero de sessoes para o cliente do Hospital Sírio-Libanes

A fisica Tatiana Alves, 36, demonstra o equipamento Calypso para radioterapia que amplia o nível de precisão além de diminuir o numero de sessoes para o cliente do Hospital Sírio-Libanes Eduardo Knapp/Folhapress

Giulia Granchi
São Paulo

Criada há mais de cem anos, a radioterapia é um dos três principais pilares do tratamento oncológico, ao lado da cirurgia e da quimioterapia.

Estima-se, de acordo com dados de 2018 da SBRT (Sociedade Brasileira de Radioterapia), que, de cada dez pacientes de câncer, seis recebam a indicação do tratamento, que tem como a principal função destruir células cancerígenas e incapacitar sua reprodução.

Nas últimas décadas, a abordagem ganhou avanços. Enquanto a radioterapia convencional, opção realizada na maioria dos hospitais públicos do Brasil, atinge grandes volumes de tecido —prejudicando tanto células cancerígenas quanto células saudáveis—, versões com equipamentos modernos atingem os tumores com maior precisão.

As novas técnicas de alta precisão também permitem que a terapia seja programada individualmente, para o tumor de cada paciente.

Com auxílio de uma tomografia específica para radioterapia, o paciente tem seus tumores localizados em imagens tridimensionais. A partir delas, uma equipe médica especializada decide qual será a incidência da radiação, buscando sempre preservar ao máximo os tecidos saudáveis.

Essas etapas iniciais correspondem ao planejamento do tratamento, depois do que têm início as sessões de radiação, que duram aproximadamente cinco minutos cada uma —um terço da duração empregada na radioterapia convencional.

O radio-oncologista Arthur Accioly Rosa, presidente da SBRT e diretor de radioterapia do Grupo Oncoclínicas, acrescenta que, graças ao planejamento inicial, que determina com mais precisão quantas sessões são requeridas para a redução desejada, é possível fazer um acompanhamento do desempenho também mais preciso, nos exames de imagem.

A maioria dos tratamentos, do convencional ao mais moderno, se realizam com máquinas chamadas aceleradores lineares —entre elas, as que dispõem do recurso de IMRT, uma estratégia de tratamento que permite “esculpir" a dose de radiação para determinados espaços.

Outras, menos disponíveis no Brasil, como as chamadas de Gamma Knife e Cyberknife, são capazes de oferecer um tratamento personalizado e realizar radiocirurgias.

Apesar do nome da técnica e das máquinas que aludem a faca (“knife”, em inglês), a radiocirurgia não inclui corte, mas feixes de radiação.

Assim como o IMRT, a radiocirurgia permite atingir o tumor, isoladamente das áreas saudáveis, com doses muito elevadas e muita precisão —no caso precisão milimétrica, mirando um alvo bem pequeno, enquanto o IMRT pode pegar massas maiores.

Embora a radioterapia de alta precisão possa ser usada para todos os tipos de cânceres, segundo Rosa é nos tumores que respondem bem à radiocirurgia que ela é mais eficaz. Ele cita os de cérebro, coluna, pulmões, fígado, pâncreas e próstata.

Paulo Hoff, oncologista e diretor geral do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo), destaca a rapidez da tecnologia personalizada.

“Hoje, o tratamento de radioterapia convencional para câncer de próstata, por exemplo, leva ao redor de sete semanas. Usando um aparelho que permite a realização da radiocirurgia, além de aumentar a eficácia em atingir o tumor, esse tempo cai para cinco dias.”

Para aqueles que têm a indicação, o tratamento de radioterapia não é facilmente substituído por outras técnicas. A SBRT estima que 5.000 vidas sejam perdidas ao ano por falta de acesso à tecnologia – embora não seja possível garantir que todos os pacientes sobrevivessem com o método.

Mesmo o tratamento convencional não é de fácil acesso para todos os brasileiros. A OMS (Organização Mundial de Saúde) recomenda que haja um acelerador linear disponível a cada 300 mil habitantes, mas, no país, a oferta aproximada é de uma máquina para cada 600 mil habitantes.

A maioria das máquinas, especialmente as mais modernas, está à disposição do serviço privado, e alguns poucos podem oferecer a pacientes do SUS, como o Icesp e o Hospital do Amor de Barretos.

De acordo com dados de 2018 do Ministério da Saúde, o Sudeste é a região com maior disponibilidade do tratamento sem custo, com 133 máquinas à disposição do SUS. No Norte, o número cai para 9.

“Uma das razões para os números baixos é que as máquinas são importadas e o valor é em dólar. Um acelerador linear sofisticado pode chegar a custar US$ 2 milhões [cerca de R$ 10,7 milhões]”, explica Hoff.

Além disso, diz o médico, “há a necessidade do preparo dos profissionais que manusearão as máquinas e do local onde a terapia será realizada”.

Ele acrescenta que, para que tudo seja feito de forma segura, é necessária a construção de uma espécie de bunker, com paredes extremamente grossas, conforme as regras definidas pela Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear).

Na avaliação do oncologista, a falta de ampla oferta de radioterapia é um dos pontos fracos do SUS.

“Para atender a todos que têm indicação, precisaria de um número bem maior de unidades. Mesmo com a compra de máquinas pelo Ministério da Saúde, pela complexidade da instalação, o processo acaba sendo demorado.”

Esta reportagem foi produzida no âmbito do Programa de Treinamento em Jornalismo de Saúde, que conta com o patrocínio do Laboratório Roche e da Rede D’Or São Luiz​

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