Empresas devem aliar cotas femininas a plano de carreira

Ferramenta é importante para diversidade, mas precisa de plano a longo prazo

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São Paulo

Cotas são um instrumento importante para aumentar a participação feminina nas empresas, visando representatividade, mas precisam de acompanhamento a longo prazo e ações que mirem crescimento profissional.

A visão foi compartilhada pelas debatedoras do seminário Mulheres no Mercado de Trabalho, realizado pela Folha na última terça-feira (8), com patrocínio da TIM e apoio do Instituto Nelson Willians.

O evento, mediado por Ana Estela de Sousa Pinto, editora de Mercado do jornal, teve como tema as perdas que a pandemia trouxe às mulheres em questões como renda e empregabilidade.

Debatedoras durante o seminário Mulheres no Mercado de Trabalho, mediado por Ana Estela de Sousa Pinto, editora de Mercado da Folha
Debatedoras durante o seminário Mulheres no Mercado de Trabalho, mediado por Ana Estela de Sousa Pinto, editora de Mercado da Folha - Keiny Andrade/Folhapress

"Assim como acontece com outros grupos minoritários, as cotas são uma oportunidade para [a mulher] demonstrar o talento que tem", diz Claudia Massei, executiva da Siemens na Alemanha. Ela ressalva quem além de contratar mais mulheres para cargos de liderança, as organizações precisam se preocupar em desenvolver suas carreiras.

No país há quase três anos, a executiva italiana Maria Antonieta Russo, vice-presidente de recursos humanos da TIM Brasil, afirma que a presença de lideranças femininas, aliada a iniciativas de educação, pode promover mudanças importantes na cultura organizacional, que ainda tem estrutura machista. "No começo da minha carreira, quando criei referências no mundo corporativo, eram masculinas."

Dados do Global Gender Gap Report 2021, do Fórum Econômico Mundial, mostraram que a paridade de gênero no mercado de trabalho perdeu espaço no mundo todo: o tempo necessário para que a equidade salarial seja alcançada passou de 100 para 136 anos, devido aos efeitos da crise sanitária.

Para Ana Minuto, consultora especialista em diversidade, também é necessário olhar os dados com um recorte racial.

"Vai demorar o dobro quando se fala em igualdade de salários", diz, lembrando que as mulheres negras têm indicadores piores em relação a empregabilidade e renda no país.

Segundo o levantamento do IBGE Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, de 2019, as mulheres negras têm remuneração equivalente a 44% do salário pago aos homens brancos. O estudo mostra ainda que o rendimento médio mensal das pessoas brancas ocupadas foi de R$ 2.796, 73,9% superior ao das pretas ou pardas, de R$ 1.608.

Para a consultora, a diversidade em uma empresa, além de refletir a composição da sociedade, pode ampliar o número de pontos de vista da organização. Por isso é importante que existam metas de representatividade. No caso das cotas, o objetivo é que sejam transitórias.

O tempo dedicado aos cuidados com familiares e afazeres domésticos, socialmente delegados às mulheres, também interfere no desenvolvimento profissional feminino.

Uma pesquisa divulgada pelo IBGE em 2021, com dados de anos anteriores, mostra que a média de horas dedicadas a tarefas da casa e de cuidado por mulheres é de 21 horas por semana, enquanto a dos homens é de 11 horas.

Elas têm ainda menor participação na força de trabalho; 54,5% delas têm emprego, contra 73,7% dos homens.

Para Margarita Olivera, economista e pesquisadora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a pandemia acentuou ainda mais a sobrecarga das mulheres em relação à jornada dupla ou tripla.

"Mulheres têm que se dedicar aos cuidados desde criança. E são colocadas neste lugar social de que têm predisposição para cuidar. Quantas ouviram a vida inteira que elas não servem para certas áreas?"

A pesquisadora defende iniciativas de maior sensibilidade no setor privado para equilibrar essas responsabilidades, como repensar licenças e organizar cursos para mulheres e empresas como um todo.
Segundo estudo da FGV (Fundação Getúlio Vargas) de 2016, metade das mulheres que tiram licença-maternidade perdem o emprego um ano após o início do benefício.

Massei, da Siemens, chama atenção para o caso de mulheres que se afastaram do mercado de trabalho por causa da maternidade e afirma que as empresas precisam pensar em ações para reintegração.

"Focar programas para desenvolver novas habilidades, olhar para essas mulheres e concentrar nelas a chance de desenvolvimento de novas atividades."

O que disseram as debatedoras

Margarita Olivera, 43, pesquisadora da UFRJ

Economista pela Universidade de Buenos Aires e doutora em economia política, a argentina coordena o núcleo de estudos e pesquisas de economia e feminismos da UFRJ e leciona teoria econômica

Quantas [mulheres] ouviram a vida inteira que elas não servem para certas áreas?

Margarita Olivera

Claudia Massei, 38, executiva da Siemens na Alemanha

Eleita pela Forbes como uma das mais poderosas mulheres de negócios do Oriente Médio quando CEO da Siemens Omã, é engenharia aeronáutica pelo ITA e mestre em estudos internacionais pelo Lauder Institute, dos EUA

Precisamos prestar atenção em reter e promover talentos femininos

Claudia Massei

Ana Minuto, 46, consultora em diversidade 

Cocriadora do Potências Negras, evento de carreiras focado em negros, é filha de costureira e já trabalhou nos Correios. Aos 24, foi estudar tecnologia. Hoje, é formada em sistemas de informação pela FIAP, com MBA em gerenciamento de projetos pela FGV

“A tecnologia é uma das portas mais amplas para entrada no mercado

Ana Minuto

Maria Antonietta Russo, 49, executiva na TIM Brasil  

Italiana que vive no Brasil há quase 3 anos, trabalha na TIM há 20 e é coautora do livro "Mulheres no RH, Volume 2" (2021). É psicóloga pela Sapienza Università di Roma, com pós em psicologia do trabalho e das organizações

Tive uma gravidez complicada e tive medo de perder o que tinha conquistado em minha vida profissional

Maria Antonietta Russo

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