Uso do metaverso nas universidades deve se popularizar em pouco tempo

Como setor privado já adota tecnologia, escolas precisarão treinar alunos com ferramentas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Philippe Scerb
São Paulo

Quando o computador surgiu, poucos imaginavam aulas ou cursos inteiros online, com cada aluno acompanhando a exposição a partir de casa, como acontece hoje. O ceticismo em relação à difusão do metaverso como instrumento e plataforma de ensino é parecido.

Mas a redução dos custos e a percepção das vantagens que o metaverso traz deve popularizar sua utilização mais rápido do que imaginamos.

Essa é, ao menos, a opinião de pesquisadores que trabalham com esse universo no ambiente escolar, como Márcio Catapan, coordenador do curso de especialização de gestão em tecnologias 3D da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

O aluno Luiz Gutemberg Junior, 33, mestrando em gestão de tecnologia industrial, durante aula no metaverso do Senai Cimatec, em Salvador  
O aluno Luiz Gutemberg Junior, 33, mestrando em gestão de tecnologia industrial, durante aula no metaverso do Senai Cimatec, em Salvador   - Rafael Martins/Folhapress

Catapan acompanha três projetos de realidade virtual e aumentada na universidade. Um é de criação de simuladores para o treinamento de cirurgias por videolaparoscopia no metaverso. Outro desenvolve metodologias de manutenção e melhorias contínuas de máquinas, a distância, por meio de escaneamento com aparelhos 3D.

O terceiro vem da dificuldade que professores de engenharia mecânica tiveram para dar aulas práticas online na pandamia. Foram então modelados todos os laboratórios de usinagem da universidade e hoje é possível fazer o treinamento dessas máquinas usando realidade virtual.

"Ele não substitui o curso presencial, mas atende a 80% das necessidades. Assim, o tempo no laboratório diminui e serve para compilar o conhecimento adquirido em realidade virtual. Também caem os riscos do contato inicial com equipamentos".

O professor reconhece que o custo da utilização do metaverso no ensino é alto, a começar pelos óculos de realidade virtual, que custam cerca de R$ 3.000. Mas ele relativiza.

"O valor dos óculos não paga passagem de ida e volta de Manaus a Curitiba, necessária para que um aluno de residência faça treinamento em simulador tradicional de videolaparoscopia, cujo valor é cerca de R$ 2 milhões e é escasso nas regiões Norte e Nordeste."

A tendência é que o valor da tecnologia que envolve o metaverso caia. Quando apareceram, os óculos de realidade virtual custavam até U$ 100 mil (R$ 533 mil) . Hoje, nos EUA, podem ser encontrados por U$ 300 (R$ 1.599).

Para Anna Carolina Queiroz, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Stanford (EUA), as diferenças do metaverso em relação à experiência de cursos por videoconferência são consideráveis, especialmente no que diz respeito à imersão.

"É outro sentimento de presença. Quando estamos ali dentro da esfera digital, o cérebro processa como real aquilo que vimos e os estímulos que recebemos."

Queiroz dá o exemplo de uma experiência que faz em Stanford em que, na realidade virtual, um buraco é aberto no chão do laboratório e atravessado por uma tábua. As pessoas, com óculos, são convidadas a passar pela tábua. Um terço, porém, com medo, não o faz, mesmo sabendo que não há buraco real.
As pesquisas mostram, diz Queiroz, que o metaverso é uma excelente ferramenta de aprendizagem, especialmente para conceitos abstratos e de difícil visualização.

Como exemplo, ela cita o estudo que analisou o ensino sobre o desertificação dos oceanos para crianças do quinto ao oitavo ano, que não tinham fundamentos de química e física para compreendê-lo.

"Usamos um vídeo em 360º feito por pesquisadores que foram embaixo d’água para captar as imagens. Apresentamos esse vídeo em realidade virtual para crianças do ensino fundamental aqui nos EUA e comparamos com crianças que assistiram ao mesmo material, mas no computador."

A análise mostrou que ambos os grupos tiveram bons resultados em testes sobre o conteúdo. "Mas os alunos que assistiram ao vídeo em realidade virtual foram mais criativos nas respostas." Para ela, explorar visualmente o ambiente é o que faz a diferença.

Há vantagens, inclusive, em relação ao ensino tradicional. Ingrid Winkler é coordenadora da pós-gradução em gestão e tecnologia industrial do Senai Cimatec, em Salvador, onde alunos de engenharia mecânica e de produção trabalham com metaverso em algumas disciplinas.

Numa aula presencial de engenharia automotiva, por exemplo, conta ela, peças são projetadas e manipuladas em uma tela plana.

"Com a imersão da realidade virtual, trazemos a peça para a nossa frente. Eu consigo manipulá-la, olhar de baixo, por dentro, como quiser", afirma.

O uso da tecnologia nas escolas é acelerado pela sua incorporação nas empresas. Conforme o setor privado adota o metaverso em pesquisa e produção, as instituições precisam familiarizar alunos com a ferramenta, diz Ingrid.

Mestrando em gestão de tecnologia industrial pelo Senai Cimatec, Luiz Gutemberg Junior é entusiasta do metaverso no ensino superior. Ele destaca o potencial da tecnologia para a pesquisa e valoriza o efeito do uso dos óculos de realidade virtual.

"É incomparável com teleconferência. Na reunião online, você vê os outros. No metaverso, entra na reunião, é muito mais difícil de se distrair".

Queiroz alerta para a importância de saber quando usar a ferramenta. "Se a intenção é que o aluno memorize conteúdo, a aula online é suficiente. Mas, se o objetivo é promover engajamento e motivação, a imersão é bem-vinda."

Ela ainda reforça os cuidados no uso da tecnologia, pois a maneira como a experiência é desenvolvida pode surtir efeitos positivos ou negativos.

"Se a esfera digital tiver estímulos em todos os cantos, o aluno não vai saber para onde olhar e pode ficar mais distraído do que concentrado", diz.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.