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Serafina

Procurando uma porcentagem de felicidade em Portugal

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Tem de ser dito: Portugal é maravilhoso. Cultura, história, comida, clima e, sobretudo, os portugueses. Gente boa.

Sempre achei que uma das vantagens internacionais de ser português é chegar ao Brasil e entender tudo. Imagine como será o Brasil para um alemão ou para um americano. Sem entender as letras das canções, as conversas no boteco, os letreiros de publicidade na avenida, certeza que fica com uma ideia bastante diferente. O mesmo acontece com Portugal.

Lisboa se reinventa como novo polo artístico
Fado volta à moda com uma nova geração em Portugal

O final do dia nos bairros históricos de Lisboa continua com a mesma beleza comovente de dez anos atrás, as águas do Tejo continuam a faiscar uma distância de brilho. Mas, se o visitante pudesse entender os títulos dos jornais afixados nas bancas, as notícias do rádio que o taxista deixa ligado ou as conversas de esplanada, iria ter acesso a um outro Portugal. O de hoje, setembro de 2012.

A taxa de desemprego ultrapassou os 15% em agosto. Entre os jovens, o desemprego chega quase aos 37%. As medidas tomadas pelo governo obrigam os portugueses a recuos nas condições de trabalho que os colocam na posição em que estavam há mais de 30 anos. E os números ainda não pararam de aumentar. Há um ano, o desemprego entre os jovens era de menos 10%.

Perante esta situação, o primeiro-ministro (Pedro Passos Coelho, no cargo desde junho de 2011) aconselhou os jovens a emigrar.

Momento de justificada estupefação.

O conselho tem sido seguido por muitos. Várias cidades europeias, como Londres, Berlim, entre outras, são escolhas comuns para a nova onda da emigração portuguesa, que se distingue das anteriores pelo alto nível de educação e formação que possui. Há também muitos que têm escolhido destinos da lusofonia, como Angola, Moçambique e Brasil.

De um modo geral, trata-se de jovens licenciados nas mais diversas áreas, muitas vezes com pós-graduações, que passaram anos acreditando que, um dia, iriam trabalhar naquilo que estudaram. Hoje, em Portugal, com contratos muito precários, sem segurança e sem direitos, as lojas estão lotadas de sociólogos e antropólogos dobrando roupa em troca do ordenado mínimo.

Nos cubículos dos call centers, os telefones são atendidos por designers gráficos, jornalistas e outros também com excesso de formação.

No mundo da cultura, o sinal chegou quando o novo governo extinguiu o ministério e o substituiu por uma secretaria de Estado. Desde então, acabou-se quase completamente com o apoio ao cinema português, ao teatro, à dança etc.

Enquanto isso, outras áreas culturais, com indústrias mais fortes, vão tentando, pelos seus próprios meios, atravessar a tempestade de impostos, combustíveis caríssimos e baixo consumo.

Mas os artistas continuam a fazer arte. Toda a gente continua a viver. Os portugueses lutam diariamente para reverter essa situação. O que acontecerá mais cedo ou mais tarde. Com alguma sorte, talvez o primeiro-ministro emigre. Essa é a esperança de muitos, entre os quais me incluo. Em qualquer dos casos, tem de ser repetido: Portugal é um país maravilhoso.

José Luís Peixoto, 38, português e autor de "Livro" (Cia das Letras, 2010)

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