Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
Publicidade

Serafina

Rita Lobo leva leigos à cozinha e atrai legião de fãs de receitas da vida real

Mais opções
  • Enviar por e-mail
  • Copiar url curta
  • Imprimir
  • Comunicar erros
  • Maior | Menor
  • RSS

Rita Lobo ouve Rod Stewart quando está triste. Quando está feliz, ouve Rod Stewart. Esse fraco pelo astro inglês a acompanha desde a tenra infância —ela canta junto "to-das" as músicas, diz, pausadamente, e até desafina.

Bem, apesar de haver certo descompasso, essa Rita Lobo que é fã confessa do cantor pop de terno de cetim rosa e cabelo loiro espetado convive em harmonia com a boa moça que tem a magia de entrar na casa das pessoas e arrancar-lhes o medo de cozinhar com receitas infalíveis.

Eudes de Santana
Rita Lobo por Luiz Fecarotta - O despertar da louça - Com um olho no fogão e outro nos negócios, Rita Lobo conquista legião de leigos e iniciados ensinando receitas descomplicadas #serafina93
Rita Lobo conquista legião de leigos e iniciados com receitas descomplicadas

Nina Horta, a cronista na qual Rita sempre buscou inspiração (e que tentou desencorajá-la da vida na cozinha, "você é muito bonita, vai ficar com o nariz vermelho e cheia de varizes"), sabe do valor de "receitas que funcionam".

Certa vez, Nina se propôs a identificar momentos de "perfeita felicidade". Nas palavras dela, mergulhar no mar, fazer xixi quando se está muito apertado, ter uma reunião de negócios cancelada, deitar numa cama de lençóis trocados e limpos, e saber que não há necessidade de acordar cedo no dia seguinte, fazer uma receita passo a passo e tudo dar certo, bonito e gostoso.

Pois Rita Lobo, 41, autora de seis livros de culinária, com mais de 300 mil exemplares vendidos, e criadora do site e da editora Panelinha, está de olho nas pessoas que "apenas querem decidir o que fazer para o jantar numa terça-feira".

Como diabos é a maneira mais prática de cortar uma cebola? Quais são os truques para transformar o estrogonofe de hoje em molho de macarrão de amanhã? Como se faz um arroz soltinho? "Tem muita gente fazendo risoto e pouca gente fazendo arroz soltinho."

Pode-se pinçar dessa inclinação um tanto da raiz de sua campanha "#desgourmetiza, bem". Inspirada na última temporada de seu programa do canal da TV paga GNT, ganhou fôlego com o lançamento recente de "Cozinha Prática" —livro que lhe rendeu mais de 3.000 autógrafos e uma inconveniente dor no ombro, a ser tratada com acupuntura.

*

CAVALOS, CAFÉ E PLANILHAS

Rita Lobo, que se empanturrou de mascarpone na primeira vez que esteve na Itália, passou tardes na hípica com seu cavalo até os 15 anos e vive às voltas com tabelas e tabelas de Excel no trabalho, tem um capricho: toma café na cama todas as manhãs, nas mais diversas bandejas preenchidas pelo seu marido.

A paulistana, que outrora foi modelo e pôde viajar o mundo (e acumulou, com isso, o dinheiro que depois investiu em sua formação no Institute of Culinary Education, em Nova York), era chamada de "Rita feia" pelos primos quando era pequena. "Meu nome é Rita Faia [Rago Lobo] e eu era muito magra. Sabe aquele momento que você está com os dentes enormes e pernas finas?", e ri.

Aliás, tem isso: ela é sorridente —e debochada. "A Rita é uma pessoa muito elegante, mas tem um lado escrachado no dia a dia. Por exemplo, ela é uma imitadora informal", diz o restaurateur Rogério Fasano, do Grupo Fasano, que a conheceu na adolescência, quando ela tinha 16 anos.

Rita Lobo, verdade, pode ser um vendedor de cachorro-quente. Pode ser a Marta Suplicy, inclusive nos trejeitos. Pode ser a dona Ema, a senhora paranaense que trabalhou ao longo de 20 anos na casa de sua mãe.

Nos programas da TV (ou de seu canal no YouTube), ela passa certo ar clássico e contido, usa roupas de estampa florida —coisa que jamais faz do outro lado da tela; sua cor predileta é cinza e ela não tem nenhum vestido no armário, exceto um preto, "para não dizer que estou mentindo". "Até para se vestir ela é meio careta, sóbria", diz seu amigo Arthur Casas, um dos mais notórios arquitetos brasileiros.

O que Rita Lobo quer, assim, é estar perto do público e transmitir sua mais pulsante ideologia: "não existe dom divino para cozinhar" —e, o desdobramento: "quem cozinha se alimenta melhor".

Ela leva a sério a missão de ensinar. Talvez pela herança do fascínio que teve por aprender. "Eu achava que saber cozinhar era uma coisa essencial para a vida. Fiquei obcecada por aprender. A primeira vez que consegui fazer um ovo pochê achei um negócio tão fantástico que até fiquei chata, insistindo para que minhas amigas fizessem também."

A empresária, que hoje comanda editora, produtora e estúdio no "único lugar do mundo onde as pessoas levam marmita do trabalho para a casa [risos]", também é mãe de Gabriel, 13, "que só gosta de bife", e de Dora, 11, que "faz bolo sem receita" e adora louças.

A elas: o escritório de Rita Lobo, num predinho da rua Augusta na altura dos Jardins, tem uma estante apinhada de peças, garimpadas mundo afora. Ela levanta, mostra cerâmicas que trouxe do Marrocos, fala de cores e do poder que as louças têm para inspirar, seduzir e fisgar pessoas para a cozinha.

"Eu digo muito que cozinhar é como ler e escrever, todo mundo deveria saber." Bem, já está óbvio, para Rita, que as pessoas devem fazer sua própria comida -e não devem usar cubinho de caldo pronto, "a porta do inferno".

*

PORCO FESTIVO

Em sua casa também não entra peru —nem no Natal. "Não acho mais peru sem tempero pronto. Não é um boicote, é apenas um manifesto: eu não como tempero pronto." Pois Rita elegeu, então, o porco como a carne de comemoração do brasileiro.

E é ela, a carne de porco, que vira estrela de um tanto de receitas que vem publicando em seu "Panelinha", no qual está armada uma operação de guerra para as festas de fim de ano, a época em que o site, "quase uma mãe que sabe cozinhar muito bem e dá todas as dicas para a filha preparar um Natal", é mais acessado.

São preparos como lombo recheado com banana-da-terra, pernil de forno —"coitado do forno, não para de trabalhar no Natal, então pensamos também em opções que não precisam de forno", como o lombo com batata-doce e molho de laranja, em uma panela só.

Aliás, sobrou peru, tender? O que fazer? "No meu blog tem um monte de posts que ensinam o que fazer com as sobras no dia seguinte. É um clássico, tudo pode ser reciclado, não precisa ser requentado."

*

POUCO E DE TUDO

Rita Lobo já teve restaurante, o Oriental, nos Jardins, em São Paulo. E o que a atrai em um restaurante? "Nada", e ri. "Não gosto de lidar com público, não gosto de trabalhar à noite, não gosto de treinar a mão de obra. Porque está tudo certo e, de repente, o garçom está no salão com o dedo no nariz e aí acabou, acabou."

Na área há 20 anos, já passou por tudo quanto é sorte de modismos: o tomate seco, o cupcake, o "sem glúten". E, no final das contas, o que ela quer mesmo é comida fresca e caseira. "Na minha casa, por exemplo, sempre tem uma lata de grão-de-bico na despensa. Porque tem um fim de semana que a gente está com preguiça e a lata de grão-de-bico já vira um homus. Existem uns atalhos de coisas que não são ultraprocessadas e que ajudam no dia a dia da cozinha, mas não atrapalham a saúde."

E Rita gosta de comer. Come pouco e de tudo. "Quando todo mundo fica preocupado em comer saladinha, espuma, ela gosta de comer de verdade. É a nossa Nigella", diz Rogério Fasano, com quem já dividiu a mesa umas tantas vezes. "E eu tenho uma teoria. Quem come de verdade tem muito mais senso de humor." O amigo Arthur Casas compartilha: "A Rita? É uma palhaça".

Ao falar, puxa o "r", bem caipira, porque acha mais gostoso —"não é uma delícia?". Ela adora sotaques diferentes. Às vezes, inclina prum carioquês, "quando eu vejo, estou com as minhas amigas cariocas falando assim. É mais forte do que eu. Sei lá, deve ser falta de personalidade", diz, rindo.

Pelo contrário, afirmam os amigos, Rita Lobo é uma mulher independente e trabalhadora. Gosta de ler —"sou desse tipo que vai chegando o finalzinho de um livro bom e eu começo a ler beeem devagariiinho, para não acabar". Gosta de escrever —"acho bem difícil escrever; fiz aula particular de gramática por dois anos, sou muito obsessiva".

A cozinheira e mãe e empresária e mulher tinha uma coluna de receitas na "Revista da Folha" (hoje sãopaulo) nos anos 1990, e lançou o site Panelinha em 2000, em uma época em que se lembra de ligar o computador, fazer a conexão discada com a internet, ir até a cozinha passar um café, voltar e encontrar os e-mails ainda a caminho.

Tem mais isso: Rita Lobo é viciada em café. Isso desde a temporada em que foi estudar francês em Paris, aos 19 anos —ela também passou períodos prolongados no Japão, na Itália e nos Estados Unidos.

Quando voltou de Nova York formada em gastronomia, chorava ao ler "Não É Sopa", primeiro livro de Nina Horta. Aprendeu até a recitar trechos.

"Ela é extremamente esforçada", diz Nina, a cronista, sobre a pupila que tanto tentou afastar da cozinha. "Não sabia cozinhar. Claro que ela foi aprendendo, mas se você repara no programa dela, ela sabe umas coisas que você fica boba. Ela sabe que se você vira a cebola pra cá é mais fácil de cortar. Você já viu, já prestou atenção?"

Mais opções
  • Enviar por e-mail
  • Copiar url curta
  • Imprimir
  • Comunicar erros
  • Maior | Menor
  • RSS

Livraria da Folha

Publicidade
Publicidade
Publicidade
Publicidade

Envie sua notícia

Siga a folha

Livraria da Folha

Publicidade
Publicidade
Voltar ao topo da página