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Serafina

Por que o pintor Shag, autor do mapa-múndi de drinques, parou de beber

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Três estátuas Tiki, réplicas dos moais da Ilha de Páscoa, recebem o visitante na porta da casa do artista Josh Agle, num bairro bucólico de casas luxuosas em Orange County, Califórnia. Ele abre a porta com um sorriso e parece um desenho animado. Sinto-me pronta para uma tarde regada a "mai tais" e outros drinques tropicais. Mas Josh oferece apenas água. E numa garrafinha de plástico.

O nome Josh Agle pode ser um mistério para a maioria das pessoas, mesmo para aquelas que ostentam suas pinturas e ilustrações pop-retrô-kitsch na parede de casa. Por muitos anos, ele se escondeu atrás de seu apelido, Shag -união das duas últimas letras de seu primeiro nome e as duas primeiras do sobrenome.

Flavio Scorsato
O Pintor californiano Shag

O Shag de carne e osso só começou a dar as caras nos final dos anos 2000, quando diz ter percebido que as pessoas queriam saber mais sobre sua vida e se ele era, de fato, como um personagem de suas obras.
"Aparecer mais trouxe um valor extra a meus trabalhos, não sei bem por quê", diz Josh/Shag, sentado numa poltrona egg laranja de Arne Jacobsen, que já fez muitas aparições em seus cenários futurísticos e sessentistas. "Tenho muito a ver com meus personagens. Especialmente quando estou bebendo."

Shag
Mapa-mundi dos drinks, por Shag
Mapa-múndi dos drinques, por Shag

Mas o californiano parou de beber faz dois anos, e é com água que me refresco, de olho no armário da sala que expõe suas mais de 300 canecas Tiki, colecionadas desde a juventude como souvenir dos bares de decoração polinésia no sul da Califórnia, como o Tiki Ti e Tonga Hut, em Los Angeles, e o Don The Beachcomber, na Sunset Beach.

"Viajo bastante, socializo muito, estou sempre saindo com meus amigos. E bebia demais", lembra, explicando que está apenas dando um tempo do álcool. "A bebida estava interferindo no meu trabalho. Ficou mais importante do que pintar. Eu dava um monte de festas aqui em casa. Amo 'cocktail parties'", diz, completando que seu drink favorito é o Singapore Sling, à base de gim.

Apesar de aparecer mais, o artista tenta manter uma certa reserva. Só em 2015 aderiu finalmente a uma rede social, o Instagram (@theartistshag). "Parte do valor da arte é o mistério que ela traz", diz Josh, que foi um dos primeiros artistas do mundo a ter uma página on-line, em 1996 (shag.com).

Josh, 53, é casado com uma diretora de teatro, com quem tem dois filhos, uma de 17 e outro de 13. É o mais velho de nove irmãos, criados numa família de mórmons. Passou os primeiros oito anos de vida no Havaí, antes de se mudar para Utah e, depois, para a Califórnia, onde estudou arquitetura e depois contabilidade, em Long Beach.

No fim, acabou se formando em artes plásticas. Na época, meados dos anos 1980, tocava numa banda de folk punk e fazia ilustrações para gravadoras e revistas, trabalho que manteve por quase dez anos. "Era recém-casado e não tinha grana. Comecei a pintar as coisas que eu queria fazer, pessoas com quem queria estar, cadeiras que queria ter", diz Josh, que passou a misturar estilos Tiki e design modernista com referências publicitárias dos anos 1950 e 60.

Nem sempre suas obras foram divertidas, cheias de cor e baladas. Lá por 2008, Josh se viu entediado com suas pinturas e iniciou uma fase negra, cheia de mensagens subliminares e demônios pessoais. "Sentia que estava pintando para outras pessoas, sabia o que elas gostavam, o que ia vender, estava fazendo uma grana boa, mas... Estava cansado. Queria pintar só para mim, não ligava se fosse vender ou não. Fiz isso por três anos."

Linha do tempo - Shag

A recepção foi boa, ainda que alguns fãs tenham ficado chateados. Um acidente quase mortal o fez reavaliar sua produção novamente: ele tinha acabado de voltar da Inglaterra, estava mal de "jet lag" e resolveu começar a beber às 11h, após passar a noite pintando. Quando viu, acordou no hospital, onde ficou por quatro dias. Ele havia caído do janelão de vidro da sala.

"Meus quadros estavam profundos demais. Olhando em retrospectiva, outros artistas já faziam algo parecido. Resolvi voltar ao que sabia fazer de melhor, o que era único e que estava negligenciando: os clássicos Shags", diz. "O acidente me fez querer voltar ao mundo de Shag que eu queria tanto habitar no começo da carreira", conta.

Josh realiza apenas duas exposições por ano para não inundar o mercado com suas obras e para manter os colecionadores felizes -entre os famosos estão Whoopi Goldberg, Ben Stiller e Nancy Sinatra. O mesmo faz com os produtos que levam seus desenhos.

Se antes Shag era quase como um Romero Britto, com suas ilustrações decorando centenas de pratos, cartões de aniversário e toalhas, hoje pode ser até difícil de achar alguns desses produtos. Criações antigas, como a série que produziu para o brinquedo "Haunted Mansion", da Disney, são agora consideradas raridades. No momento, segundo ele, seus desenhos estampam cerca de 40 produtos de linha própria.

Novidades são lançadas apenas em suas duas lojas: a primeira foi aberta em 2010 em Palm Springs, onde o artista tem outra casa, que dizem ser uma cópia de suas pinturas. A segunda abriu em 2015, em Los Angeles. Em ambas, estão à venda pinturas de US$ 50 mil e serigrafias de US$ 150, além de almofadas por US$ 75 e conjuntos de copos por US$ 50.

"No começo, era legal ver minha arte num guardanapo de coquetel, num isqueiro. Mas depois deixou de ser cool. Estava ficando superexposto e parei de renovar as licenças", diz. "Agora faço coisas em edições mais limitadas, que ganham mais valor e são mais desejáveis."

Josh já fez exposições em galerias do mundo todo, incluindo em São Paulo, em 2010, na Choque Cultural. "Acho que caipirinha foi a única coisa que tomei durante todo o tempo", conta, rindo. E também se apresentou em alguns museus, como no Andy Warhol Museum, de Pittsburgh. Ainda assim, pensa que não é levado a sério no mundo da arte.

"Há quem acredite que meu trabalho pertence à história da arte, mas acho que a elite artística discorda. Por enquanto. Talvez isso não aconteça enquanto eu estiver vivo", acredita. "Dizem que se você trabalha por bastante tempo e tem sucesso, você vira uma instituição. É o que tento fazer."

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