Serafina
Colunista denuncia restaurante que tem imagens de escravos nas paredes
Já estamos tão acostumados com a inferiorização do negro que enxergamos com naturalidade certas aberrações vistas por aí. Em uma passagem recente para palestrar por Londrina, descobri o tradicional restaurante O Casarão, aberto há 54 anos. Ao entrar, fiquei chocada: nas paredes havia reproduções gigantes de obras do pintor francês Debret (1768-1848) exibindo homens e mulheres escravizados e sem dentes servindo os brancos.
Imediatamente me lembrei da polêmica envolvendo a grife Maria Filó, que em 2016 lançou peças com estampas do mesmo pintor retratando a escravidão no Brasil. "Sendo uma pessoa negra, encontro racismo todo dia, mas esse é muito evidente. O que me deixou mais chocada é pensar em quantas pessoas acharam normal essa estampa", disse à época a funcionária pública Tâmara Isaac, que se deparou com as roupas em uma loja da marca no Rio.
Incomodada com as imagens, perguntei ao dono do restaurante se, caso ele fosse judeu, ficaria confortável fazendo uma refeição em um lugar chamado Auschwitz ou Holocausto, cercado de imagens dos campos de concentração. Ele justificou que era apenas uma homenagem a Debret.
Giulia Bianchi | ||
Ilustração de Giulia Bianchi para a coluna de Alexandra Loras da edição de novembro de 2017 da Serafina. |
A sensibilidade e a empatia inexistem quando se trata da dor do negro. Basta uma pesquisa rápida na internet para encontrar vários restaurantes Senzala pelo Brasil.
Um deles fica em São Paulo, em Alto de Pinheiros, bairro nobre, e foi alvo de protestos, quando um grupo de militantes negros colocou máscaras de ferro e correntes nos pés para protestar.
Na lista de atentados à história do negro a criatividade é ilimitada. Na antiga fazenda cafeeira Santa Eufrásia, em Vassouras (RJ), a escravidão era atração turística: os visitantes eram servidos por funcionários negros vestidos de escravos. Após uma reportagem do "Intercept Brazil", os donos baniram as encenações em maio, em acordo com o Ministério Público Federal.
E o que dizer do motel Senzala, em Porto Alegre, com suítes batizadas de Quilombo, Escrava, Casa Grande e referências explícitas ao sofrimento dos escravos? "Tudo é cuidadosamente planejado para que os momentos se tornem únicos. Há suíte com grilhões, jaula e correntes", informa o site.
Em outros países, manifestações explícitas de racismo seriam consideradas criminosas e punidas como tal. No Brasil, a lei que classifica o racismo como crime inafiançável e pune com prisão de até cinco anos é pouco aplicada. Enquanto isso, o fantasma do negro da senzala permanece entre nós.
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