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Você passaria no 'teste de honestidade'?

Na tentativa de evitar fraudes e delitos, empresas estão solicitando que profissionais passem por testes de ética e integridade. Os processos prometem revelar o quanto cada um é flexível ou resistente em situações de suborno, gratificações indevidas e uso de informações sigilosas, entre outros atos ilícitos.

Os testes são usados tanto para selecionar novos colaboradores quanto para conhecer melhor os funcionários já contratados e treiná-los de acordo com os valores éticos da companhia.

Os exames não são obrigatórios. No entanto, raramente alguém se nega a fazê-lo.

Bruno Santos/Folhapress
Luiz Manzano, 28, diretor de apoio a empreendedores da Endeavor, que aplica os testes de integridade há dez anos
Luiz Manzano, 28, diretor de apoio a empreendedores da Endeavor, que aplica os testes de integridade há dez anos

Aplicados por consultorias especializadas, os processos variam segundo a metodologia de cada uma. De modo geral, são individuais e contam com questionários dissertativos e de múltipla escolha. Cada pergunta tem um tempo para ser respondida, mais curto ou longo, de acordo com a complexidade.

Há desde questões como "o que você faria caso lhe convidassem para participar de algum esquema de fraude?"; "você já alterou números ou resultados de uma empresa?" e "você já precisou oferecer um suborno e por quê?" até as que extrapolam o âmbito profissional.

O funcionário pode precisar responder, por exemplo, se usou drogas nos últimos meses ou se devolveria o dinheiro em um troco errado.

No modelo da S2 Consultoria, os questionários são respondidos diretamente pelo profissional em um computador. Há perguntas que exigem a resposta gravada em vídeo, uma forma de avaliar a linguagem corporal e identificar possíveis mentiras.

A Randon avalia seus gerentes-executivos e diretores sob o teste de integridade há dois anos, como parte do programa de compliance.

Daniel Ely, 43, diretor corporativo de planejamento e RH da empresa, diz que havia uma desconfiança inicial por parte dos funcionários, coisa superada depois de a empresa mostrar que os resultados não tinham o objetivo de retaliar, mas de trazer dados para que a companhia pudesse reforçar suas práticas de integridade com treinamentos e orientações.

"Eu me senti superconfortável", diz Ely, que passou pelo processo, realizado pela consultoria Protiviti, em 2016.

O teste é composto de questionário de múltipla escolha e entrevista presencial, na qual um avaliador se aprofunda em temas identificados como críticos no processo.

Nessa metodologia, o resultado é um gráfico que aponta se o profissional tem baixa, média baixa, média, média alta ou alta flexibilidade em assuntos como transparência e percepção moral.

Editoria de Arte/Folhapress

NÃO É RÉGUA

Antonio Hencsey, líder da prática de ética e compliance na Protiviti, diz, no entanto, que o resultado não deve servir de régua para demissões ou contratações.

"Somente 16% da população tem baixa flexibilidade nessas questões. Seria impossível contratar apenas pessoas assim ou teríamos 84% de desempregados", afirma.

"O processo oferece informações sobre como trabalhar a flexibilidade dentro do contexto de cada empresa. Por exemplo, um diretor financeiro de média alta flexibilidade, experiente, que vai trazer resultados, mas que achava normal manipular resultados no outro local onde trabalhava. Nesse caso, o contratante pode optar por criar controles para que ele não manipule", diz Hencsey.

A Endeavor, instituição de apoio ao empreendedorismo, utiliza os testes há dez anos na etapa final de seleção dos novos empresários que farão parte da sua rede.

Segundo Luiz Manzano, 28, diretor de apoio a empreendedores da organização, o processo, sozinho, não funciona como critério de exclusão, mas ajuda a corroborar suspeitas de desvios éticos que tenham surgido ao longo do processo de seleção.

"Serve como instrumento de apoio, aponta o grau de risco", diz Manzano. Ele afirma eliminar de 5% a 10% dos candidatos por problemas relacionados a integridade.

LAVA JATO

Segundo as consultorias, a Operação Lava Jato e as denúncias de corrupção contra grandes corporações criaram um ambiente propício para que as empresas discutissem e implementassem de fato seus códigos de ética e programas de compliance. Com isso, cresceu a procura por testes de integridade.

"Entre 2012 e 2016 tivemos um crescimento de 147% no número de clientes, ultrapassando o total de 360 empresas", afirma Hencsey, da Protiviti, que aplica esses processos desde 1999. Na S2, houve um crescimento na demanda de 25% ao ano desde a sua criação, em 2014.

Cada processo custa entre R$ 250 e R$ 2.730 por pessoa, dependendo da consultoria e do cargo do avaliado.

"As posições mais demandadas são das áreas de suprimentos, finanças, marketing, operações e também as que lidam com informações confidenciais, como secretárias de executivos", diz Renato Santos, sócio da S2.

Diretores, tomadores de decisão e pessoas que estão em contato com agentes públicos também lideram a lista na hora de a empresa escolher quem será avaliado. Os testes são adaptáveis segundo cargos e áreas de atuação.

Na rede de restaurantes Pobre Juan, os testes são usados desde 2015. São aplicados logo depois da contratação do funcionário, assim, não servem como filtro de seleção.

"Os resultados me ajudam a aplicar melhor o nosso código de conduta. O teste aponta a falta de entendimento do profissional em pontos como conduta, caráter e resiliência", diz Glauco Moreno, 33, responsável pelo departamento de recursos humanos dos restaurantes.

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