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Quando desistir do trabalho dos sonhos é a melhor opção

Muitas vezes é melhor desistir de um plano de carreira do que teimar em fazer algo que está dando errado só porque era um sonho antigo.

"Muito se fala que você pode ser o que quiser, é só se esforçar. Mas isso não é verdade", diz Eduardo Ferraz, consultor de gestão de pessoas.

Para explicar isso, ele usa a comparação feita pelo economista James Heckman, vencedor do Nobel de Economia de 2000, para definir a personalidade de um adulto.

"É como um prédio. A gente pode fazer um monte de reformas e trocar os móveis de lugar, mas não consegue mudar a estrutura", afirma.

Para ele, não adianta uma pessoa introvertida tentar se tornar extrovertida, porque é uma característica estrutural.

"O introvertido pode trabalhar melhor com processos do que com pessoas. Então, o que proponho é aproveitar 80% do tempo para melhorar o que você já tem e 20% para desenvolver aquilo que não tem", diz Ferraz.

Segundo Tania Casado, coordenadora da pós-graduação em consultoria de carreira da Fundação Instituto de Administração, a pessoa pode ser o que quiser, mas dentro de suas possibilidades.

"É melhor tirar proveito das suas aptidões do que se forçar a ser o que não é", diz ela, que também é docente da Universidade de São Paulo.

ROTA ADAPTADA

É claro que ambições podem levar o profissional para um caminho que o obrigue a lutar contra o seu perfil.

Mas, segundo a psicóloga Leni Hidalgo, professora de gestão de pessoas do Insper, na maioria das vezes, o esforço que ele terá que fazer para superar suas fraquezas pode anular suas qualidades.

Por exemplo, uma pessoa que gasta um tempo enorme para tentar ser mais organizada em vez de desenvolver a criatividade, que é seu ponto forte. "E aí ela acaba se tornando medíocre", diz ela.

Nem sempre é possível estar num trabalho que permita explorar todos os talentos do profissional. Aí, o que resta é saber interpretar o ambiente e usar suas ferramentas para se adaptar a ele.

Mesmo assim, se a pessoa tiver que sufocar características importantes da sua personalidade por muito tempo, talvez seja melhor buscar uma nova colocação. "Senão, ela vai entrar numa zona de sacrifício", diz Hidalgo.

Marcus Leoni/Folhapress
A farmacêutica e coach Amanda Martins, 27, na clínica em que trabalha, na zona norte de SP
A farmacêutica e coach Amanda Martins, 27, na clínica na zona norte de SP

CARREIRA EXECUTIVA

Formada em farmácia, Amanda Martins, 27, tinha o sonho de ser executiva em uma grande indústria. Na faculdade, conseguiu estágio em uma multinacional e, em seguida, foi contratada.

Por cinco anos, trabalhou no setor administrativo, lidando muito mais com papéis do que com gente. "Apesar de ser uma área burocrática, insisti porque achei que tinha que passar por aquilo", afirma ela, que sempre valorizou o contato humano.

Cursou pós-graduação em gestão de pessoas para tentar uma transferência de departamento, mas não conseguiu. Também conversou com colegas de empresa e viu que, em outras áreas, o trabalho não seria muito diferente daquilo que ela fazia.

Então, começou a sofrer crises de ansiedade e acabou pedindo demissão para se recuperar. Nesse período, fez um intercâmbio na Austrália para aprimorar o inglês.

Lá, passou por um processo de coaching e percebeu que seu talento era justamente o contato com as pessoas. "Fui descobrindo com o que me conecto de verdade", diz.

Mesmo assim, quando retornou ao Brasil, a primeira coisa que fez foi mandar currículos para indústrias farmacêuticas. "Queria muito ser executiva. Tinha a questão do ego, da estabilidade financeira e do status."

Foi um novo processo de coaching que a ajudou a desapegar dessa ideia e investir na sua maior aptidão, que é o relacionamento direto com o público. Depois de fazer um curso, ela mesma se tornou uma profissional dessa área.

Há um ano, atua como coach que trabalha com desenvolvimento de crianças. Ela conta que o começo na nova profissão foi difícil, mas hoje já está com a agenda cheia. "É isso que me encanta."

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Autoanálise é essencial para definir rumo

Investir em autoconhecimento é fundamental para que o profissional entenda como pode explorar melhor suas características e descobrir de fato o que deseja.

"Muitas vezes, o que acontece é que as pessoas acham que querem determinadas coisas, mas estão olhando do ângulo do vizinho, e não do delas", afirma Tania Casado, coordenadora da pós-graduação em consultoria de carreiras da FIA (Fundação Instituto de Administração).

"Todo o trabalho de autoconhecimento deve ser pela busca do seu diferencial, aquilo que pode usar como um ponto de alavancagem", diz a psicóloga Leni Hidalgo, professora de gestão de carreiras do Insper.

Para se conhecer melhor, o profissional pode recorrer à ajuda especializada –de um consultor de carreiras, coach ou psicólogo– ou fazer uso de testes, auto-observação e feedbacks.

Como um bom exercício, Casado recomenda que o profissional entregue um papel para diferentes pessoas que fazem parte da sua vida –chefe, cônjuge, familiares, amigos e colegas de trabalho, por exemplo.

Então, elas devem escrever quais comportamentos o indivíduo deve parar, começar e continuar a fazer. "Quando comparar o resultado, vai ver que cada pessoa, na sua arena, falou sobre coisas semelhantes. Essa é um forma excelente de autoconhecimento", diz.

Além disso, também é importante traçar um plano de carreira. De acordo com Fernando Mantovani, diretor-geral da consultoria Robert Half, o profissional deve saber aonde quer chegar e traçar uma "escada", buscando quais competências técnicas e comportamentais são necessárias para alcançar cada degrau.

Isso ajuda a se programar e ver se de fato o caminho a trilhar é viável. "Às vezes nunca foi, mas, como a pessoa não olhou isso lá atrás, criou expectativa", diz.

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