Geração Z prefere home office, mas sente falta do contato presencial

Jovens gostariam que ida ao escritório fosse possível, mas não obrigatória

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São Paulo

O retorno ao escritório após quase dois anos de trabalho remoto tem deixado os jovens da geração Z divididos. Se, por um lado, eles sentiam falta de ter uma comunicação próxima com a equipe, por outro, gostariam de continuar tendo flexibilidade para trabalhar em qualquer hora e de qualquer lugar.

Maria Carla, 24, é líder do time de experiência do cliente na Fluke, empresa de operadora móvel digital, desde julho de 2020. A companhia decidiu manter os funcionários em home office, mas deixa em aberto a possibilidade de trabalhar presencialmente para quem tenha interesse.

Para ela, que mora em Juiz de Fora (MG), esse modelo é ideal porque permite que continue trabalhando sem precisar se deslocar para outro estado —a empresa fica em São Carlos (interior de São Paulo).

Jovens gostam do home office pelo conforto de trabalhar em casa e pela flexibilidade de horário
Jovens gostam do home office pelo conforto de trabalhar em casa e pela flexibilidade de horário - Adobe Stock

No entanto, por sentir falta de se comunicar com sua equipe, Maria combina de ir algumas vezes à empresa.

"A interação com pessoas é por meio de telas, seja no celular ou no notebook. E eu, particularmente, sou uma pessoa que gosta muito de contato físico, então o meu principal objetivo ao vir para a empresa foi conhecer e abraçar as pessoas com as quais eu trabalho há um ano e meio", diz.

Para superar a falta de contato, a Fluke está organizando encontros esporádicos com o intuito de reunir os funcionários presencialmente. Segundo Maria, a equipe já tem uma reunião marcada para março de 2022.

Um estudo do LinkedIn de 2021 sobre a percepção dos jovens da geração Z —de 16 a 24 anos— em relação ao mercado de trabalho e os possíveis impactos da pandemia mostra que 72% desses profissionais sentem que o trabalho remoto prejudicou o desenvolvimento e o aprendizado de habilidades comportamentais.

A pesquisa foi feita com mil profissionais que trabalhavam presencialmente, mas tiveram que se adaptar ao home office por conta das restrições da pandemia.

Uma das habilidades que mais teriam prejuízo com o home office seria a comunicação, citada por 62% dos entrevistados.

Para Pietra Bertonha, 22, representante de desenvolvimento de vendas na Alice, startup de saúde, essa falta de comunicação com a equipe foi o que levou a empresa a pensar em uma forma de manter o contato mesmo a distância.

"Nós fazemos chamadas de vídeo o tempo todo. Então, a gente se comunica pela plataforma e permanecemos em reunião como se estivéssemos juntos [presencialmente]", diz.

Além disso, ter essa proximidade ajudou Pietra nos primeiros dias do emprego. Segundo ela, com esse recurso fica mais fácil tirar dúvidas com seu gestor de maneira pontual.

Embora sinta falta do contato presencial, Pietra prefere o home office, porque ela vive em Dobrada (a 320 km de São Paulo) e a empresa onde atua está em São Paulo. Assim, trabalhar em casa é mais confortável e econômico.

Na pesquisa do LinkedIn, a segunda habilidade comportamental que teria sido prejudicada pela pandemia, segundo os jovens, foi inteligência emocional (48%).

Para Laura Kroeff, vice-presidente da Box1824, consultoria de tendências que estuda comportamentos emergentes na sociedade, a geração Z já tem uma certa dificuldade de lidar com as emoções.

"O isolamento social para eles foi um choque muito grande. É uma geração que está exposta às redes sociais desde muito cedo", afirma.

Sara Anjos, 21, assistente de análise na Empiricus, empresa especializada em conteúdo financeiro, ficou seis meses trabalhando em casa. Nesse período, enfrentou questões que atrapalharam sua qualidade de vida.

"Afetou minha saúde mental e física. Tive problemas sérios de deficiência de vitamina D, porque eu ficava muito tempo no quarto e não tomava sol. Além disso, a gente perde a capacidade de ter interações sociais e ficamos com medo. Eu senti mais ansiedade por não saber como vai ser [o futuro]", diz.

Atualmente, Sara está no modelo híbrido —vai ao escritório de duas a três vezes por semana— e está gostando. "No fim da semana você não está tão cansado como estaria se tivesse vindo a semana inteira e também não está tão improdutivo como estaria se tivesse a semana toda trabalhando em casa."

O estudo do LinkedIn também mostrou que 7 em cada 10 jovens da geração Z acreditam que a pandemia pode interferir no crescimento da carreira.

Alguns profissionais já estão vivenciando esse impacto por não conseguirem fazer networking, ou seja, ter uma rede de contatos.

Sofia Levy, 24, estrategista de marca na Neon, startup na área de finanças, está em home office desde fevereiro de 2020. Após um ano trabalhando em casa, sente esse prejuízo.

"Você não conhece ninguém fora da sua equipe. Não pode tomar um café e conhecer uma pessoa de outra área que vai falar ‘nossa, que negócio legal, porque que eu não pensei em fazer isso?’. Se eu quiser mudar de carreira agora para algo que brilhe meus olhos, tenho que ter contato com outros profissionais", diz.

Para Leonardo Berto, especialista em carreiras da Robert Half, empresa especializada em recrutamento e seleção, o impacto da falta de contato presencial pode ser maior para jovens em início de carreira ou para quem mudou de emprego durante a pandemia.

"Há um choque na adaptação. O jovem precisou aprender por conta própria e trabalhou mais sozinho. Em um ambiente remoto você não tem a percepção de cultura de valor [da empresa]. Por isso, o impacto é mais nessa questão de adaptação e comportamento."

Segundo ele, tanto o modelo remoto quanto o híbrido exigem do profissional mais planejamento, organização, capacidade de priorização e delimitação de tarefas.

Apesar da Neon permitir que os funcionários trabalhem de forma presencial, Sofia não se vê voltando tão cedo ao escritório e prefere manter o home office.

"Eu posso fazer a minha terapia online e depois entrar em uma reunião, sem precisar me deslocar. Você tira o pijama e coloca uma roupa mais confortável, pode tomar seu café da manhã e sentar pra trabalhar mais tranquilo. É uma liberdade de organização e uma possibilidade de se priorizar."

Seu colega de empresa, Wellinton Vieira, 23, analista de CRM (área de relacionamento com o cliente), também enxerga vantagens após quase dois anos trabalhando em casa.

"Eu consigo me preparar de manhã no dia de trabalho e tenho o conforto de conviver com a minha família. Então, por exemplo, o horário do almoço é mais tranquilo e me sinto mais produtivo por conta do tempo de descanso que tenho na noite anterior, por isso fico mais disposto para começar a rotina do trabalho", conta.

Com o gosto dos jovens pelo trabalho remoto e híbrido, empresas que não aderirem a esse formato podem sofrer com a perda de candidatos.

"O futuro [do trabalho], sem dúvida, é híbrido, mas enxergamos algumas empresas mais propensas que vão tomar essa direção de forma natural. Já as mais tradicionais vão demorar um pouco mais para entender. Por isso, vem o papel do jovem que vai impactar na competitividade, pensando na atração de talentos", diz Kroeff.

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