Empresas buscam garantir ascensão na carreira para quem trabalha a distância

Companhias desenvolvem programas para driblar falta de visibilidade e de networking

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Corinne Purtill
The New York Times

Durante seu estágio em um grande banco na metade do ano passado, Costa Kosmidis passou a maior parte de seu tempo trabalhando remotamente.

O banco fez o máximo que podia para ajudar os estagiários a superar a distância, diz ele, o que incluiu adotar uma política de portas abertas virtuais que colocava pessoas importantes da hierarquia à disposição deles para consultas rápidas por telefone e email sobre questões de trabalho e conselhos de carreira.

Mesmo assim, quando Kosmidis, 22, começar a trabalhar para o mesmo banco depois de se formar na Universidade Fordham, em Nova York, neste ano, ele espera passar mais tempo no escritório.

"É mais fácil sentir a energia das pessoas quando você está próximo a elas", diz Kosmidis. Descobrir se alguém está disponível, por exemplo, é mais complicado se você está longe.

"No escritório, basta um olhar, mas online você não sabe o quanto a pessoa pode estar ocupada naquele momento."

Empresas com modelo home office contam como valorizam os empregados que não estão trabalhando no escritório - Unsplash

O trabalho remoto muitas vezes é preferido por funcionários já estabelecidos, que conhecem seus chefes, se sentem confortáveis quanto aos seus papéis e buscam um equilíbrio entre o trabalho e obrigações familiares ou outras responsabilidades pessoais.

Para aqueles que estão só começando suas carreiras, trabalhar isolados pode tornar mais difícil a incorporação a uma companhia —e, com isso, subir na hierarquia.

As empresas se tornaram muito mais abertas ao trabalho remoto durante a pandemia. Agora, enquanto planejam como o trabalho será no futuro, elas estão prestando mais atenção ao que significa construir uma carreira sem as oportunidades tradicionais de networking, os mentores e a visibilidade que acompanham o trabalho em tempo integral em um escritório físico.

Alguns de seus empregados também estão pensando mais sobre o que o trabalho remoto ou híbrido pode significar em seu futuro.

"Estamos começando a receber opiniões de empregados, especialmente entre os mais jovens, que —acredite se quiser— parecem estar preocupados", diz Johnny Taylor Jr., presidente da Sociedade de Gestão de Recursos Humanos.

Prithwiraj Choudhury, professor associado na Escola de Administração de Empresas da Universidade Harvard, cujas pesquisas se concentram na mudança da geografia do trabalho, diz ter encontrado três práticas comuns entre as empresas que administraram o trabalho remoto com sucesso.

Elas dedicaram tempo a compilar informações e práticas em um manual ou guia que os empregados possam consultar em qualquer lugar; estabeleceram mentores para quem está trabalhando a distância, para que eles possam conversar com franqueza sem colocar em risco os relacionamentos dentro de uma equipe de trabalho; e criaram o que ele define como uma área virtual do cafezinho.

Em um estudo, Choudhury e seu colegas escolheram aleatoriamente alguns estagiários de um grande banco internacional para participar de conversas pessoais em vídeo com executivos importantes.

Outros fizeram reuniões virtuais com colegas estagiários, e alguns não participaram de reuniões adicionais. Aqueles que tiveram a oportunidade de conversar com colegas em posições superiores receberam avaliações de desempenho melhores ao final do estágio e a probabilidade de que recebessem propostas de emprego era mais alta.

Administrado efetivamente, o trabalho remoto pode conduzir a conversas mais profundas, diz Choudhury.

"Quando as pessoas falam sobre conversas de corredor de escritório e de conversas no cafezinho, a realidade é que elas são bastante limitadas", diz o pesquisador.

O trabalho remoto leva as pessoas a fazerem um esforço para promover esse tipo de encontro e coloca todos em um campo de jogo nivelado. Em uma conversa por vídeo, "você vê o cachorro do seu chefe passando por ali", afirma. "Não é algo que seria visto em um escritório real".

Algumas empresas também começaram a treinar gestores a fim de ajudar quem está trabalhando a distância a orientar suas carreiras.

A Nationwide Insurance, do Reino Unido, que no começo da pandemia transferiu permanentemente a maioria de seus 25 mil trabalhadores para sistemas de trabalho híbrido ou remoto definitivo, treinou seus gestores para que facilitem o desenvolvimento de carreira, criou roteiros para conversas sobre capacitação e interesses dos funcionários, e os encaminhou a mentores que possam ajudá-los a atingir suas metas.

A Nationwide também criou um curso de liderança de quatro semanas de duração, conduzido de modo integralmente virtual, para trabalhadores em todos os escalões de sua hierarquia.

"Procuramos intencionalmente criar experiências que impliquem que estar longe dos olhos não signifique estar longe do coração, o que era uma preocupação para alguns de nossos trabalhadores", diz Erin Pheister, vice-presidente sênior de talento e efetividade organizacional da Nationwide.

A HubSpot, uma desenvolvedora de software sediada em Massachusetts (EUA), treina gestores para trabalhar com equipes distribuídas, e enfatiza conversas que estabeleçam coesão nos times e a construção de relacionamentos pessoais, diz Katie Burke, vice-presidente de pessoal da empresa.

Isso significa tratar com muita clareza, desde o começo, o modo que as pessoas precisam trabalhar juntas e encorajá-las a conversar sobre seus interesses e passatempos fora do escritório.

A HubSpot também incentiva gestores a promover o que Burke define como "intencionalidade" em sua abordagem sobre eventos coletivos.

Oportunidades de aproximação como happy hours virtuais são ótimas, por exemplo, mas se elas forem anunciadas de última hora, pessoas que trabalham em fusos horários diferentes ou que tenham outras responsabilidades muitas vezes não podem participar.

A esperança é que os esforços intencionais de incluir esses funcionários possam ajudar a combater a tendência dos empregadores a favorecer os trabalhadores que estão mais presentes no escritório.

Quando a Sociedade de Gestão de Recursos Humanos fez uma pesquisa entre executivos sobre o trabalho remoto no ano passado, 42% deles afirmaram ter dado atenção menor a quem atua a distância na hora de distribuir tarefas, diz Taylor, mas que isso aconteceu basicamente por terem esquecido deles.

Entre os trabalhadores que apresentam maior probabilidade de preferir trabalho remoto estão as mulheres e as pessoas não brancas, que mesmo antes da pandemia muitas vezes diziam se sentir mal representadas e isoladas nos locais de trabalho.

Trabalhar remotamente sem o apoio devido pode criar um ciclo vicioso que exacerba essa sensação de alienação e ao mesmo tempo reduz a probabilidade de que esses trabalhadores sejam selecionados para projetos que beneficiam a carreira e o ânimo.

Sensível a essa tendência inconsciente, que os psicólogos organizacionais chamam de viés de proximidade, a HubSpot avaliou todas as suas funções de trabalho e estabeleceu quais delas precisavam ser executadas no escritório por motivos legítimos de negócios.

"Dizer ‘eu prefiro poder ver as pessoas de minha equipe’ não é uma razão de negócios", diz Burke.

Menos de 5% das posições de trabalho na empresa atendiam a esse critério, por fim, e entre elas havia postos como os de recepcionista e segurança. Uma vasta maioria das posições de trabalho da companhia agora são classificadas como "trabalhe em qualquer lugar".

Trabalhar fora do escritório não é enquadrado como exceção ou privilégio especial, e sim como parte do trabalho, e os gestores são treinados a pensar em suas equipes como unidades, independentemente da localização dos integrantes.

Em breve, a HubSpot começará a rastrear os dados de localização de trabalho juntos com informações de diversidade, a fim de garantir que preferências de local de trabalho não interfiram nas chances de promoção.

Embora as empresas estejam tomando medidas com o objetivo de criar oportunidades para que os trabalhadores subam os degraus de sua hierarquia, também pode ser útil que os empregadores considerem se as pessoas se encaixam bem no trabalho remoto, antes de permitir que elas optem por trabalhar fora do escritório, diz Kyle Elliott, coach executivo e de carreira na Califórnia.

Esses funcionários, diz Elliott, "realmente precisam se esforçar e ser estratégicos e intencionais para manter contato direto" com chefes e colegas.

Mas ele também reconhece que mesmo aqueles que se pronunciam e buscam ativamente oportunidades só poderão avançar se a cultura da empresa for compatível com o trabalho remoto.

"Se muitas decisões forem tomadas por meio de conversas paralelas, por exemplo, em uma caminhada até o escritório de alguém ou em papos de corredor, é preciso reconhecer que, por melhor que você seja na comunicação por email ou via Slack, será deixado de fora das conversas que ocorrem organicamente no escritório", diz Elliott. "Não há como o Zoom substituir todas essas conversas paralelas".

Tradução de Paulo Migliacci

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