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Locação de imóveis on-line gera debate sobre direito de posse e segurança

A locação de apartamentos por temporada -que se popularizou com o surgimento de aplicativos de hospedagem como o Airbnb- virou motivo de rusgas entre proprietários que adotam a prática, síndicos e vizinhos.

Em janeiro de 2015, a designer Carla Regina Matheus, 33, cadastrou na plataforma o imóvel em que vivia com a mãe, na zona oeste de São Paulo. Oito meses e quase dez locações mais tarde, ela recebeu uma advertência.

O síndico dizia que a unidade estava sendo usada para fins comerciais, o que é vetado pelo regimento interno do condomínio. Se continuassem, seriam multadas.

"Para mim, hospedar pessoas não tem fim comercial. Escrevi uma carta argumentando que ele estava errado."

Além disso, o síndico também manifestou receio quanto a segurança do prédio. "Não tivemos nenhum problema nessa área. A integridade física dos outros moradores nunca foi colocada em risco", afirma Carla.

As divergências continuaram, e o síndico chegou a barrar a entrada de uma hóspede japonesa. "Pediu o passaporte dela. Foi um absurdo", conta a designer. Ela, então, decidiu tirar o imóvel da plataforma, "para não passar por estresse maior".

Marcus Leoni/Folhapress
A designer Carla Regina Matheus, 33, na sua casa, na zona oeste de SP
A designer Carla Regina Matheus, 33, na sua casa, na zona oeste de SP

O advogado Guilherme Rosinha, 28, viveu uma situação similar. Em setembro deste ano, ele disponibilizou o apartamento de sua família, na zona sul de São Paulo, no Airbnb -a maior plataforma do gênero. Obteve reposta rápida e fez quatro locações.

Durante uma estadia, os hóspedes usaram a área comum do prédio, o que gerou desconfiança dos vizinhos. Ouviu a mesma explicação: a convenção proíbe o uso comercial das unidades.

Renato Daniel Tichauer, síndico profissional e presidente da Assosíndicos (Associação dos Síndicos de Condomínios de São Paulo), explica que o grande problema da prática é a rotatividade de não moradores.

"O condômino é responsável pela entrada e saída das pessoas. O proprietário tem que informar com antecedência os dados de quem está autorizado a entrar e a duração do contrato." Se isso for feito, ele não vê problemas.

Não funcionou no caso de Guilherme. Ele tentou explicar que o aplicativo faz a verificação do perfil dos hóspedes e que deixava uma lista na portaria com RG, CPF e o período em que as pessoas estavam autorizadas a entrar.

As reclamações continuaram, e Guilherme desistiu da prática. "É uma briga da qual não dá para sair ganhador."

Há, no entanto, quem tenha encontrado uma solução pacífica para a situação.

Fabio Braga/Folhapress
A publicitária Karen Ferrari, 38, no apartamento que aluga, em SP
A publicitária Karen Ferrari, 38, no apartamento que aluga, em SP

Usuária do Airbnb desde julho do ano passado, a publicitária Karen Ferrari, 38, deixou todos os moradores de seu prédio, na zona oeste da capital, a par da situação desde o começo.

"Peço cópia dos documentos do hóspede e envio uma para a síndica. Tenho uma responsabilidade não só com o meu apartamento, mas com a vida dos vizinhos."

As regras impostas são rígidas. "A pessoa não pode trazer visitante, fazer festa ou barulho. Sou a chata do prédio. Ninguém acredita que vai dar problema no meu apartamento", diz Ferrari.

Procurado, o Airbnb afirmou, em nota, que "conecta hóspedes e anfitriões, que realizam entre si um aluguel de temporada, conforme está previsto na Lei do Inquilinato". E acrescenta que "estimula os usuários a se comunicarem com clareza e darem detalhes sobre as 'regras da casa', além das regras dos prédios ou condomínios".

O QUE DIZ A LEI

"É garantido ao proprietário de uma unidade o direito de alugá-la ou emprestá-la, a não ser que isso seja vedado na convenção de condomínio", diz o advogado Raphael Moreira Espírito Santo, do escritório Veirano.

Ele explica que para reverter a proibição é preciso alterar o regimento interno. Para isso, a mudança deve ser aprovada em assembleia por dois terços dos presentes.

Também é preciso prestar atenção ao tipo de uso das unidades (residencial ou misto), estabelecido no documento. "Se o uso for exclusivamente residencial, não é permitido oferecer serviços como café da manhã além do aluguel", afirma o advogado Pedro Ricardo e Serpa, professor da FGV Direto SP.

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