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Moradores se mobilizam para preservar legado histórico da zona leste

"Tem amigo meu que nem vai ao centro", diz o rapper e MC Xis, nascido na Vila Formosa nos anos 1970, ex-morador de Itaquera e da Cohab 1, atualmente vivendo na Mooca. "Os paulistanos são bairristas, e a zona leste, a ZL, é mais ainda", afirma.

Xis homenageou a maior região da cidade na letra do hit "Us Manu e as Mina", de 1999. Para ele, o marco mais importante de lá é o estádio do Corinthians. "É motivo de orgulho para a comunidade ouvir o nome do bairro e da região serem citados no rádio e na TV: tal coisa acontece na Arena Itaquera, na zona leste", diz.

Uma característica fundamental da região, segundo ele, é sua população muito jovem. "Os rolezinhos começaram nos shoppings daqui, com crianças e adolescentes. A cultura de rua é muito forte. E o hip hop na ZL é bem importante", resume Xis.

Quando os portugueses se instalaram em São Paulo, no século 16, ocuparam o Centro Velho. Na direção leste havia uma grande baixada, a Várzea do Carmo, inundada no período de chuvas.

"Acreditava-se que as regiões baixas não eram adequadas para ocupação. Sobrou para a zona leste ser um fundão da cidade, onde se instalaram indústrias, moradias operárias e pensionatos", conta o arquiteto Renato Cymbalista.

"A ZL era o caminho que ligava São Paulo à Corte. Tem um patrimônio tombado significativo do período colonial", diz Cymbalista, que lista entre eles a Igreja Rosário dos Homens Pretos da Penha, as ruínas do Sítio Mirim em São Miguel Paulista e a Capela de São Miguel Arcanjo.

Como patrimônio industrial, o arquiteto cita a Casa das Retortas e a Vila Maria Zélia.

Cymbalista identifica na população jovem que chegou à universidade um papel fundamental no novo perfil da área.

"Primeiro chegaram as universidades privadas, depois a USP Leste e o campus da Unifesp em Itaquera. Está aparecendo o que se pode chamar de primeira geração de intelectuais da ZL, que nasceu lá, se formou lá e produz conhecimento a partir de lá", afirma.

Um exemplo é o grupo Ururay, um núcleo de convergência de pesquisadores, articuladores e artistas que se dedicam ao patrimônio ambiental urbano, fazendo também turismo de base comunitária.

No livro "Territórios de Ururay", o grupo destaca 13 patrimônios tombados de 4 das 11 subprefeituras que compõem a região. Entre eles, estão a Igreja do Rosário, a Vila Maria Zélia e a Casa do Sítio do Tatuapé entre outros.

A pesquisa gerou roteiros de visita que podem ser agendados pelo email ururay.patrimonioleste@gmail.com .

"A ZL é linda e cruel! A gente aprende desde muito cedo a ser solidário ao outro", afirma Valdemir Pereira Cardoso, o Val, do OPNI, um grupo de arte urbana e hip hop que começou em 1997 e tem como principal projeto a Favela Galeria, com uma galeria aberta na Vila Flávia, em São Mateus.

"Vemos a rejeição, mas também aprendemos através do samba, do rap e nos terreiros de candomblé a termos autoestima e nos sentirmos reis e rainhas da superação", diz Val. "Somos da terra em que nasce arte das paredes."

"A ZL é a mais carente em tudo. Em infraestrutura, em verde, em emprego", observa Hélio Silva, conhecido como o plantador de árvores.

Vindo de Promissão, no interior do Estado, há 58 anos, Silva começou a plantar mudas por amor ao local há mais de 15 anos. Já plantou mais de 26 mil. "Descobri que o que tinha originalmente lá era mata atlântica. Fui comprando muda no interior e plantando em tudo que é lugar, para não deixar espaço para sujeira."

Em 2008, quando a prefeitura desengavetou um projeto de parques lineares, levou a iniciativa para a área do parque Tiquatira, depois integrado ao Parque Linear da Zona Leste, com 320 mil metros quadrados.

"Hoje o parque é o maior e o mais bonito, com 150 espécies da mata, com pau-brasil, pau-ferro, araribás, aroeiras, capixingui, cedro e jerivá", diz Hélio, que planta também no canteiro da Radial Leste.

"Meu método é: planto primeiro e depois, se não puder ter ali, que tirem. Se você não fizer assim, não faz", ensina.

"Como muito paulistano, eu achava que era totalmente proibido plantar árvores nas calçadas", diz Danilo Bifone, um outro plantador de árvores em torno do qual nasceu em 2009 um grupo, o Muda Mooca, que já plantou 30 mil nas calçadas da região.

Descobriu que bastava seguir algumas regras, como os recuos e as espécies adequadas, para poder plantar. O movimento já inspirou similares em Ipiranga, Bexiga e Itaquera.

"A dificuldade é a gente dizer para uma pessoa que vai plantar sem custo na frente da casa dela e ela dizer que não quer", diz Bifone.

Ele não desiste. Sai para plantar uma vez por mês, com um grupo de até 30 pessoas. Para engajar as crianças, oferece diploma de de plantador. "A Mooca é um dos bairros menos arborizados da cidade e uma das nossas bandeiras é a instalação de um parque."

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