Moradias compartilhadas passam por adaptações para sobreviver à pandemia

Prédios de coliving ganham escritório com distanciamento entre mesas e cápsulas à prova de som

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São Paulo

Considerada tendência no mercado imobiliário, a moradia compartilhada, ou coliving, sofreu um baque com as medidas de distanciamento social provocadas pela pandemia de coronavírus.

Na visão de especialistas e representantes do setor, porém, fatores como preços mais acessíveis e mudanças na forma de viver em grandes cidades devem garantir a sobrevivência desse tipo de imóvel.

Quando José Matheus Domingos, 19, se mudou para um quarto em um coliving da empresa Uliving nos Jardins, na zona oeste de São Paulo, ainda em fevereiro, o novo coronavírus estava começando a se espalhar pelo mundo.

"Depois que a pandemia começou aqui, muitos foram embora, mas outros decidiram permanecer", diz o estudante de direito alagoano.

O jovem é um dos que ficaram. Os motivos, segundo ele, foram a incerteza sobre a data de retorno dos estudos e as maiores possibilidades de emprego que São Paulo oferece.

Homem sentado em cama com cachorro preto no colo, sorrindo
O estudante José Matheus Domingos, 19, e sua cachorra Hatii, no coliving em que moram nos Jardins, em SP - Lucas Seixas/Folhapress

Juliano Antunes, presidente da Uliving, conta que, com a suspensão das aulas presenciais, mais de 50% dos estudantes universitários saíram dos imóveis da empresa, perfil que representa a maioria dos clientes da companhia.

Nem todos eles, porém, romperam contrato com a incorporadora, que tem unidades nos estados de São Paulo e Rio. Desde o início da pandemia, a média de cancelamentos é de 20%.

"Demos descontos até o final do ano e condições especiais de renovação para 2021. Muitos sabem que as aulas vão retornar e não querem perder a vaga", afirma Antunes.

Para amenizar a perda de clientes, a Uliving ampliou o leque de opções, passando a atrair um público mais velho, formado por profissionais com idades entre 30 e 35 anos.

De acordo com Alberto Ajzental, coordenador do curso de desenvolvimento de negócios imobiliários da FGV, a tendência de investir em empreendimentos e áreas de uso comum deve se manter mesmo após a pandemia.

Segundo ele, a piora da economia terá mais impacto do que o medo do vírus, fazendo crescer a procura por alternativas mais baratas de moradia. "Continuaremos numa linha de imóveis compactos, com áreas compartilhadas, mais econômicos por causa do espaço reduzido."

As novas dinâmicas de trabalho e mudanças de comportamento que avançaram com a pandemia podem até estimular a economia compartilhada, afirma a especialista em tendências Iza Dezon, cofundadora da empresa de consultoria Dezon.

"Estamos percebendo que morar em microcasas é uma chatice. A forma mais desejável de viver na cidade hoje é comunitária. Muita gente que antes não ousava compartilhar espaços logo vai passar a se permitir", diz a especialista.

A Share, que administra uma unidade de coliving no bairro da Consolação (região central da cidade), também relata queda no número de moradores desde março. Antes perto de 100%, a ocupação caiu para 70%.

Para a segurança dos que ficaram, a empresa tem investido em procedimentos como higienização frequente das áreas comuns, restrição de visitas e acompanhamento psicológico dos residentes.

"Vimos um engajamento muito bom para que o uso dos espaços compartilhados não fosse interrompido", diz Violeta Noya, presidente da companhia, que, apesar das baixas, segue com plano de lançar duas novas unidades em São Paulo em 2021.

Na Uliving, a pandemia gera adaptações também em projetos futuros, um deles previsto para o final de 2020. As novas unidades deverão contar com áreas de delivery, distanciamento entre mesas e cadeiras nos espaços de coworking e cápsulas à prova de som para videoconferências.

"Tomamos esses cuidados sabendo que a situação não vai durar para sempre. São espaços flexíveis, então talvez daqui a dois anos façamos novas adaptações", diz Antunes.

A empresa tem registrado aumento na procura desde julho, e a expectativa é voltar aos níveis de ocupação pré-pandemia já em outubro.

A diretora de desenvolvimento de projetos da Todos Arquitetura, Lais Delbianco, prevê que as medidas de distanciamento devem continuar por até dois anos. O mercado deve apostar, segundo ela, na versatilidade dos projetos.

"É importante pensar em como o espaço vai funcionar num momento de pandemia e também como pode voltar a se adensar depois dessa fase."

No coliving onde José Matheus vive não houve nenhum caso de Covid-19. Um colega que teve sintomas chegou a se isolar por duas semanas, mas seu teste deu negativo.

O estudante conta que, apesar do distanciamento, o convívio no prédio ficou até melhor no período.

"Todos estão tomando cuidado, não tenho nenhum medo pela convivência. Hoje nos vemos mais e criamos um laço muito legal."

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