Carro popular evolui para poluir menos e economizar mais

Em 10 anos, motores de veículos 1.0 à venda no Brasil perderam cilindro e se adequaram a normas ambientais

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São Paulo

Os carros populares passaram por uma revolução na última década. Em busca de eficiência para atender a normas ambientais mais rígidas, as montadoras precisaram desenvolver motores mais econômicos que, ao mesmo tempo, precisaram de potência extra para empurrar veículos de maior peso.

Devido aos reforços na carroceria e à adição de itens de segurança —também por força da lei—, os automóveis ganharam alguns quilos.

Os resultados dos trabalhos de engenharia aparecem nos testes realizados pela Folha em parceria com o Instituto Mauá de Tecnologia. Um Fiat Mobi Drive 2019 leva dois segundos a menos que o antigo Uno Mille 2009 para ir do zero aos 100 km/h. Além disso, o modelo atual, que pesa 135 kg a mais que o antepassado, registrou um gasto 6,3% menor de etanol, em média.

Apesar da distância de dez anos entre os testes, as condições foram as mesmas: desempenho aferido em pista fechada e consumo medido em circuitos urbanos e rodoviários na região de São Caetano do Sul (Grande São Paulo).

Embora ambos os carros tenham motor 1.0, há uma grande diferença: o Uno Mille segue uma receita mais convencional, com quatro cilindros. Já o Fiat Mobi faz parte da nova geração de tricilíndricos. 

É provável que a maioria dos motoristas desconheça essa palavra e nem sequer imagine ter um automóvel desse tipo na garagem de casa.

Hoje, quase todos os automóveis 1.0 à venda no Brasil têm motores com três cilindros. A lista inclui os campeões de venda Chevrolet Onix, Hyundai HB20, Volkswagen Gol e Renault Kwid.

Esse tipo de motor está presente no mercado nacional desde os anos 1990, mas era restrito a carros importados. 

Os 1.0 com três cilindros se tornaram mais comuns quando o sul-coreano Kia Picanto chegou ao Brasil, em 2006. A popularização veio, de fato, com a tecnologia flex.

A Volkswagen foi pioneira ao lançar o Fox Bluemotion (2013), primeiro tricilíndrico a consumir gasolina ou etanol. Um dos maiores desafios da empresa foi controlar uma característica desse tipo de motor: a vibração.

O engenheiro Henry Joseph, diretor técnico da Anfavea (associação nacional das montadoras), compara o funcionamento a uma gangorra. Se há duas crianças de cada lado e com pesos equivalentes, o sobe e desce ocorre de forma fluida. Mas se há duas de um lado e uma do outro, há desequilíbrio.

Nos motores convencionais, os quatro cilindros sempre se movimentam aos pares: enquanto dois sobem, dois descem. Nos tricilíndricos, essa harmonia é quebrada, e daí surgem as vibrações e os ruídos estranhos, que são confundidos com defeitos.

O atuário Guilherme Belmont achou que o barulho de seu Ford Ka 2015 comprado zero-quilômetro poderia ser algum problema, e fez queixas durante as revisões. “Gosto muito do carro, tem direção leve, é econômico, mas o ruído me incomoda bastante.”

Após ouvir dos mecânicos que não havia qualquer problema no seu veículo, mas, sim, uma característica de funcionamento do motor de três cilindros, o proprietário teve de se conformar.

Em 2019, a Folha e o Instituto Mauá de Tecnologia testaram a versão 2019 do Ka 1.0, que tem o mesmo motor do veículo utilizado por Belmont. A Ford fez modificações que reduziram a vibração e o ruído, sem que isso mudasse os dados de consumo de combustível e de desempenho.

Segundo o diretor técnico da Anfavea, as montadoras utilizam contrapesos para compensar a retirada de um cilindro e adotam coxins (suportes que seguram o motor e a caixa de marchas) com maior capacidade para absorver as vibrações.

Se a trepidação passa para dentro da cabine, é sinal de que um ou mais suportes estão com defeito. Nos modelos populares, essas peças custam entre R$ 250 e R$ 600.

Turbo eleva força e reduz consumo, mas encarece manutenção

Os novos motores 1.0 ganharam turbo para oferecer potência e reduzir as emissões de veículos mais caros. O rendimento se equipara ao de antigos motores 1.8 e 2.0, que eram referência em desempenho até o início da década.

Equipado com câmbio automático de seis marchas, o  novo sedã Hyundai HB20s 1.0 turbo (120 cv) precisou de 10 segundos para ir do zero aos 100 km/h e registrou consumo de 17 km/l na estrada com gasolina. Os dados foram aferidos no teste Folha-Mauá. 

Em 2014, nas mesmas condições de avaliação, o Hyundai i30 com motor 1.8 (150 cv) e caixa automática precisou de 11,8 segundos para cumprir a mesma prova. Além disso, bebeu mais no teste rodoviário, com média de 13,5 km/l.

Entretanto, a evolução cobra seu preço. Os sistemas de injeção de combustível dos motores turbinados são mais sensíveis à gasolina de má qualidade e têm peças de preço elevado. Bicos injetores custam cerca de R$ 1.200, enquanto os mesmos componentes para carros sem turbo são encontrados por R$ 200.

Marcos Amorim, dono da oficina Amorim Peças e Serviços, explica que a durabilidade dos motores 1.0 turbinados é alta, mas é preciso manter as revisões em dia. Negligenciar reparos e adiar trocas, além de reduzir os benefícios proporcionados pela tecnologia, vai gerar um prejuízo bem maior em comparação aos veículos com motores convencionais.

39%
dos carros novos vendidos em 2019 foram equipados com motor 1.0

8
entre os 10 veículos mais emplacados em 2019 têm versão 1.0, com ou sem turbo

2
A Fiat chegou a testar um motor bicilíndrico no Brasil, mas desistiu de lançá-lo

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